Baixos índices de saneamento básico são a principal fonte de contaminação dos rios brasileiros: o despejo de esgotos doméstico sem tratamento e os remanescentes de estações representam cerca de 70% da carga de poluição que os rios e mananciais de regiões urbanas recebem diariamente.
Por Malu Ribeiro*
Embora o Estado de São Paulo tenha índices de saneamento básico acima da média do país, com 95% da população urbana atendida por serviços de água e 91% de coleta de esgoto, apenas 60% do esgoto coletado é tratado. Esses dados evidenciam que essa realidade precisa de esforços urgentes para ser transformada e nos ajudam a entender também o motivo pelo qual o Projeto de Despoluição do Rio Tietê, que completa 25 anos, avança num ritmo aquém das expectativas da sociedade.
“Quem vive na cidade de São Paulo e convive com o rio, tem a impressão de que tudo continua como antes, mas não. Mudanças significativas ocorreram na redução e controle da poluição industrial e na diminuição de toneladas de esgoto sem tratamento que eram lançados diretamente nos rios da bacia do Tietê, no início dos anos 90. Mesmo assim, muito ainda precisa ser feito e a cada década surgem novos desafios.”
No início do Projeto de Despoluição, o trecho morto do rio Tietê se estendia por 530 km, de Mogi das Cruzes até o reservatório de Barra Bonita. No fim de 2010, ao término da segunda etapa do Projeto Tietê, adotada como marco zero para o monitoramento das etapas atual e futuras, o trecho de rio morto compreendia uma extensão de 243 km, de Suzano até Porto Feliz. Após 25 anos de mobilização pela recuperação do Tietê, os indicadores medidos pela sociedade apontam resultados positivos, mesmo que ainda tímidos.
Recentemente, em comemoração ao Dia do Tietê (22/9), apresentamos os novos dados do monitoramento da qualidade da água e a evolução dos indicadores de impacto do Projeto Tietê, estudo que divulgamos anualmente, sempre nesta data, como resultado do projeto “Observando o Tietê”, da Fundação SOS Mata Atlântica, que reúne cidadãos e grupos voluntários para o acompanhamento de centenas de rios da bacia do Tietê.
O levantamento indica que a mancha anaeróbica de poluição no rio, trecho com qualidade de água ruim ou péssima, chega a 137 km, um recuo de 11,5% em relação ao ano passado, mas se mantém acima dos níveis pré-crise hídrica, em 2014, quando estava contida a 71 km. Em 2015, com a falta de chuvas e diminuição no ritmo de obras de coleta e tratamento de esgoto na Região Metropolitana de São Paulo, a mancha mais que dobrou e chegou a 154,7 km. A leve tendência de melhora neste ano se deve às chuvas que reabasteceram os reservatórios e contribuíram para a recuperação da vazão dos rios, ampliando a capacidade de diluição dos remanescentes de esgoto e poluição e a retomada das ações de coleta, tratamento de esgoto e ligação dos esgotos das casas e imóveis à rede de coleta de esgotos. Porém, as chuvas aumentaram a poluição difusa na bacia, com o carregamento de lixo, sedimentos e fuligem de asfalto, e arrastaram a poluição ao longo do rio no sentido do interior.
Os resultados do monitoramento são obtidos com a análise de 302 pontos de coleta distribuídos em 50 municípios de três regiões hidrográficas (Alto Tietê, Médio Tietê – Sorocaba e Piracicaba, Capivari e Jundiaí) e em 94 corpos d’água. Estas coletas são realizadas por meio de kits fornecidos a voluntários do projeto Observando o Tietê. Dos 302 pontos de coleta de água analisados na bacia do Tietê, entre 2015 e 2016, 30 deles registraram qualidade de água boa, 115 regular, 101 ruim e 56 obtiveram índice péssimo.
Podemos ter saído da situação extrema da crise hídrica em termos de quantidade de água disponível, mas não em relação à qualidade. E retornar aos indicadores pré-crise em curto espaço de tempo será impossível sem uma ação integrada do Estado, envolvendo Cetesb, Sabesp, DAEE, EMAE e todos os municípios da bacia hidrográfica.
Apenas coletar e tratar o esgoto dos rios metropolitanos não vai resolver. Precisamos medidas mais abrangentes, como investimentos em restauração florestal, aperfeiçoamento e mudança na legislação que trata da qualidade da água e controle de poluentes, que hoje permite que rios sejam usados para diluir esgoto.
“O fim de “rios mortos” no Brasil – que são os rios de classe 4 – que recebem na grande maioria esgotos sem tratamento algum, é uma das principais bandeiras da campanha “Saneamento Já!”, assim como a universalização do saneamento básico e a luta por água limpa nos rios e praias brasileiras.” A petição está disponível para assinaturas no site www.saneamentoja.org.br.
O fato é que se os investimentos na recuperação do rio permanecerem no ritmo atual, serão necessárias pelo menos mais duas décadas para que a bacia apresente condição ambiental satisfatória e boa qualidade e disponibilidade hídrica.
Não temos mais tempo. É urgente a necessidade de universalizar o saneamento e ampliar o volume de esgotos tratados, além de aperfeiçoar a legislação e políticas públicas de saneamento ambiental, ações que não estão limitadas a Sabesp, executora do Projeto de Despoluição, e devem ocorrer de forma integrada por todos os municípios da bacia hidrográfica e Governo Estadual, com participação da iniciativa privada e sociedade. Somente com um programa integrado de saneamento ambiental, que agregue às ações atualmente realizadas, programas de resíduos sólidos, recomposição florestal, conservação de mananciais e a universalização do saneamento básico, daremos um passo decisivo para a despoluição efetiva do rio Tietê
Fonte: SOSMA
*Malu Ribeiro é coordenadora da Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica, ONG brasileira que desenvolve projetos e campanhas em defesa das Florestas, do Mar e da qualidade de vida nas Cidades. Saiba como apoiar as ações da Fundação em www.sosma.org.br/apoie.
Artigo de Malu Ribeiro* originalmente publicado no Uol
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E, apesar dos pesares, os coxinhas paulistas seguem felizes. E o tucanato agradece!