O Fenômeno, Sua Influência Global e o Papel da Força Gravitacional Sobre Ele
Por Luiz Carlos Molion*
Discute-se a gênese do El Niño, argumentando que o fenômeno não pode ser apenas uma oscilação natural do Pacífico e que seu início necessita da atuação de uma força externa ao sistema atmosfera-oceano. Propõe-se que essa força seja a força gravitacional da Lua quando se desloca para a declinação mínima em seu Ciclo Nodal.
O GENESIS DO EL NIÑO
O El Niño – Oscilação Sul (ENOS), é um processo geofísico que ocorre no Oceano Pacífico Tropical.
É um exemplo admirável de interação entre o oceano e a atmosfera, que interfere no clima global e regional.
O fenômeno é constituído de dois componentes: o oceânico, denominado El Niño (EN) propriamente dito, e o atmosférico, a Oscilação Sul (OS).
O EN é caracterizado por anomalias positivas da temperatura da superfície do mar (TSM), ou seja, águas mais quentes que as normais se estabelecem no Oceano Pacífico Tropical Centro-Oriental, próximo à costa oeste da América do Sul. Quando as anomalias de TSM são negativas, dá- se o nome de La Niña à fase fria do EN.
A OS é a variação zonal da pressão atmosférica ao nível do mar (PNM) sobre o Pacífico Tropical, medida tradicionalmente em dois centros – Tahiti (Polinésia, Pacífico Oriental) e Darwin (Austrália, Pacífico Ocidental). É quantificada por sua diferença padronizada entre esses dois centros, com que se define o Índice da Oscilação Sul (IOS).
Em geral, os índices negativos, quando a PNM é mais baixa no Pacífico Centro-Oriental que no Pacífico Ocidental, coincidem com eventos El Niño, enquanto índices positivos, em que as diferenças de PNM são contrárias, correspondem a eventos La Niña. Essa coincidência ocorre em cerca de 65% dos eventos.
Eventos El Niño fortes, aumentam a temperatura da baixa troposfera global. Isso ocorre porque injetam grandes quantidades de calor sensível e calor latente na atmosfera tropical, como foi constatado em eventos recentes.
Por exemplo, no El Niño de 1997/98, de acordo com Spencer (2016), a temperatura global registrou um desvio positivo de +0.74°C – em abril de 1998. Já em 2015/16, a temperatura global de fevereiro de 2016 atingiu a marca de +0,83°C acima da média.
No Brasil, de maneira geral, nos eventos El Niño, ocorrem secas nas Regiões Norte e Nordeste e excesso de chuva nas Regiões Sul e Sudeste – ao passo que ocorre o contrário em eventos La Niña.
A ORIGEM DO IMPACTO GEOFÍSICO
Acredita-se que os impactos do processo geofísico sejam conhecidos. Porém, sua origem ainda não está bem estabelecida.
A hipótese mais aceita é que o Pacífico Tropical, dada sua extensão, tenha uma frequência natural de oscilação resultante da interação entre os campos de PNM (Pressão Natural ao Nível do Mar), ventos associados e as águas do oceano.
Devido às PNM altas na costa oeste da América do Sul, os ventos Alísios sopram forte de Leste para Oeste, arrastam as águas que se aquecem nesse trajeto e se acumulam na região da Austrália/Indonésia. Dessa forma, geram a chamada “piscina de água quente do Pacífico Ocidental” – associada a PNM mais baixas.
Na costa oeste da América do Sul, essa retirada das águas superficiais provoca a ressurgência de águas frias. Ou seja, águas profundas sobem à superfície para repor as que estão sendo arrastadas, fazendo com que essa região apresente TSM (temperaturas da superfície do mar), cerca de 10°C mais frias que as do Pacífico Ocidental, enquanto a Pressão Natural da Superfície é mais alta.
Essa diferença de PNM entre o Leste e o Oeste do Pacífico, é responsável pela persistência dos ventos Alísios. As águas, ao se acumularem no Oeste, pressionam as camadas inferiores do oceano local para baixo, um efeito semelhante a comprimir uma mola.
