LUTAS VERSUS APROPRIAÇÃO DO CAPITAL INTELECTUAL
Por Marilene Nunes (*)
“A mesma realidade que cria o processo de burocratização cria a reação . E estar vivo significa estar aberto e atento às reações nesse processo”
Maurício Tractenberg
Introdução
Este texto é um ensaio teórico que procura discutir a correlação entre as práticas sociais de lutas de trabalhadores docentes das escolas públicas como um dos fatores determinantes na criação de políticas públicas que interferem na reorganização do processo de trabalho docente impondo-lhe novas formas de gestão de controle que atinge o modo operatório da sua realização.
Defino como lutas sociais dos trabalhadores docentes todas as relações sociais que estabelecem experiências de confronto às formas de organização e gestão do trabalho docente, gerando práticas sociais de resistências aos padrões de normalização do mesmo. Desse modo, pode-se aferir que as transformações que ocorrem nas organizações escolares não resultam somente da prática social dos gestores da administração pública, mas do embate entre eles e os trabalhadores docentes. Do resultado da correlação de forças emergem uma variante de tecnologias disciplinares, sob a forma de novas políticas e modelos de gestão que recuperam o conteúdo revolucionário das lutas, integrando-as à ordem institucional. Utilizo-me do paradigma da forma valor trabalho, Marx (1988) para explicar esta dinâmica. Empregar o binômio valor-trabalho, no setor de serviços, é uma heresia para a maioria dos marxistas ortodoxos. Para mim, o marxismo não é uma religião, mas sim uma teoria que pode ser revisada e transformada para tornar inteligíveis os fenômenos da realidade, não tenho, portanto, constrangimento de proceder a crítica porque entendo-a como uma forma de renovação da teoria.
O capitalismo contemporâneo estendeu a forma valor trabalho para todos os âmbitos da produção, não a limitando ao setor industrial. Este fenômeno está modificando profundamente as relações entre capital e trabalho.
Estudos na área da sociologia do trabalho demonstram que é no setor dos serviços que se concentram, hoje, toda a riqueza e a produção de valor econômico. Na esfera dos serviços num prazo extremamente curto, o conteúdo operacional do trabalho se tornou muito complexo a partir do implemento em larga escala de tecnologia da informação, implicando na aquisição, pela força de trabalho, de novas competências que transcendem as habilidades do uso da informática, evocando como fator de produtividade o desempenho das capacidades do intelecto humano.
A componente intelectual do trabalho se converteu no que a economia capitalista vem denominando de capital intelectual, o principal ativo econômico gerador da riqueza social. As organizações empresariais que priorizam o capital intelectual atualmente se constituem no paradigma institucional econômico da sociedade globalizada.
Atualmente 50% das empresas que mais crescem nos Estadas Unidos são descritas como empresas do conhecimento. Algumas dessas organizações estão situadas nos setores de energia, assuntos ambientais, software de computadores, treinamento e P&D (Centros de Pesquisa e Desenvolvimento vinculados às empresas), escolas e universidades. Nessas organizações, com exceção das últimas, o aumento do conteúdo complexo do trabalho operou radical mudanças nos padrões de gerenciamento, de modo a aproveitar as capacidades criativas dos trabalhadores.
A nova força de trabalho escolarizada e qualificada é extremamente valorizada pelas organizações do conhecimento porque aumentam a receita e não criam custos. Detentores de capital cultural, estes trabalhadores gozam vantagens jamais alcançadas na história do movimento dos trabalhadores e ainda impõem as empresas à renovação dos sistemas de gestão. Para exemplificar, cito o caso, no Brasil da PROMON, empresa ligada ao setor de telecomunicações e infraestrutura para portais na Web. Toda a empresa está organizada na forma de uma rede de talentos, recursos e conhecimentos de ideias, a valorização desses recursos criou um sistema comunitário denominado capital social. O conhecimento e a experiência valeriam mais que a posição na hierarquia. A PROMON concebe uma empresa cujos únicos acionistas e herdeiros seriam seus profissionais em atividade.
O caso PROMON explica um fenômeno que é corrente no processo competitivo em mercados globalizados, que é a crescente paridade da qualidade dos produtos e serviços. Esse processo denominado de “padronização da qualidade” estimula a criação de diferenciais competitivos entre as empresas concorrentes. Esses diferenciais, capazes de superar qualquer tecnologia material como o computador, nada mais é do que um agregado de valor proveniente das habilidades intelectuais dos trabalhadores.
No entanto, apesar da querela capitalista em torno do conhecimento como potencial econômico, observa-se que as mudanças gerenciais, a partir da valorização do capital intelectual, estão ocorrendo somente nos limites dos espaços empresariais; de outro modo, em organizações genuinamente produtoras de capital intelectual, como as escolas públicas, o paradigma de gestão tem ficado no marco dos princípios do taylorismo.
