Comissão designada pela Reitoria da USP atesta ocorrência das infrações ambientais e sugere medidas “criativas” por questões de ordem econômica…
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
Após os protestos dos alunos e professores, medidas judiciais, embargos administrativo e judicial e ter o legislativo paulistano apertado o cereco, por meio de uma CPI, a Universidade de São Paulo resolveu sair da impassibilidade e tratou de avaliar a questão da segurança e risco á saúde humana, decorrentes da contaminação do solo no Campus da Zona Leste de São Paulo.
Os membros da Comissão designada pela Reitoria da USP para avaliar a questão visitaram as instalações do campus e tiveram acesso aos documentos relacionados.
Após a análise e visita in loco, os membros da comissão emitiram relatório contendo, dentre outras, as seguintes considerações:
a) Os problemas ambientais da área são decorrentes de duas causas distintas;
b) O primeiro cenário – o acúmulo de metano no solo – tem como origem mais provável a destinação inadequada de resíduos de dragagem do leito do rio Tietê. Na verdade, este parece ser um problema difuso ao longo das margens do rio, como apontam os recentes episódios no Center Norte;
c) O segundo cenário – acúmulo de metais pesados e compostos orgânicos variados – tem a sua origem mais provavelmente relacionada com o recebimento de terra de origem não especificada em grande volume, a qual foi empregada para retificação do solo;
d) As duas questões acima levantadas têm soluções distintas. No caso do metano, é necessária a instalação de sistemas de drenagem dos gás acumulado, a partir de poços perfurados para este fim específico. Aliás, a existência de metano no subsolo já era conhecida desde a destinação do terreno para a construção do campus. Na oportunidade, foram estabelecidos procedimentos de remediação que, aparentemente, não foram realizados em sua completude;
e) No caso da remediação do solo superficial dada a deposição de terra de procedência até agora não determinadas, há várias alternativas possíveis, que vão da remoção direta até técnicas de tratamento e limpeza local;
f) Do ponto de vista geral, o cenário acima descrito não é uma situação desejável, porém infelizmente frequente. A expansão explosiva das cidades brasileiras fez com que edificações fossem erguidas em antigas áreas industriais ou mesmo pontos de destinação irregular de resíduos tóxicos. Há ainda que se considerar o vazamento de tanques de armazenamento de combustíveis em postos de abastecimento, problema extremamente frequente no Estado de São Paulo;
g) Focando a questão ainda no contexto do campus da EACH, evidências ainda não totalmente consolidadas indicam que a presença de contaminantes no solo é um problema que atinge toda a região do entorno do campus. Há relatos pontuais da presença de metais pesados e compostos orgânicos persistente, como dioxinas, em áreas próximas e que merecem atenção e remediação.
Medidas Paliativas de duvidosa eficácia
A Comissão da Universidade concluiu que “o problema ambiental mais significativo está relacionado à presença de solo contendo metais pesados e poluentes orgânicos se, de fato, medidas controladas vierem a confirmar sua presença em áreas significativas do campus”.
No entanto, as medidas sugeridas pelo douto colegiado acadêmico, sugerem uma emenda pior que o soneto (para usar o bordão de Bocage ao se recusar a corrigir o poema de um discípulo, tamanho o conjunto de erros que encontrara na composição).
Os cientistas entenderam que “do ponto de vista de risco à saúde, foram tomadas medidas efetivas como o plantio de grama” (?) e “construção de cercas de proteção, de forma a evitar o contato dos alunos, funcionário e docentes com este tipo de solo”.
De fato, se esse tipo de conclusão valer para o sítio contaminado da Universidade, não há razão sequer para que a disciplina de gestão ambiental continue a existir naquele Campus, pois, nenhuma outra área contaminada do Estado de São Paulo precisará mais ser removida ou remediada – basta plantar grama e cercar…
Não bastasse a decepcionante conclusão, o documento da comissão da USP segue adiante para entender que, no que tange ao grave problema da contaminação do solo, “medidas como a remoção do solo podem ser implementadas pela USP caso seja necessário, porém são dispendiosas, tornando inviável a sua aplicação em outras áreas de nossa cidade ou do Brasil. Os contaminantes presentes no solo podem ser voláteis e não-voláteis; podem estar imobilizados na matriz de solo, ou podem atingir o lençol freático e serem transportados pela água. Para evitar a contaminação ambiental por compostos voláteis, a barreira poderia ser a cobertura da área com camada de solo impermeável, associada ao uso de técnicas de fitorremediação (a “limpeza” do solo por espécies vegetais), por exemplo. Para a contaminação das águas subsuperficiais em solos rasos, existem técnicas como a de barreiras reativas permeáveis, que removem das águas os contaminantes biodegradáveis e imobilizam os demais compostos”
Ora, os doutos professores se esforçam em sugerir medidas absolutamente paliativas, por entenderem ser a remoção do solo “dispendiosa”.
