Forte estiagem é apontada como a culpada pela crise no sistema elétrico brasileiro. Mas o verdadeiro vilão pode ser o próprio sistema.
Por Vitor Lillo
O ano de 2013 mal começou e o setor elétrico do Brasil já sofre os efeitos de uma estiagem que assolou o país ao longo de 2012 e baixou o nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas. Só na Região Sudeste, a principal em geração de energia, o nível está abaixo dos 30%, número alarmante para um país que tem alta dependência dessa matriz energética.
Em média, 80% de toda a energia produzida e consumida no Brasil provém das hidrelétricas. Essa “dependência” é apontada como um problema por especialistas do setor, embora haja quem discorde dessa opinião, como o diretor do Instituto de Engenharia, Miracir Marcatto.
“O Brasil tem 12% da água do mundo; esse é um potencial a ser explorado. O problema está na nossa capacidade de energia armazenada que vem diminuindo ao longo dos anos, em grande parte por causa das falhas no sistema de previsão das chuvas que orienta o quanto de água deve ser mantido nos reservatórios”, opina Marcatto.
Paira ainda sobre as hidrelétricas uma outra polêmica: os projetos de novas usinas como a de Belo Monte, no Pará. Com o pretexto de minimizar o impacto ambiental, essas hidrelétricas utilizarão o sistema de “fio d’água”, que dispensa o reservatório e se vale apenas da força da água. Ocorre que essa parte do país sofre com secas sazonais que diminuem o nível dos rios, e isso pode ser um entrave para a geração de energia.
Outro grande gargalo do sistema elétrico brasileiro está nas subestações de energia que estariam ultrapassadas. Miracir explica: “Nossas linhas de transmissão são confiáveis, mas muitas das subestações ainda não foram atualizadas e isso contribui para a falha na resposta a um curto circuito, por exemplo, que acabam provocando os apagões dos quais tanto se fala.”
Fontes alternativas
Para afastar a possibilidade de racionamento, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) informa em nota que recorreu a outras matrizes energéticas como as usinas termelétricas, responsáveis por 27,07% da produção de energia. A grande desvantagem, porém está nos altos custos financeiros e ambientais, já que essas usinas são movidas a óleo, gás natural e carvão.
Quanto às demais fontes renováveis a viabilidade econômica e tecnológica ainda têm obstáculos a serem superados. “A energia solar é muito cara tem baixo armazenamento de energia; já a eólica tem o problema de ocupar muito espaço e depender da força do vento que nem sempre é suficiente para produzir energia.”, explica Miracir Marcatto.
As usinas nucleares, que são vistas como a principal solução em energia limpa por não emitirem gases poluentes, depois do desastre de Fukushima em 2011, passaram a ser menos interessantes por conta do alto risco ambiental. “Para você ter uma idéia: uma usina a gás custa, em média, US$ 1000,00 por quilowatt instalado. Já a nuclear, depois do desastre em Fukushima, o custo saltou para US$ 5000,00”, aponta Marcatto.
Não bastando o risco do racionamento, a redução das tarifas de energia em 20% anunciada pelo Governo Federal em setembro último, pode vir a ser de apenas 16%. Isso porque os custos de operação, até agora bancados pelas operadoras de energia, orçados em R$ 800 milhões, serão repassados aos consumidores a partir de fevereiro, via Encargos de Serviços do Sistema (EES), segundo informa a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).
Diante desse cenário, é possível enxergar uma luz no fim do túnel para o setor elétrico? “Acredito que, a médio e longo prazo, as soluções são os investimentos na construção de hidrelétricas, exploração do potencial do pré-sal e na atualização das subestações de energia; isso tudo pode ser feito com o apoio da iniciativa privada, da mesma forma que está sendo feito agora nos aeroportos”, opina Miracir.
Passamos por uma crise energética?
Para o professor Ildo Sauer, do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP), a resposta a essa pergunta é óbvia: “estamos sim passando por uma crise energética, a partir do momento em que não investimos nas fontes renováveis de energia e estamos poluindo e queimando dinheiro com as termelétricas”, afirma.
Já para Fernando Portella, consultor do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), não há crise do setor elétrico, pois “a estrutura que o nosso sistema elétrico dispõe atualmente está preparado para atender a demanda”. A razão da polêmica, segundo ele, seria política.
“Isso me parece uma tentativa de desestabilizar o Governo Federal, já que as operadoras de energia de Minas Gerais, São Paulo e Paraná (CEMIG, CESP e COPEL respectivamente), estados que a oposição governa, não aceitaram renovar os contratos de concessão, após as mudanças no marco regulatório”, opina Portella.