Na sequência do texto analiso este fenômeno a partir dos conflitos sociais entre trabalhadores docentes e gestores da administração pública, mostrando haver um conflito radical entre a visão burocrática do estado e as necessidades reais das organizações produtoras de conhecimento, no tange a gestão do trabalho ali realizado.
Trabalho docente e forma valor trabalho: o centro da dinâmica do conflito social
Contrário as análises socioeconômicas tradicionais, penso que a formação da força de trabalho se insere no circuito da produção tendo como dinâmica as próprias lutas sociais engendradas pelos trabalhadores docentes em conflito com os gestores da administração pública. Tenho como princípio a equação da mais-valia, que se estrutura no paradigma da defasagem entre dois tempos. Esta equação, no caso do trabalho docente, pode ser expressa da seguinte forma:
Toda a força de trabalho que no interior das organizações escolares públicas, labora diretamente na produção da formação da força da força de trabalho das futuras gerações proletárias, ou ainda, que reconstituem a força de trabalho ativa através do implemento de maior qualificação incorpora nesse processo um tempo de trabalho superior ao tempo de trabalho despendido na produção de sua própria força de trabalho, produzindo um mais valor.
A defasagem entre os dois tempos de trabalho, um na produção (trabalho na escola) e outro na reprodução da força de trabalho docente (consumo de subsistência), estabelece uma relação conflitual entre os trabalhadores docentes e os gestores da administração pública, na medida em que a prática pedagógica do professor exige um processo continuo de formação que resulta em maior qualificação que irá intensificar a produtividade do trabalho docente. A chave para a compreensão dessa equação reside no fato de que quanto mais complexo se torna o trabalho mais intensivo e produtivo ele é. Um trabalhador contemporâneo, cuja atividade seja altamente complexa e que cumpra um horário de sete horas por dia, trabalhará muito mais tempo real do que alguém de outra época, que estivesse sujeito a um horário de quatorze horas, mas cujo trabalho tivesse baixo grau de complexidade.
A desigual relação entre aumento da qualificação e intensificação da produtividade do trabalho docente ameaça constantemente a desestabilizar o sistema escolar da rede pública, porque o agregado de valor proveniente do aumento de trabalho complexo não é contabilizado no processo de assalariamento dos docentes. Dessa relação social de exploração emana todo o conflito trabalhista nas organizações escolares.
Expor as práticas sociais como elemento desencadeador das transformações informa que utilizo um paradigma de análise para o entendimento do processo de trabalho na escola pública diferente em vários aspectos no modelo teórico pensado por Marx para analisar o processo de trabalho no setor industrial, embora utilizo como ferramenta conceitual às categorias de mais-valia e do valor trabalho. Para Marx, a força de trabalho só vai se inserir nas relações sociais capitalistas a partir do assalariamento nas unidades de produção entendidas como empresas do setor industrial. De outra forma, penso que a força de trabalho já está inserida nessas relações muito antes desse processo. Ou seja, o capitalismo é pensado como um modo de produção integrado, na medida que para o trabalhador cai à barreira que separa o mundo público do privado. Se a própria força de trabalho em sua formação está inserida na lógica do valor, então a produção não pode se restringir ao setor industrial, mas a economia na sua ampla totalidade.
Na economia de produção globalizada, a classe capitalista detém a posse total do tempo de trabalho dos trabalhadores muito antes da sua suposta venda no mercado de trabalho, uma vez que os trabalhadores se relacionam com os capitalistas organizados e não com um capitalista em particular. A integração dos capitalistas decorre do processo de globalização da economia que confere as empresas transnacionais poderes de Estado. No capitalismo globalizado, o Estado se articula por meio de um triângulo corporativista que envolve o Estado Amplo (empresas) e o Estado Restrito (Estado Nação) além dos sindicatos burocratizados.
No início da constituição do modo de produção capitalista, as empresas (Estado Amplo) não eram capazes de criar as Condições Gerais de Produção (infraestruturas) na sua própria esfera. Para desenvolvê-las tiveram que reorientá-las no âmbito do Estado Nação (Estado Restrito), cabendo-lhe a gestão dos recursos tecnológicos para a sua integração. O capitalismo só pode funcionar por meio da integração tecnológica, e parte dessa tecnologia é produzida pelos setores dos serviços geridos no âmbito do Estado Nação (Estado Restrito).
O Estado Nação como instituição pública é uma abstração. A sua existência está pautada por uma prática econômica privada que é garantir a sobrevivência material das empresas. Os recursos financeiros, que denominamos de público, são capitais que decorrem da distribuição global da mais-valia entre os capitalistas.
