Oportunidade para tributar o carbono
Por Danielle Denny e Antonio Carlos Mendes Thame
O momento de ajuste fiscal pode ser oportuno para se implementar a tributação sobre as emissões de gases de efeito estufa. Apesar da finalidade última de um tributo dessa natureza não ser aumentar a arrecadação mas sim alterar os preços relativos, estimulando a competitividade de produtos e serviços mais eficientes, a atual crise pode favorecer o tramite político para aprovação. Além disso, esse tema pode conciliar ambientalistas e desenvolvimentistas.
A paixão do contra ou a favor, não contribui com os avanços necessários para a temática ambiental, ficam “todos se sentindo derrotados”, aponta Marcos Lisboa, presidente do Insper. Para ele, a visão maniqueísta é tão apaixonante como incompetente para resolver problemas complexos, “são difíceis as escolhas que precisamos fazer”. Graus de oposição irreconciliáveis não servem ao debate, conclui.
Assim, o importante é trazer todos para o diálogo, identifica Ana Toni, do Instituto Escolhas que busca qualificar o debate com dados empíricos e cientificamente verificados para assim favorecer uma reconciliação entre economistas e ambientalistas. Ela considera importante ficar claro que não há uma solução miraculosa a ser prescrita, a sociedade tem que fazer escolhas e decidir informada, consciente de quais serão as consequências de suas decisões, por isso o lema do instituto é “informação acima de qualquer opinião”.
Para chegar na convergência, tem que organizar a divergência, assim simplifica, Sérgio Leitão, que atuou no Greenpeace por mais de uma década. Ele cita Daniel Gleizer, ressaltando que se tem de alterar os determinantes da produtividade. Afinal a mola básica do crescimento econômico é o aumento da produtividade. Assim, se essa alteração for feita tem capacidade de colocar a economia “nos trilhos do baixo carbono”.
Nesse sentido, Roberto Kishinami, da MIP Híbrida, vê vantagens na precificação do carbono. Ela é capaz de sinalizar diferentes opções de consumo, promover fontes de energia limpas e tecnologias de baixo carbono. Desvantagem também há, a principal é que inibe a atividade econômica pela transmissão do gasto tributário para os preços finais.
Mas pelos cálculos das pesquisadoras da USP, Andreia Lucchesi e Paula Pereda, o impacto seria irrisório. Aplicando-se uma taxa de US$50 por tonelada de gás carbônico, por exemplo, haveria retração de 0,9% no PIB e -0,1 % na taxa de emprego.
O coordenador dessa pesquisa o economista Bernard Appy, ex secretário de política econômica do governo Lula, ressalta que não se trata de uma nova CIDE, pois o volume arrecadado seria muito grande, desaconselhando qualquer vinculação de receita. Ele calcula, ainda que se esse novo tributo vier acompanhado de rearranjos e correções de distorções existentes na estrutura tributária atual, pode haver um ganho significativo em eficiência para a indústria brasileira.
Bernard analisou especificamente as correção de distorções de PIS/Cofins que geram perda de competitividade sobretudo em virtude da cumulatividade. Se reestruturar o sistema tributário para neutralizar essas distorções, o resultado calculado pelo estudo foi geração de emprego e aumento de arrecadação. Além claro, de no longo prazo haver o efeito dinâmico de reorganizar a economia.
Outra estratégia para driblar a perda de competitividade seria, na exportação, ressarcir as empresas do valor pago a título de taxa de carbono e tributar os concorrentes internacionais da mesma forma que os nacionais na importação. Alguns países optam por conceder permissões para consumo de combustíveis não taxados para esses setores exportadores que perderam competitividade.
Como seria a tributação do combustível quando sai da Petrobras, por exemplo, é relativamente fácil iniciar a cobrança. São poucas as empresas que trabalham no mercado de combustíveis fósseis e todas bastante conhecidas já que o mercado é um dos mais consolidados.
Diferentemente da CIDE que incide sobre diesel e gasolina. O tributo sobre as emissões de carbono impactaria todos os combustíveis fósseis, como gás natural, dessa forma, fazendo termelétricas custarem muito mais que hidrelétricas, parques eólicos ou painéis solares e, assim, alterando o preço relativos dos produtos e serviços. Os sustentáveis, mais eficientes e que usam tecnologia mais limpa em sua produção seriam mais baratos que os carbono intensivos.
Portanto, nesse momento de necessário aumento de arrecadação e de ajuste fiscal, uma reestruturação do sistema tributário para garantir maior eficiência e competitividade à produção brasileira poderia ser uma das soluções. Não há claro uma fórmula mágica e certamente o modelo abundante e caótico que inspira o Direito Tributário brasileiro vai demorar a ser superado. Mas são em oportunidades como as atuais, de confluência de interesses, que se consegue alterar significativamente os paradigmas.
Danielle Denny é advogada e jornalista, professora de jornalismo e colaboradora do Portal Ambiente Legal
Antonio Carlos Mendes Thame é engenheiro agrônomo e advogado, professor licenciado da ESALQ-USP e deputado federal por São Paulo – (PSDB)
..