Por Marcos da Costa
O Brasil é um dos países com maior potencial na utilização de tecnologia, face à facilidade do brasileiro em absorver novidades, incorporando-as às rotinas pessoais, sociais e profissionais.
Ao lado disso, no entanto, nossas autoridades parecem ter imensas dificuldades em compreender a importância da tecnologia nas nossas vidas.
No cenário, a fala recente do presidente da Anatel, afirmando que os usuários brasileiros da internet estavam “mal acostumados”; as constantes propostas em tramitação no Congresso Nacional, controlando e censurando o uso de redes sociais; e as seguidas decisões judiciais que, por questão pontual de processo judicial – sobre a qual não se discute -, adotam medidas que impactam a vida de milhões de cidadãos, que, por força da vida moderna, se tornaram efetivamente dependentes da tecnologia.
Situação clara é a dos bloqueios de redes sociais ou serviços prestados por meio de redes de computadores que, corriqueiramente, têm sido determinados pela Justiça, como o que foi imposto hoje mesmo ao WhatsApp. É amplamente sabido que os pais usam a ferramenta para comunicação com filhos, em muitos casos residentes fora da cidade, do estado ou até mesmo do país; que escolas a utilizam para comunicação com os alunos e realização de atividades pedagógicas; que empresas realizam tratativas e negócios por esses canais. Essas são apenas algumas situações concretas que foram afetadas diretamente pela decisão de um juiz, em caso concreto que não diz respeito a nenhuma dessas pessoas.
Note-se que não há nenhum paralelo possível dessas decisões com qualquer outro tipo de situação jurídica preexistente ou diversa do universo da Internet, isto é, que ao punir uma empresa qualquer, ela seja proibida de prestar serviços ou vender produtos a terceiras pessoas. Também não há, em nosso ordenamento, previsão legal para que tais sanções desproporcionais sejam aplicadas. O Marco Civil da Internet não o autoriza. As sanções de “suspensão temporária das atividades” ou de “proibição de exercício das atividades”, previstas nos incisos III e IV do seu art. 12, fazem referência expressa e inequívoca ao art. 11. Ou seja, a sanção ali prevista é a de suspensão ou proibição das atividades de “coleta, armazenamento, guarda e tratamento” de dados, quando irregularmente praticadas, e não suspensão ou proibição completa do serviço prestado por essas empresas, atingindo usuários legítimos das ferramentas online por elas disponibilizadas.
Que essa situação sirva como alerta às autoridades, para que compreendam que não se resolve a questão pendente em uma demanda, por mais grave que seja, gerando problemas para toda a sociedade. Não se constrói uma sociedade mais justa e pacífica desta forma.
Marcos da Costa
Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo – OAB SP
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