A conclusão chega a ser um escárnio, pois patente que a deposição de solo contaminado na área da USP ocorreu, justamente por ter o responsável pela compra da terra necessária ao aterramento da área, feito uso da solução “menos dispendiosa”.
Assim, se prevalecer o raciocínio, todo e qualquer poluidor poderá optar por depositar argila sobre o terreno contaminado com voláteis e… tudo ficará bem.
Fitorremediação ou biorremediação, decididamente, não se aplicam ao terreno, cujo solo contaminado não resultou propriamente das atividades ali realizadas anteriormente ao campus mas, principalmente, por conta da adição de terra com os contaminantes mencionados. Tão somente esse fato, seria suficiente para se exigir a retirada da terra e sua destinação para tratamento adequado e inertização dos contaminantes! Não decidir assim, admitindo a solução inventiva proposta pela Comissão uspiana, seria o mesmo que premiar o poluidor pela poluição por ele provocada.
Cobaias humanas para economizar a remoção do material contaminado?
No entanto, as conclusões disparatadas não param por aí.
Fazendo uso da prerrogativa de ser uma instituição científica, os membros da comissão nomeada pela reitoria da USP, sugerem que “a atitude mais positiva seria transformar um problema em um conjunto de pesquisas, transformando o campus da EACH em um laboratório de pesquisa avançada para a remediação de solos contendo resíduos químicos.”
Ou o leitor e este articulista não entenderam bem o que foi proposto literalmente, ou a reitoria da USP pretende transformar a área contaminada do Campus da USP em um “laboratório para remediação de solos contendo resíduos químicos”, servindo, obviamente, os alunos, professores e funcionários que ali frequentam, de COBAIAS…
Por fim, como que respondendo ao artigo publicado neste Portal ( “Vergonha com Título Acadêmico”), a Comissão nomeada pela Reitoria da USP declara que “ao contrário de uma situação onde uma empresa procura se defender de uma ação ambiental, a USP possui o perfil que permite uma colaboração produtiva com a Justiça. Na verdade o caso em pauta torna real a possibilidade da participação da USP como ator a contribuir para a formulação de políticas ambientais voltadas para a solução dos problemas ambientais de nosso País. Mais ainda, a extensão das atividade de pesquisa ambiental no entorno do campus, será mais uma ação a permitir com que a USP estreite os seus vínculos com a população residente em uma das regiões menos favorecidas de nossa Metrópole.”
A recomendação por uma atitude mais propositiva e a assunção de culpa, pela instituição universitária é bem vinda. No entanto, as medidas propostas apenas visam aliviar os cofres da instituição e do governo do estado de São Paulo, às custas da saúde dos alunos, funcionários e professores.
Não pode haver dúvida, embora ilustrado, o relatório sugere que alguns anéis sejam cedidos à Justiça paulista, evitando que se amputem alguns dedos que, no entanto, já estão gangrenados pela contaminação sofrida.
O pior é que dedos e anéis alheios, de alunos, funcionários e professores, serão cedidos também, a pretexto de servir à “ciência”, a um custo mais palatável para o governo paulista…
Portal Ambiente Legal em alerta
Convidado pela Comissão de Inquérito da Câmara Municipal de São Paulo, formada pelos Vereadores AURÉLIO NOMURA, POLICE NETO, RUBENS CALVO e TONINHO PAIVA, o Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal, Antonio Fernando Pinheiro Pedro abriu canal direto com a Casa de Leis da Municipalidade paulistana, para que todo o processo envolvendo a contaminação e a devida descontaminação da USP Leste transcorra com a máxima transparência.
Os vereadores paulistanos demonstraram nas reuniões havidas, grande empenho para com a questão, em especial após ouvir depoimentos de alunos e professores da USP Leste, o depoimento candente de uma aluna com suspeita de contaminação adquirida no Campus e receberem documentos e relatórios médicos preocupantes, referentes ao caso de contaminação. Convidados a depor perante a CPI, os dirigentes da Universidade não compareceram, sendo, então, intimados.
O PORTAL permanecerá, portanto, em alerta, com relação ao caso.
Será que até numa das maiores e mais conceituada universidade brasileira impera o descaso com a saúde pública?
Quais serão as consequências, no futuro, dessa falta de respeito com os alunos?
As respostas devem ser dadas pelos responsáveis dessa conclusão irresponsável.