As luzes da posse presidencial ainda não se apagaram e já há quem reclame “resultados” da nova administração…
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro*
O Presidente Jair Bolsonaro tomou posse, mas de fato ainda não instalou o seu governo. Primeiro, é preciso vencer a máquina administrativa já instalada, para então começar a governar.
O desmonte inicial da parafernália é complexo e exige determinação. Como o próprio Bolsonaro admitiu em recente entrevista, “o mais importante não é o que se vai fazer, mas o que vai ser desfeito”.
Assim, é hora de alertar os apressados para ter muita calma nessa hora. Devagar com o andor, que o santo é de barro!
A sabedoria popular tem suas razões.
Nas procissões católicas as imagens de santos são carregadas em andores: um tablado de madeira com duas barras longas e paralelas, que servem para apoiar o tablado sobre os ombros dos que carregam as imagens. Isso precisa ser feito com cuidado e calma, senão, o santo pode escorregar, cair e quebrar, pois é feito de barro (louça ou cerâmica). Foi assim que a expressão “Devagar com o andor, que o santo é de barro”, passou a ser usada para significar: “Calma! Não se apresse, pois a precipitação pode causar problemas.”
Na tradição luso-brasileira, há outra expressão com significado semelhante, mas referindo-se à refeição: “Quem tem pressa come cru (ou queima a boca).”
É justamente o caso da grita geral, provinda da mídia, dos parlamentares eleitos e de vários eleitores, apontando “hesitações”, “contradições” e “demoras” na instalação do governo do Presidente Jair Bolsonaro.
Tudo indica que teremos santos espatifados ou bocas queimadas.
Na verdade, com exceção do primeiro escalão da República, todo o resto da máquina governamental ainda respira a gestão de Michel Temer (e dos mandatos aparelhistas lulo-petistas).
E não poderia ser diferente. Só quem sofre com a impressionante burocracia de Brasília, pode avaliar a muralha de procedimentos sedimentados, construídos justamente para que nada ande e jamais se modifique…
Esses entraves, obviamente são agravados por dois fatores:
1- quem assume pretende mudar o que ali está;
2- a reação natural de quem se instala em terreno hostil é concentrar as decisões por desconfiança – causando afunilamento administrativo e aguçando a reatividade.
Por tudo isso, parece que o governo do Presidente Bolsonaro ainda não saiu da transição – está vivendo a mesma “muvuca” do corredor cheio de portas para salas apinhadas de gente, experimentada no confinamento do Centro Cultural do Banco do Brasil.
Fosse um governo de “continuidade”, como foram todos os demais, incluso o de Temer – patrocinados pelo establishment e com burocracias similares (compartilhadas no regime de “coalização”), não haveria dificuldade em pôr o barco para navegar no primeiro dia, sem qualquer agitação no espelho d’água.
Mas não é o caso. O novo governo encontrou uma burocracia hostil, temerosa de ser defenestrada e fustigada pela jusburocracia que vegeta e parasita todo o sistema – pois sempre vislumbra, no horizonte, a lawfare – guerra legal – que a alimenta e fortalece (e que em breve o governo deverá enfrentar).
O sistema de nomeações de todos os ministérios, gabinetes, assessorias, autarquias, etc… tem sua estrutura estrangulada no funil da Casa Civil. Por ela passam todas as nomeações a serem “selecionadas”, após o crivo do Gabinete de Segurança Institucional – GSI.
Nesse ritmo, sequer os presidentes das autarquias foram, de fato e direito, investidos. Porque a nomeação não foi sequer publicada.
Para se ter uma ideia. Vários ministros ainda não obtiveram suas assinaturas eletrônicas. Portanto, não fizeram movimentação de pessoal ou editaram normas. Estão administrando com o gabinete dos antecessores.
O afunilamento não é bom. Pode refletir insegurança no Planalto ou expor um perfil concentrador do ministro da Casa Civil. Porém, é fato que o governo luta contra uma burocracia granítica, que não tem pressa.
Nos primeiros dias de governo, o próprio Chefe da Casa Civil tratou de exonerar, de uma canetada, mais de trezentos funcionários de sua pasta. Ou seja, se já trabalhava com uma assessoria hostil, agora lhe faltará mão de obra para trabalhar.
Assim, deve-se esperar um governo minimamente estruturado… somente para depois do carnaval, quando tradicionalmente a burocracia brasiliense se despe das fantasias e começa a trabalhar.
O desgaste provocado por esse entrave burocrático é e será enorme para o Presidente Jair Bolsonaro. Por isso mesmo, é preciso que seus apoiadores sejam os primeiros a reduzir as cobranças – pois há toda uma horda de entidades desagregadoras em busca de dissenções, visando disseminar conflitos.
Por outro lado, urge que o governo se arme de um bom porta-voz – que unifique o discurso oficial e venha a público, justamente explicar esses entraves.
Com tudo explicado, e amainadas as ansiedades, a procissão do novo governo seguirá, entoando os cânticos de louvores, sem que o santo corra risco de se espatifar no chão pedregoso das vias públicas da política nacional, ou afunde no mar bravio lotado de tubarões inconformados com a perspectiva efetiva de mudanças.
*Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista econsultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View. Participou da equipe de consultores encarregada de propor os parâmetros da gestão ambiental para o Governo Bolsonaro, no período de transição.