Como água é um fluido incompressível, eventualmente as camadas inferiores do oceano (termoclina), reagem com um movimento brusco para cima, e expulsam as águas superficiais mais quentes. Isso dá origem a uma onda interna sub-superficial no oceano, numa camada de cerca de 100 metros de espessura, denominada Onda de Kelvin. A Onda se propaga da Austrália/Indonésia em direção à costa do Equador/Peru, levando cerca de três meses para cruzar o Oceano Pacífico.
O calor transportado pela Onda de Kelvin, aquece as águas da costa do Equador/Peru. As águas superficiais aquecidas abaixam a pressão natural ao nível do mar, reduzem, ou até invertem a diferença de PNM entre o Leste e o Oeste, enfraquecendo ou invertendo os ventos Alísios. Isso faz cessar a ressurgência e aumentar ainda mais as temperaturas da superfície do mar. Tem-se, então, um El Niño instalado, que poderá persistir por 6 a 18 meses.
Na retaguarda da Onda de Kelvin, encontram-se águas mais frias. Esse déficit de calor é transportado também para Leste e, quando chega, dissipa o El Niño, dando origem a sua fase fria: o La Niña.
Com o La Niña, as águas frias, agora presentes, fazem a PNM aumentar no Leste do Pacífico e, novamente, a diferença de PNM entre o Leste e o Oeste do Pacífico, aumenta e intensifica os Alísios, restabelecendo a ressurgência e fazendo com que as águas fiquem mais frias na costa oeste da América do Sul, sendo empurradas para Oeste.
Assim, o processo geofísico, como um todo, se repete, como uma imensa “gangorra oceânica/atmosférica”, com oscilação Leste-Oeste de 4 a 5 anos até que a viscosidade restabeleça a neutralidade das temperaturas superficiais do mar.
A FORÇA GRAVITACIONAL LUNAR
Como foi dito, não se tem conhecimento adequado sobre as causas físicas da gênese do processo de oscilação sul do El Niño – ENOS.
Fica a pergunta: é realmente uma oscilação natural ou há necessidade de uma força externa para que o processo se inicie?
Se for uma força externa, uma possível candidata seria a força gravitacional lunar, sabidamente atuante sobre as marés.
O Ciclo Nodal Lunar (ver e.g., YNDESTAD, 2006), define a variação da inclinação do plano da órbita da Lua em relação à superfície terrestre. Como esse plano é inclinado com relação ao equador, a Lua passa, relativamente falando, 14 dias no Hemisfério Norte e 14 dias no Hemisfério Sul, durante o ciclo de 28 dias de suas fases.
A inclinação ou declinação do plano orbital, porém, não é “fixa”. Ela varia de sua posição máxima de 28,6°N a 28,6°S de latitude, para a mínima de 18,4°N a 18,4°S de latitude, num intervalo de 9,3 anos – e retorna para a posição máxima em mais 9,3 anos. Esse ciclo totaliza 18,6 anos.
Em um intervalo de aproximadamente 10 anos, o plano da órbita lunar ocorre fora dos trópicos. Ou seja, sua declinação é maior que 23,5° (latitude dos Trópicos do Câncer e Capricórnio).
Nessas circunstâncias (declinação entre 23,5° e 28,6° de latitude), o componente da força gravitacional lunar é maior na direção equador-polo e acelera as correntes marinhas, particularmente a do Golfo (América do Norte) e a de Kuroshio (Japão), transportando mais calor da região tropical para as latitudes mais elevadas.
Isso faz com que as águas do Pacífico Norte e do Atlântico Norte fiquem mais aquecidas que o normal e torne o clima dos países banhados por elas, como a costa oriental da Ásia, América do Norte, Europa Ocidental, Inglaterra e Escandinávia, mais ameno e úmido.
