A incúria das ciclofaixas sem planejamento perdeu a graça e virou tragédia
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
Estatística macabra iniciada: duas mortes de pedestres mancham o programa cicloviário da prefeitura.
Ambas as mortes decorreram não apenas por conta das circunstâncias de momento mas, sobretudo, pela ausência de planejamento, prevenção e previsibilidade na disposição física de uma ciclofaixa e uma ciclovia, construídas pela Prefeitura de São Paulo.
Dois pedestres, uma criança e um idoso, mortos atropelados por uma Van e por uma bicicleta.
Mortes produzidas pela irresponsabilidade e pela má disposição das pistas, pela supressão sistemática do espaço do pedestre. Duas mortes “planejadas” pelo Poder Pùblico.
Decididamente, aqui não é Tóquio, Amsterdã ou Los Angeles. Nestas cidades existe planejamento e participação da sociedade na formulação das ciclovias. Não é brincadeira de playmobil, como ocorre por aqui.
A criança estava caminhando em uma ciclofaixa, pintada no meio de uma via desprovida de calçada (ou algo digno desse nome). Estava inocentemente postada sobre uma miragem de segurança, pois a tinta vermelha e desbotada não impede invasões de automóveis.
A criança não tinha alternativa – pois a “obra” ciclofascista da prefeitura “playmobil” descarta as necessidades de quem anda a pé pela cidade. Foi assim, conduzida à morte, exposta a risco previsível, pelo (des)planejamento urbano do prefeito Haddad e seu secretário Tato.
O senhor de 78 anos estava atravessando a Avenida Amaral Gurgel, embaixo do Minhocão. Ia comprar pão.
A vítima estava parada, na ilha entre as vias da avenida, onde a prefeitura resolveu instalar mais uma ciclovia – aguardava o trânsito arrefecer para atravessar a via. O problema é que a ilha…também é uma ciclovia. Pedestres dividem espaço com ciclistas e as pilastras do minhocão, naquele trecho.
O resultado era mais que previsível. O senhor foi atropelado em cima da ilha, por ciclista que alega não tê-lo visto a tempo “por conta da pilastra”…
Ciclovias-ciclomortes. Pintadas em vias inseguras e desprovidas de calçadas ou construídas sobre estas. Mortes produzidas pela incúria de uma administração que pinta sem-cerimônia, de vermelho, faixas a torto e a direito, sem qualquer critério ou avaliação de impacto dignas desse nome. Obsessão desacompanhada do mínimo planejamento.
As gracinhas imbecis de quem governa de olho na mídia, perderam a graça.
Pois é… Fácil fazer sem planejamento. Duro é administrar as consequências, não é?
O Prefeito Playmobil sequer se dignou a levantar de sua poltrona para ir até os locais dos acidentes, ver a disposição de sua obra e conversar com parentes das vítimas, prestar solidariedade… algo que já fez quando a vítima do acidente era um ciclista… Pior: resolveu, em entrevista, brincar com números e estatísticas, informando que ocorrem pelo menos de duas a quatro mortes de pedestres na cidade, diariamente… Ou seja, banalizou os sinistros.
Típico comportamento que acomete militontos petistas e sua síndrome de numerologia imbecil. Por meio dessa doença estatística, os governos petistas ignoram suas misérias morais da mesma forma como a rainha cabeçuda, seus soldados de carta e cortesãos deformados ignoram solenemente a realidade das coisas. Personagens antropomórficos praticando a lógica do absurdo no clássico nonsense de Lewis Carroll.
Nessa ficção tragicômica, Alice somos todos nós, cidadãos.
Quando fui candidato, pelo Partido Verde, ao governo do Estado de São Paulo, em 2002, inovei ao colocar a instalação de ciclovias em um plano de governo. Assim, quando critico a iniciativa mal planejada e o comportamento absurdo das autoridades petistas, não me confundo com aqueles que não acreditam ou não querem ver implantado o modal na cidade de São Paulo.
Já disse em artigo anterior ( Ciclofaixismo de Brinquedo ), e repito agora: essa irresponsabilidade na aposição indiscriminada de ciclovias e ciclofaixas não educa, não acrescenta e não contribui. Apenas revela um transtorno obssessivo que contamina a coisa pública e vicia a Administração.
Definitivamente, o governo municipal está brincando com a cidade. Temos um prefeito “Plalymobil” e um secretário dos transportes “Lego” (ou vice-versa), cujas ações visam agradar ciclistas que desfilam vestidos de “teletubies” até nos dias úteis… Algo nem um pouco identificado com a funcionalidade econômica e social efetivamente esperada de um programa sério de ciclovias urbanas.
Nesse mundo de Lego, ciclofaixistas playmobil pedalam em simbiose cíclica com ciclofascistas – expulsam pedestres e tomam calçadas e passeios pintados de vermelho.
Agora, o que poderia ser um projeto inteligente – e simplesmente, não é – virou um caso de polícia.
Artigo publicado originalmente em The Eagle View
Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro da Comissão de Direito Ambiental do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e da Comissão Nacional de Direito Ambiental do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. É Editor- Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.
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