Nos primórdios do capitalismo em que a quase totalidade das empresas eram territorializadas, a gestão das Condições Gerais de Produção (infraestruturas) era originária do fundo público proveniente dos impostos lhes cobrados. Porém, com a crescente transnacionalização das mesmas, os capitais se tornaram voláteis, impossibilitando a sua retenção nos limites da territorialização. A partir de então o paradigma de financiamento centrado no fundo público tornou-se inviável e com ele o gerenciamento das infraestruturas entrou em colapso.
O modelo de financiamento com base no fundo público foi adequado para o capitalismo industrial (territorizado) e não para o capitalismo de serviços (globalizado). Hoje o que se convencionou chamar de privatização nada mais é do que a descentralização da gestão e do financiamento das organizações de base tecnológica para o âmbito das empresas (Estado Amplo), que estão instituindo novas formas de financiamento por meio da mercantilização dos serviços direto ao consumidor. Exemplo são todas as políticas erroneamente denominadas de neoliberais.
A mais-valia produzida pelo setor “público”, no antigo padrão industrial, era apropriada indiretamente pelos capitalistas e distribuída globalmente por quotas desiguais, conforme o grau de investimento do capital particular. O mapa da distribuição da mais-valia pelo Estado Nação (Estado Restrito) entre os capitalistas pode ser visualizado por meio do acesso as infraestruturas geridas pelo Estado Nação. As empresas que possuem as maiores receitas são aquelas que usufruem mais diretamente das tecnologias de sustentação da produção (energia, sistema de transportes, saneamento, educação etc.) e inversamente as menores receitas terão o acesso mais limitado, caso das empresas médias e as nanicas.
O financiamento do bem-estar social, como educação e saúde, se insere nos mecanismos da gestão privada do Estado Nação (Estado Restrito), na medida em que estes serviços são oferecidos como salário indireto para que a força de trabalho possa se reproduzir através da escolarização e por meio da manutenção biológica da sua existência. Neste texto, como estou analisando a produção da força de trabalho, inserida na lógica do valor trabalho, então a reprodução se refere ao momento em que a força de trabalho, ao produzir seu salário, cria valor produzindo serviços e mercadorias.
Por outro lado, chamo de produção o estágio de formação da força de trabalho, ou seja, o momento em que esta incorpora valor através do consumo. A defasagem entre os tempos de trabalho na reprodução-produção da força de trabalho consiste em que no estágio de sua produção é exigido sempre mais valor incorporado em si mesma, valor agregado, seja através do consumo de mercadorias (vestuário, alimentação) ou serviços (educação, saúde), porém estes valores não entram no computo total no processo do assalariamento, no instante da reprodução. Isto significa que a força de trabalho vale, na reprodução, sempre menos valor do que incorpora durante a sua produção. Este processo leva a uma crescente desvalorização da força de trabalho ativa.
Inserida neste paradigma grande parte da força de trabalho dos trabalhadores docentes das escolas públicas tem sido a mola propulsora das transformações e reformas sociais nos sistemas educacionais. Esse processo sobrevém através das lutas e dos movimentos sociais engendrados por esses trabalhadores e se manifestam tanto no âmbito do processo de trabalho docente bem como nas instituições da esfera política como nos sindicatos e partidos políticos.
O modelo de relação social de produção fundado na mais-valia é contraditório em si mesmo, pois exige da força de trabalho sempre maior qualificação e desvalorização em etapas diferenciadas de um mesmo processo. Isso leva a crescente resistência dos trabalhadores no sentido de exigir sempre maior valorização de suas forças de trabalho. A essas práticas sociais dos produtores, os capitalistas respondem implementando novas tecnologias de gestão no processo de trabalho provocando a sua reorganização e redução dos conflitos sociais.
Em suma, controlar a força de trabalho para que permaneça no paradigma da mais-valia é a resposta capitalista que resulta desse antagonismo social. A partir dessa realidade, posso afirmar que controle de tempo de trabalho é sinônimo de mais-valia. Nas organizações escolares, os conflitos gerados por essas contendas ocorrem entre os trabalhadores docentes e as chefias internas as quais as suas forças de trabalho estão subordinadas e contra os gestores da administração estatal no sistema de ensino como um todo. As lutas e os movimentos sociais realizados pelas práticas sociais dos docentes se manifestam de maneiras diversas.
Eu as classifico em três tipos: individuais, coletivas passivas e coletivas ativas.
Lutas individuais dos trabalhadores docentes
As lutas de caráter individual ocorrem sempre no local de trabalho. Nas instituições escolares públicas as lutas individuais se manifestam basicamente pelo o absenteísmo (faltas ao trabalho) ou por meio da sabotagem (fraude) à realização plena do trabalho docente.