O plano da órbita lunar se situa dentro da região tropical (declinação entre 18,4° e 23,5°), durante cerca de 9 anos, e o componente de sua força gravitacional é maior na direção Leste-Oeste. A exportação de calor para fora dos trópicos é reduzida, e mais calor é retido e redistribuído em âmbito zonal, dentro dos trópicos.
Ao invés da oscilação natural, a força gravitacional da Lua, juntamente com os Ventos Alísios, seriam responsáveis por empurrar e empilhar, inicialmente, as águas no Pacífico Ocidental, criando as condições oceânicas propícias (“gatilho”) que antecedem um evento El Niño forte. Daí por diante, o desenvolvimento do evento El Niño seguiria a hipótese das camadas mais profundas do Pacífico Ocidental, comprimidas, responderem bruscamente e dispararem a Onda de Kelvin, que transporta calor para o Pacífico Oriental.
Na Tabela abaixo, mostramos a estranha coincidência de eventos El Niño, intensos, como os de 1941/42, 1957/58, 1977/79, 1997/98 e 2015/16, terem ocorrido quando a declinação do plano da órbita lunar se situou dentro dos trópicos, ou seja, entre o Ponto Médio #2 e o Ponto Médio#1, passando pelo mínimo lunar.
Notem que os eventos são espaçados de 19 anos. Se isso não for coincidência, é possível prever a ocorrência de futuros eventos El Niño fortes.
Os eventos intermediários, como os de 1982/83 e 1986/87, podem estar associados ao Ciclo das Apsides Lunares (8,85 anos) e/ou seu submúltiplo (4,4 anos). Podem, ainda, serem resultantes da oscilação Leste-Oeste do termoclima durante os anos subsequentes que, em conjunto com a interação oceano-atmosfera, nos campos de PNM e de ventos, forçam as TSM do Pacífico Tropical a retornarem ao estado de neutralidade.
Chama atenção, também, a coincidência de o Atlântico Norte ter começado a resfriar a partir de 2006/2007, ano em que o plano da órbita lunar atingiu sua declinação máxima (28,6°).
CONCLUSÃO
Em resumo, a Lua pode interferir no clima global/regional indiretamente, por meio de sua ação gravitacional, ao modificar, em primeiro lugar, a velocidade das correntes marinhas e o transporte de calor meridional nos oceanos e, na sequência, mudar a configuração das temperaturas superficiais marítimas – TSM, particularmente nos setores norte do Atlântico e do Pacífico, que têm suas bacias fechadas. A configuração de TSM, modificada por quase duas décadas, muda a atmosfera sobrejacente e, portanto, o clima
Notas:
Nota de Pesquisa – Publicação original – Revista Brasileira de Climatologia 2237-8642 (Eletrônica)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS SPENCER, R.W., em http://www.drroyspencer.com/latest-global-temperatures/ acesso em 14/06/2016.
YNDESTAD, H., The influence of the nodal cycle on Arctic climate. ICES Journal of Marine Science 63: 401-420, 2006
*Professor Luiz Carlos Baldicero Molion , graduado em Física pela Universidade de São Paulo (1969), PhD em Meteorologia pela University of Wisconsin, Madison (1975), com pós-doutorado em Hidrologia de Florestas pelo Institute of Hydrology, Wallingford, UK (1982). Fellow do Wissenschaftskolleg zu Berlin, Alemanha (1989-1990).[8] Foi pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, diretor da área de ciências espaciais e atmosféricas em 1985 e diretor associado em 1986 – ano em que co-coordenou projeto de pesquisa sobre a Amazônia em parceria com cientistas da NASA. Foi diretor da Fundação para Estudos Avançados no Trópico Úmido em Manaus, professor convidado da Western Michigan University, 2001 e delegado do Brasil na 15ª reunião da Comissão de Climatologia da Organização Meteorológica Mundial em 2010. É Professor aposentado e Associado da Universidade Federal de Alagoas.
Fonte: The Eagle View
Publicação Ambiente Legal, 23/01/2025
Edição: Ana Alves Alencar
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