Uma idéia simples, sem alterar a cultura e padrões locais, está multiplicando o abastecimento de água na África
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
A roda, ao lado da descoberta da fricção para fazer o fogo, constitui a principal invenção na trajetória de desenvolvimento tecnológico do ser humano. Com ela, os povos primitivos conquistaram a mobilidade e puderam transportar cargas e pessoas. Isso revolucionou a economia.
A prova mais antiga do uso da roda data de cerca de 3500 a.C., e vem de um esboço em uma placa de argila encontrada na região da antiga Suméria, na Mesopotâmia (atual Iraque). Ali se encontra o conceito do eixo, ligado a um suporte, fixado no centro da roda.
Pois bem, passados 5.500 anos, eis que o conceito básico é revisitado, para permitir que a própria roda role… água.
O Transporte da Água como fator de exclusão social
Já tivemos a oportunidade de analisar, em outras matérias e artigos, que a falta d’água nas regiões mais quentes e pobres do planeta é agravada pela ausência de mobilidade no abastecimento.
Nas regiões rurais, de difícil acesso a rios, fontes e lagos, a dessedentação se traduz em andar até o rio, fonte, cacimba ou açude mais próximo, encher algumas vasilhas e… carregar na cabeça, ombros ou no lombo do animal de carga.
Caminhões-tanque ou carroças, significam a alternativa econômica mais cara… o que dificulta ainda mais a vida da população miserável destes locais.
Essa circunstância acompanha o ser humano desde tempos imemoriais e, com todo o avanço tecnológico, persiste em absolutamente todos os cantos do planeta, em especial onde a segregação social é mais aguda.
O transporte de água, que já é um sacrifício ao qual submetem-se populações inteiras, torna-se um fardo pesado demais principalmente para mulheres e crianças que se encarregam de suprir o abastecimento de suas casas.
Aliás, na cultura dos rincões de miséria no mundo, cumpre às mulheres e crianças o transporte das vasilhas de água para abastecimento doméstico.
A Roda de D’Água africana
Gente carregando latas e vasilhas, com custo, podem ser observadas em favelas urbanas, regiões conflagradas, no oridente médio, nas américas, na Ásia e na África…
Na África?
Não mais, em parte considerável do continente.
A África está assistindo a uma revolução na mobilidade do abastecimento de água, que está mudando o cenário do continente.
Observando a situação das mulheres e crianças, nas regiões africanas, dois engenheiros sul-africanos, Pettie Petzer e Johan Jonker, bolaram um jeito simples e prático para facilitar a tarefa nada simples, e nada prática, de transportar água, enfrentada por milhares de pessoas.
Eles criaram o Hippo Roller Water, um tipo de barril que rola sobre o chão conectado a um eixo. A invenção permite substituir os baldes e vasilhas no transporte da água, com grande vantagem.
Desenvolvido na década de 90, o projeto assumiu escala industrial recentemente.
Desde então, tem provocado grandes impactos sociais na África do Sul e em 20 outros países. De fato, já foram distribuídos aproximadamente 46 mil barris (dados coletados até setembro de 2015).
O projeto, muito simples, de baixo custo, permite armazenar 90 litros de água: volume praticamente impossível de ser transportado em um baldes na cabeça, ainda que utilizando toda uma família no transporte tradicional. Armazenada a água no tambor rolante, seu deslocamento por ação mecânica do indivíduo é absolutamente simples e prático.
Ainda existem versões equipadas com um filtro, que tornam a água apropriada para o consumo.
Segundo dados apresentados pelos engenheiros que idealizaram o Hippo Roller Water, o sistema já beneficiou até o momento 300 mil pessoas (considerando uma média de 7 pessoas por família africana).
O que falta para vir ao Brasil?
O projeto, atualmente, é estruturado em um crowdfunding (quando várias pessoas se identificam com um projeto e resolvem apoiá-lo financeiramente para que ele se realize). Doações podem ser feitas através do site Hippo Roller Water Project .
No entanto, o seu potencial é revolucionário, inclusive para o Brasil!
O setor público de abastecimento deveria se debruçar sobre a invenção africana e, então, importá-la, implementar adaptações e promover uma distribuição em áreas onde a falta de água leva milhares de pessoas a penar no transporte manual de água…
Projetos mirabolantes, que, convenhamos, só têm servido para turbinar corrupção e conflitos judiciais, não têm o condão de provocar tamanha revolução que o simples rolar da água em tambores, por quem não consegue armazenar em quantidade suficiente e, justamente, é condenado a transportar pequenos baldes por quilômetros, Brasil afora.
O volume de arrocho e servidão por conta da apropriação da água só não é pior que a política de favorecimento, exploração desmedida e lucro ilícito provocada pelo transporte público/particular de água em caminhões-tanque ou mesmo carroças, para serem VENDIDAS à população carente, impossibilitada de transportar por si só quantidade suficiente do recurso.
Uma distribuição de tambores rolantes, por si só, implicaria em uma enorme diferença.
Fica a ideia e a sugestão.
Com a palavra, o governo.
Fonte:
http://razoesparaacreditar.com/design/invencao-que-esta-ajudando-milhares-de-familias-transportarem-agua-na-africa-do-sul/
Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e da Comissão Nacional de Direito Ambiental do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.
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https://www.flickr.com/photos/apoiocultural/8275000714/
Esta invenção já era usada pela população do morro da mare no rio de janeiro em 1970 ( brasileiros muito a frente do tempo ), e não eram engenheiros , vejam a foto no link.