A primeira líder política mulher da comunidade de Sakau Motá, em Roraima, é referência no acolhimento de pessoas indígenas refugiadas da Venezuela.
Desde que a violência contra indígenas Pémon-Taurepang eclodiu na Venezuela, em 2019, a pequena comunidade brasileira Sakau Motá viu seu número de moradores duplicar. Localizada na fronteira entre os dois países, em Roraima, Sakau Motá hoje é o lar de mais de 400 pessoas indígenas, boa parte delas busca o Brasil para asilo e proteção.
Do lado brasileiro da fronteira, uma cacique lidera o acolhimento: Anita Yanez foi a primeira mulher a vencer as eleições comunitárias Pemón-Taurepang, que a consagraram uma liderança indígena feminina na comunidade. Desde que começou as atividades, Anita – como é carinhosamente chamada – apoiou pessoas refugiadas e migrantes indígenas por meio da integração na comunidade e apoiando no processo de solicitação de refúgio.
“Somos da mesma etnia, muitos somos até família. Recebemos [as pessoas refugiadas e migrantes] de braços abertos por isso. Eu via a dor, e colocava gente até na minha casa, dividindo quarto com a gente”, relata Anita, lembrando que muitos dos que chegam ao Brasil por via terrestre enfrentam uma jornada exaustiva, com fome e acompanhados de muitas crianças.
Segundo dados da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), existem no Brasil mais de duas mil pessoas da etnia Pemón que saíram da Venezuela em busca de asilo e proteção. No total, mais de 7,5 mil indígenas de diferentes etnias cruzaram a fronteira na cidade de Pacaraima e vivem hoje em território nacional.
A responsabilidade de cada Tuxaua (forma como se denomina o/a cacique na região) é principalmente cuidar da comunidade e liderar as negociações com pessoas não indígenas para garantia de direitos e defesa da cultura e território. A partir da chegada de pessoas refugiadas, Anita também passou a empreender ações para direitos à documentação, acesso à saúde e educação de pessoas indígenas forçadas a se deslocar.
Causa pessoal
Anita sabe bem o que é ser forçada a se deslocar por causa da insegurança. Durante sua infância, ela saiu da comunidade em que vivia, mais ao norte de Roraima, para Sakau Motá, motivada justamente por episódios de violência que sua família viveu. Com apenas 7 anos, a comunidade indígena onde vivia foi invadida, as casas queimadas, e sua família foi forçada a deixar tudo para trás. “Reconheci neles a dor que senti naquele momento, por isso mantive sempre os braços abertos. É muito difícil viver com essa dor”, confessa.
Ao lado do ACNUR, Anita apoia pessoas indocumentadas a realizarem a solicitação de refúgio no Brasil, documento que regulariza a situação migratória e garante o acesso a direitos de pessoas que buscam o reconhecimento como refugiadas.
Para melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem em Sakau Motá, a Tuxaua investe em melhorar a educação da aldeia, busca recursos para construção de um posto de saúde e já iniciou a construção de um refeitório. “Querer, correr atrás e conseguir foi aquilo que aprendi com minha mãe e minha avó”, diz.
Lado a lado
O indígena refugiado de 38 anos, Amado, diz que a comunidade de Sakau Motá é um local onde há segurança e onde sua filha, de três anos, pode ter sonhos e crescer com saúde. “Ela tinha apenas seis meses quando viemos e estamos aqui por ela”, conta.
Ele trabalha ao lado de Anita em projetos de trabalho comunitário. Em Sakau Motá, indígenas refugiados e brasileiros, lado a lado, montam casas, aumentam a escola e negociam com autoridades para receberem a infraestrutura básica para uma vida digna e com respeito à cultura tradicional.
No entanto, para Anita, as necessidades da comunidade ainda são muitas. “Precisamos de mais salas de aula, de um local limpo para atendimentos de saúde, de parques para as crianças, de estradas seguras em que podemos ir à cidade”, relata.“Eu sonho acordada. Toda vez que olho para minha comunidade, vejo tudo isso que acabo de dizer. Mas não quero mais sonhos, quero realidades. Quero que tudo isso que quero para Sakau Motá se concretize”, finaliza.
Fonte: ONU Brasil
Publicação Ambiente Legal, 14/08/2022
Edição: Ana Alves Alencar
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