Autoridades semearam arrogância e colheram o ódio da população
“Somos tratados como criminosos, bandidos da pior espécie pela forma truculenta que os policiais e agentes do IBAMA agem em nosso distrito”
(Pedro Oliveira morador de Humaitá)
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
A sede do IBAMA e do ICMBio em Humaitá – AM, amanheceu destruída pelo fogo, ateado por uma massa de garimpeiros e familiares injuriados com a destruição de suas balsas e instrumentos de trabalho, apreendidos pela fiscalização ambiental, destroçados e incendiados às margens do Rio Madeira. (*1)
Não se tratou de uma ação fria e premeditada. Foi uma reação criminosa, porém desesperada, face à ação arbitrária e desproporcional do IBAMA, que já colecionava protestos na região, pela forma arrogante e desrespeitosa com que estava atuando.
A revolta da população, outrossim, já vinha em um crescendo e todos os alertas foram disparados. Só as autocentradas autoridades ambientais é que não haviam percebido o risco.
Fiscalização e humilhação
Visando incrementar a fiscalização ambiental no Amazonas, agentes do IBAMA, sob cobertura do Ministério Público Federal e de forças policiais, agiram com energia contra madeireiras, laticínios e frigoríficos no distrito de Matupi e, em seguida, contra garimpeiros que agiam às margens da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Rio Madeira na região de Humaitá.
Matupi é um distrito distante 180 km de Humaitá, que sofre um surto de imigração por conta da instalação de indústrias de laticínios e frigoríficos, além de madeireiras. Trata-se de região sob pressão populacional e com problemas econômicos e sociais complexos. No entanto, a fiscalização do IBAMA fez tábula rasa da população, tratando a todos, infratores ou não, como se fossem meliantes a serviço do tráfico de drogas.
A covardia institucionalizada provocou reação inusitada. A população organizou protesto pacífico, e, em passeada pela cidade, exigiu providência das autoridades contra a forma de tratamento desumano promovida contra ela.
Face ao crescimento econômico de Matupi, os órgãos ambientais reagiram como fazem os biocentristas: declararam guerra aos seres humanos.
Segundo a imprensa local, “infelizmente os órgãos encarregados da fiscalização se tornaram verdadeiros guerrilheiros armados, agindo como se fossem donos do mundo, abordando trabalhadores, e moradores local como se estivessem em uma favela de traficantes armados”.(*2)
O fato jornalístico, no entanto, foi ignorado pela mesmerização que hoje atinge a imprensa em escala nacional.
“A população de MATUPÍ é grande e precisa ser tratada com respeito e não com violência“, disse Dona Ranilda, uma moradora da comunidade, ao jornal de Humaitá na última quarta-feira, 25 de outubro, quando centenas de moradores com cartazes e faixas saíram as ruas para protestar contra os abusos cometidos por funcionários do IBAMA, a cada visita que fazem ao distrito.
Em seguida, veio o desastre de fiscalização realizado à Margens do Rio Madeira, em Humaitá.
Com isso, o que seria uma ação louvável de exercício de controle territorial, tornou-se uma manifestação de arrogância biocentrista, com o uso de força desproporcional, de forma ostensiva e sem qualquer respeito pela situação de miserabilidade da população local.
Insensibilidade e mentalidade biocêntrica
Gestão ambiental envolve interesses difusos, os quais têm por característica serem intrínsecamente conflituosos e assimétricos.
Essa assimetria requer inteligência, efetividade e ação integrada. Jamais se resolve com a aplicação isolada da força bruta. Muito menos se resolve com arrogância.
O combate do governo ao crime ambiental, por sua vez, não autoriza seus agentes a agir com abuso e violência desproporcional.
Intervir em uma região miserável, dominada por atividades informais contaminadas pela criminalidade, exige cuidado.
Fazer uso da arbitrariedade contra gente sem alternativa de vida. Incendiar galpões, barcos, caminhões e destruir equipamentos, à vista de todos, com arrogância e intimidação, não induz respeito à autoridade, muito menos contribui para o Estado de Direito.
Arrogância biocentrista, não é procedimento legal, é ecofascismo.
Já tive a oportunidade de alertar sobre essa espiral comportamental, que vem contaminando perigosamente a gestão pública ambiental:
“O “operador do direito” e o “gestor público”, no biocentrismo, passam a ter o poder holístico de privilegiar recursos naturais globais, a cada decisão de caráter local. Isso os autoriza moralmente a descartar direitos, bens e pessoas, incluso o interesse nacional – tudo em nome da “revolta do objeto face à ação dos homens”.
Essa ideia da “revolta do objeto, face à degradadora atividade antrópica”, prioriza as coisas que cercam a atividade humana, conferindo-lhes status de sujeitos de direito, ainda que formalmente não o sejam.
Essa “elevação” de interesses interfere neurolinguisticamente na postura do biocentrista. Enaltece, eleva e envaidece. O resultado é a conformação do doutrinador em ditador de condutas politicamente corretas… para os outros.”(*3)
Como uma escola de pequenos ditadores, o biocentrismo atua na Administração de maneira a envolver os incautos numa cuia de vaidades intelectuais e carências emocionais reciprocamente estimuladas. Confunde interesse público com impulso psicológico de se imiscuir no comportamento moral alheio, de determinar a atividade econômica e social do outro.
Faltou gestão… e inteligência
A reação é de causa e efeito. Sem ter a quem apelar, a população, revoltada, só poderia terminar destruindo a sede do IBAMA e do ICMBio em Humaitá.
O episódio revela a absoluta incompetência das autoridades envolvidas. Revela, também, desconhecimento oficial completo da assimetria do conflito.
Faltaram gestão, inteligência, respeito e sensibilidade.
Nota ZERO para as autoridades, fiscais, policiais e militares envolvidos.
Pior é saber que…pela lógica econômica do fenômeno criminológico…essa ação desastrada não interromperá a degradação.
Notas:
(*2) A Crítica de Humaitá – População de Matupi realiza manifestação contra truculência do IBAMA
(*3) Pinheiro Pedro, Antonio Fernando – “Morte ao Biocentrismo Fascista”, in The Eagle View
Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional (Paris), membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, Vice-Presidente Jurídico da API – Associação Paulista de Imprensa. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.