Ferramentas complementares, Atlas da Mata Atlântica e SAD Mata Atlântica indicam que, entre 2022 e 2023, desflorestamento caiu na parte contínua do bioma, mas teve grande aumento em fragmentos isoladas e áreas de transição
Os dois principais mecanismos de monitoramento da Mata Atlântica trazem boas e más notícias para o meio ambiente. De acordo com o Atlas da Mata Atlântica, coordenado pela Fundação SOS Mata Atlântica e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o desmatamento no bioma caiu de 20.075 hectares em 2022 para 14.697 em 2023 – uma redução de 27%. Esses dados, no entanto, oferecem uma visão parcial do cenário.
O Atlas monitora áreas superiores a três hectares em florestas maduras, que constituem 12,4% do bioma. A Mata Atlântica, entretanto, inclui ainda regiões em recuperação ou em estágios iniciais de desenvolvimento, o que amplia sua cobertura florestal total para 24%. Essa é a abrangência do SAD Mata Atlântica, que, capaz de detectar desmatamentos a partir de 0,3 hectare, traz números preocupantes. Segundo o SAD, parceria entre a SOS Mata Atlântica e o MapBiomas, o desflorestamento total saltou de 74.556 para 81.356 hectares entre 2022 e 2023. É o equivalente a mais de 200 campos de futebol desmatados por dia.
Diretor executivo da Fundação SOS Mata Atlântica, Luís Fernando Guedes Pinto explica que a diferença entre os números se dá sobretudo pelo aumento das derrubadas observadas pelo SAD em encraves no Cerrado e na Caatinga, destacadamente na Bahia, no Piauí e no Mato Grosso do Sul. Embora o Atlas e o SAD tragam números aparentemente conflitantes, ambos apontam a mesma tendência de redução de desmatamento no bioma Mata Atlântica e aumento nos encraves dos outros biomas.
“É importante entender que, no passado distante, o Brasil era coberto por uma imensa floresta tropical. Ela foi se dividindo a partir das glaciações e mudanças no clima, mas, nesse processo, restaram o que podemos chamar de ‘ilhas’ de vegetação típica da Mata Atlântica dentro de outros biomas, os encraves”, esclarece. A Mata Atlântica, portanto, além de sua grande área contínua entre o Rio Grande do Norte e o Rio Grande do Sul, é composta também por regiões de transição e encraves nos estados do Ceará, Piauí, Goiás, Bahia, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul.
Os dados do Atlas mostram diminuição do desmatamento em grande parte dos 17 estados da Mata Atlântica – as exceções foram Piauí, Ceará, Mato Grosso do Sul e Pernambuco. Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina, que costumam estar entre os que lideram o ranking de derrubadas, desta vez se destacaram positivamente, com queda de, respectivamente, 57%, 78% e 86% nas taxas. A mesma tendência foi apontada pelo SAD.
Por outro lado, o SAD identificou também um aumento considerável do desflorestamento e nas transições e em encraves no Cerrado e na Caatinga – principalmente na Bahia, no Piauí e no Mato Grosso do Sul. Essa perda, mesmo com todas as restrições ao desmatamento estabelecidas pela Lei da Mata Atlântica, inclusive nos encraves, se deu majoritariamente onde há expansão agrícola.
“A redução no desmatamento na área contínua em parte da Mata Atlântica é um sinal encorajador de que as políticas de conservação e o monitoramento intensivo estão produzindo resultados positivos, assim como o que temos visto na Amazônia. Está evidente que os desafios na Caatinga e, especialmente, no Cerrado são maiores que nunca, assim como a aplicação da Lei da Mata Atlântica nas regiões de transição. Perto do Pampa, na Região Sul, a situação também é preocupante. Alguns dos municípios mais afetados pelas recentes enchentes no Rio Grande do Sul, como Muçum e São Francisco de Paula, fazem parte do bioma Mata Atlântica”, afirma Guedes Pinto.
Para ele, enquanto não houver um olhar integrado para todos os biomas, tanto no que se refere a zerar o desmatamento quanto à priorização da restauração florestal, as crises do clima e da biodiversidade continuarão a se intensificar. “De nada adianta puxar o lençol para a cabeça e descobrir os pés. Menos floresta representa mais desastres naturais, epidemias e desigualdade. Para a agricultura, significa também quebras de safra recorrentes. Qual é o sentido de termos tanta área agrícola se não conseguimos manter a saúde dos ecossistemas que sustentam a produção?”, questiona.
Ferramentas complementares
O Atlas da Mata Atlântica oferece uma “fotografia” anual da situação dos grandes fragmentos florestais do bioma – que são de maior importância para a biodiversidade – e pretende embasar políticas de longo prazo para a conservação da Mata Atlântica. “Os dados de desmatamento inventariados e publicados no Atlas são essenciais para que os municípios inseridos nos limites da Lei da Mata Atlântica possam organizar estratégias para conscientizar a população e políticas para o monitoramento da vegetação natural”, ressalta Silvana Amaral, pesquisadora e coordenadora técnica pelo INPE.
As informações compiladas pelo SAD, por sua vez, são divulgadas semanalmente na plataforma MapBiomas Alerta com o objetivo de gerar uma documentação ágil e completa para cada alerta de desmatamento, buscando celeridade e eficácia nas ações dos diversos órgãos de fiscalização.
“Os sistemas operam com métodos diferentes, ajustados aos seus objetivos, e os resultados se complementam e contribuem para uma compreensão mais completa da dinâmica da cobertura vegetal e uso da terra na Mata Atlântica. O SAD e o Atlas funcionam como ‘lentes’ analíticas distintas, mas ambos são essenciais para entender a história e a situação atual do bioma e para o desenvolvimento de estratégias de conservação e restauração”, diz Marcos Rosa, diretor da Arcplan e coordenador técnico do MapBiomas.
Os dados completos e detalhados estão disponíveis no relatório do Atlas da Mata Atlântica 2022-2023 e no painel do SAD Mata Atlântica. Tanto o Atlas quanto o SAD têm execução técnica da Arcplan e apoio do Bradesco e da Hempel Foundation.
Fonte: SOSMA
Publicação Ambiente Legal, 26/05/2024
Edição: Ana Alves Alencar
As publicações não expressam necessariamente a opinião dessa revista, mas servem para informação e reflexão.