Por Ricardo Viveiros*
O que faz de alguém um ídolo e, também, fruto do desinteresse, inveja ou respeito? Sentimentos como o amor e o ódio geram posicionamentos extremistas. Paixão alimenta, com a mesma força e sem consciência, antagônicos aspectos. Vivemos um Brasil dividido entre nós e eles, os contra e os a favor – e com perigosa agressividade.
É possível observar o fenômeno da idolatria em três diferentes momentos: a eleição de Jair Bolsonaro; mais um escândalo envolvendo o craque Neymar; e a lembrança da morte, há 10 anos, de Clodovil, estilista de moda, apresentador de televisão e político.
Há quem não aguente Bolsonaro, sua desconcertante sinceridade, costumeiros excessos, inconvenientes testemunhos, radicalismo de direita e expressões clichês. Ao mesmo tempo, há quem o adore por esses exatos motivos, seja fã e colecionador de suas falas, aplauda incondicionalmente seus atos, admire sua dedicação aos filhos. Muitos até colecionam antigos pronunciamentos da época em que ele era parlamentar do chamado “Baixo Clero”.
Neymar, por sua vez, é, para alguns, desequilibrado emocionalmente, irresponsável e capaz de não respeitar o fantástico talento que tem. Um homem que joga a sorte no lixo. Para outros, entretanto, um ser humano acima do bem e do mal, herói que soube superar as adversidades, construir uma carreira de sucesso e que, já milionário, tem a humildade de continuar jogando pelo prazer de praticar sua vocação.
Clodovil sempre soube fazer inimigos. Ferino em comentários, jamais perdoou os desafetos e sabia, como ninguém, de maneira inteligente, direta e sempre bem-humorada, castigá-los, tocando nos pontos que lhes eram frágeis. Não tinha rodeios. Nunca se preocupou em agradar ou desagradar a alguém. Seus críticos o acusavam de fazer a apologia do homossexualismo, ser irreverente em demasia, inconsistente nas declarações. Entretanto, havia muita gente que vibrava com seu jeito de quem não tem jeito, sua conhecida generosidade, rebeldia sem limites.
Reconheço em Jair Bolsonaro uma inegável habilidade na representação, muitas vezes transversal, de polêmicos sonhos da sociedade. Confesso que torço para que Neymar abandone o “tapetão” e fique apenas nos campos de futebol e, por fim, lembro com nostalgia a figura de Clodovil. Porque, a rigor, Bolsonaro, Neymar e Clodovil são personagens da realidade brasileira, alvos do interesse e da razão de reais sentimentos populares – sejam eles contra ou a favor.
Esses três incontestáveis ídolos constituíram-se no mais legítimo espírito big brother em meio à hipocrisia, desonestidade e mentira que, de maneira crônica, permeiam nosso cotidiano desde 1.500.
São exemplos da diversidade de nossa gente, de crônicos problemas na educação e cultura. Assim, cabe entender que a campanha eleitoral terminou e há um presidente, eleito pelo voto livre, direto e secreto, cumprindo seu mandato. Ele precisa sair do palanque e os correligionários – dos dois lados – devem parar o bate-boca. Chega de conflitos. Precisamos ser iconoclastas, pelo bem do Brasil. Não há “Salvador da Pátria”. A história mostra essa verdade. O momento exige união e trabalho.
Como disse o próprio Clodovil, ao ser questionado sobre as roupas que usaria no plenário da Câmara Federal, quando eleito deputado por São Paulo: “Será que precisamos de gravata ou de seriedade?”.
*Ricardo Viveiros – Jornalista e escritor, autor de 41 livros, lecionou por 25 anos para cursos superiores de graduação e MBA. Recebeu a medalha da Organização das Nações Unidas (ONU) no Ano Internacional da Paz (1986), foi escolhido pela ABERJE, “Comunicador Empresarial do Ano”, em 2013 e tem o título de “Notório Saber”, em nível de doutorado, recebido da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Fundou e dirige, desde 1987, a RV&A.
Fonte: Ágata Marcelo – Ricardo Viveiros & Associados – Oficina de Comunicação