Indicadores podem ajudar a identificar mudanças ambientais em regiões, áreas e recursos naturais, segundo especialista em geografia física
Susana Sarmiento, para o Portal Setor 3
“Conhecer nosso território, nosso passado geológico e histórico, nosso presente e ter domínio sobre ele, inclusive para poder planejar, preservar e conservar para as próximas gerações”, opina a docente Esmeralda Buzato, geógrafa e especialista em geografia física, sobre a importância de indicadores ambientais.
A ideia da consultora é abordar os seguintes assuntos: conceitos e definições com exemplos de diferentes indicadores; contextualizar o problema ou o objeto de estudo para definir os mais adequados para cada ambiente; os geoindicadores como instrumentos de análise e gestão ambiental; importância da legislação ambiental como agente de mudanças na conservação, na preservação e na recuperação de diferentes ambientes sob interferência antrópica – resultante da ação do homem.
A docente também pretende detalhar a aplicação de indicadores ambientais para a gestão e as políticas públicas em ambiente tropical litorâneo por meio de um estudo de caso desenvolvido no município de Ubatuba (SP), resultado de sua tese de doutorado em geografia física pela Universidade de São Paulo. Para esclarecer e contextualizar no cenário socioambiental, Esmeralda conversou com a equipe do Portal Setor3:
Portal Setor3 – Qual papel e a importância dos indicadores ambientais hoje em dia?
Esmeralda Buzato – O complicador dessa questão é que o fato de adotar-se indicadores exageradamente abrangentes, precisamos ser mais específicos. O indicador permite comparações, ver tendências. Os indicadores são parâmetros. Por exemplo, os indicadores biológicos mostram o estado de avanço, ou degradação de determinadas espécies e vegetais. No caso dos ambientais, me refiro especificamente ligados aos aspectos do meio físico, como a água, o relevo, os solos, a vegetação, as rochas, os processos erosivos, que indicam alguma alteração ou degradação.
Portal Setor3- Qual recurso é mais avaliado e quais indicadores são mais indicados?
EB- Esse é outro ponto que pretendo pontuar nessa palestra, porque existe uma escala de observação, quando se trabalha com indicadores. Sempre se fala de indicadores climáticos. São os mais em evidência hoje em dia com os estudos de mudanças climáticas, os riscos de mudança globais, e conseqüências que isso gera para a população na terra. Uma escala global pode gerar alguns desavisos sobre como isso de fato impacta em cada região especificamente. Essas mudanças têm sido muito evidenciadas por sua abrangência. Mas existem outros níveis de análise, como aqueles usados pela Secretaria do Meio Ambiente, com os indicadores da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo e de outros órgãos públicos, que são para calcular qualidade e quantidade de água, qualidade do ar e de solo,etc., estão mais voltados para poluição e contaminação dos recursos naturais. Os indicadores ambientais são quaisquer parâmetros, que indicam alguma mudança em um determinado ambiente. Por isso, pontuo a importância da escala de observação que pode ser pontual, local, regional, continental ou global dependendo do objeto de estudo e do fenômeno analisado.
Portal Setor3- Qual a importância de geoindicadores?
EB- Indicadores ambientais englobam uma série de parâmetros e são mais abrangentes como a atmosfera, flora e fauna Já os geoindicadores são aqueles mais ligados à ciência da terra sob parâmetros de rochas, relevos, solos, hídrografia, etc. Cada ambiente permite elencar um determinado número de indicadores, chamados de geoindicadores. Os geoindicadores são adaptáveis às necessidade do trabalhos, do objetivo e do que se busca. É bem utilizado em levantamentos preliminares, ou estudos de reconhecimento de áreas e também instrumentalizadores, gerando dados para serem utilizados na tomada de decisões para políticas públicas, no planejamento urbano e na elaboração de planos diretores por exemplo.
Portal Setor3- Por que estudar o município de Ubatuba e o que você analisou? Quais indicadores utilizou?
EB- Sempre tive curiosidade em conhecer mais a dinâmica do ambiente litorâneo, porque recebe influência tanto do ambiente marinho, quanto do continental. A faixa costeira possui uma dinâmica muito intensa com mudanças naturais, como os deslizamentos que ocorrem nas encostas, nas áreas de enchente, nas inundações, na questão das marés. Tudo isso faz com que a faixa costeira seja um ambiente muito intenso e sujeito à mudanças ambientais. São também em geral as áreas mais impactadas por modificações antrópicas, ou seja, da sociedade, do ser humano. Durante a o levantamento bibliográfico para a tese de doutorado verifiquei que os geoindicadores eram uma forma de análise ambiental, cujos parâmetros poderiam ser identificados neste município, que apresenta uma área mais preservada ao norte e outra mais alterada pela ocupação urbana no centro-sul. Estabelecer uma comparação entre estas também é um princípio de análise dos geoindicadores. A dinâmica do uso e ocupação do território, além da utilização dos seus recursos naturais que levaram à atual configuração. A legislação ambiental especialmente a partir da década de 1980 colaborou muito para a manutenção de áreas preservadas e a ocupação por comunidades locais (quilombolas ou caiçara), reordenando o uso e ocupação do território, assumindo a função de um agente modificador, ou também de um indicador de mudanças.
Realizei um levantamento que focou nos últimos 40/50 anos. Nesse período, o município recebeu os maiores impactos e atualmente essas áreas estão sendo recuperadas por conta da legislação que obriga alguns cuidados na implantação e criação de empreendimentos, por exemplo. Há outros dados que nos mostraram a necessidade de mais fiscalização, como é o caso de marinas. Existe uma legislação bem recente que regulamenta o funcionamento das marinas. Dessa forma, os indicadores se mostraram eficientes para demostrar mudanças e impactos ambientais, orientando possíveis tomadas de decisão.
O tipo de ocupação atual do setor norte do município, que está mais preservado, é menos agressivo ao meio ambiente, mas nessas áreas existem marcas de um passado agrário cujas técnicas rudimentares deixaram falhas permanentes na vegetação, como cicatrizes denunciando um passado onde não haviam técnicas de manejo adequadas aos solos pobres e terrenos íngremes de Ubatuba. A transição dos ciclos econômicos (açúcar, café, ouro) levaram essas áreas a períodos de abandono que permitiram a recuperação natural da paisagem buscando seu equilíbrio dinâmico. Hoje, devido à legislação, o monitoramento e a orientação do uso dessas áreas é menos impactante.
Portanto, os indicadores mostraram que, na verdade, não é apenas o impacto humano, mas a forma de ocupação e como ele usa determinadas áreas. A rodovia Rio-Santos, por exemplo, foi construída nos anos 1970, em um período sem conhecimentos de engenharia de hoje, o corte feito nas encostas da Serra do Mar causou algumas instabilidades, que nunca mais voltaram mais ao seu equilíbrio. Algumas áreas sofreram processo de erosão por serem muito frágeis e até hoje tem que ‘remendar’ quando tem uma chuva. Percebemos hoje que a tecnologia e os novos conhecimentos sobre a dinâmica das paisagens entram nesse rol de parâmetros e análises e ajudam a evitar erros do passado com vistas a um futuro mais sustentável.
Portal Setor3- Qual a importância de entender e dominar os indicadores para acompanhar determinados territórios?
EB- A importância é conhecer nosso território, nosso passado geológico e histórico, nosso presente e ter domínio sobre ele, inclusive, para poder planejar, preservar e conservar para as próximas gerações. Eu não sei e não consigo cuidar daquilo que não conheço. Por incrível que pareça um grão de areia carrega muitas informações.