A sabotagem só se torna possível quando o controle do processo de trabalho é ínfimo.
Nas formações sociais capitalistas, com predominância na exploração da mais-valia absoluta, a não exigência de constituição de força qualificada, decorrente da baixa produtividade das empresas, não impõe ao processo de trabalho docente um maior controle da qualidade da educação formal escolarizada.
Assim, os docentes encontram no interior da escola um maior espaço para exprimirem seus inconformismos aos baixos salários e às condições de trabalho.
A realização das práticas individualistas de lutas pela sabotagem se efetiva quando os trabalhadores docentes:
1) burlam as determinações burocráticas do sistema de ensino, não cumprindo as exigências da carga horária mínima, reduzindo o tempo de trabalho mínimo incorporado à força de trabalho em formação (alunos);
2) desenvolvem, parcialmente, em sala de aula, o currículo mínimo estipulado pela legislação de ensino;
3). solapam, no processo de avaliação, o enquadramento a um padrão avaliativo comum, driblando o controle mínimo de qualidade do produto do trabalho docente: o aluno;
4). não zelam pelos meios de trabalho utilizados no processo de realização do seu trabalho. Notem que os itens acima referidos atingem diretamente a questão tempo de trabalho e controle do mesmo.
Ao reduzir a magnitude do tempo despendido na prática de ensino por meio do absenteísmo e a fraude, os docentes antecipam a desvalorização da força de trabalho dos alunos. A depreciação que sobreviria quando eles se empregam já se evidenciam nas instituições formadoras da sua educação.
As escolas públicas produzem um serviço que é consumido por tipos distintos de usuários: os alunos, que as buscam na tentativa de implementar mais qualificação às suas forças de trabalho e os capitalistas que empregarão parte destes trabalhadores. Numa situação de mais-valia absoluta serão os usuários do primeiro exemplo que terão sofrido frontalmente os feitos da sabotagem, porque a redução do tempo de trabalho incorporado em si, implica na desvalorização. Essa realidade fará com que eles pressionem o Estado para que exerça maior controle na administração do sistema de ensino.
Os movimentos sociais por uma escola pública de qualidade, na história educacional brasileira, têm sido uma constante. Basta examinarmos a legislação de ensino. As leis têm representado no plano legal a busca de um equilíbrio conciliatório entre as reivindicações dos usuários trabalhadores e o empresariado omisso, mas consciente de que o aumento de qualificação da força de trabalho reverte em investimentos tecnológicos na generalidade das esferas produtivas. E isso numa situação de mais-valia absoluta provocaria crises políticas e econômicas de efeito devastadores.
As lutas individualistas dos trabalhadores docentes sejam elas de caráter absenteístas ou de sabotagem, tendem a estimular pressões dos usuários do sistema de ensino junto aos gestores da administração pública, cujas respostas vão desde a violência contra aos usuários queixantes até o controle direto da prática pedagógica dos professores por meio de paradigmas tayloristas de gestão.
Lutas sociais coletivas passivas dos trabalhadores docentes
Este tipo de luta social se caracteriza pela organização coletiva dos trabalhadores, porém não envolvendo nesse processo sua participação ativa. Ao delegarem a condução dos movimentos sociais às vanguardas representativas de sua classe, os trabalhadores docentes reduzem sua ação e, portanto, seu poder decisão. Essa prática transfere o ato de fazer política, do cotidiano das práticas sociais dos trabalhadores docentes do interior das escolas para as organizações específicas como os sindicatos e os partidos políticos, levando necessariamente à institucionalização do político. Por isso as defini como passivas.
Desses movimentos sociais, os realizados via sindicatos vêm se tornando instrumento de reformas que culminam na reorganização da gestão do trabalho nos limites da ordem capitalista. Os sindicatos dos trabalhadores docentes não são alheios à tendência de padrão mundial dessas instituições, ou seja, de operar a negociação evitando o conflito com direto com as organizações patronais, de que no setor de serviços
As formas de lutas dirigidas pelos sindicatos se desenvolvem através das greves, que poderão ser mais enfaticamente políticas ou econômicas, ou as duas concomitantes. As greves são táticas de paralisação que atingem parcialmente o tempo de trabalho. Nas escolas, as práticas de greve cessam temporariamente o trabalho pedagógico, o que resulta na interrupção da incorporação de valor na formação dos futuros jovens trabalhadores.
É evidente que as lutas coletivas desenvolvidas pelos sindicatos, tendo as greves como suporte, também atingem diretamente os alunos enquanto usuários. Mas agora não se trata da pressão usuários versus fornecedores dos serviços educacionais, mas de produtores para assalariados. Nesse sentido, as lutas sindicais, ao convergirem para o estado, impulsionam respostas muito mais rápidas dos gestores da administração pública.
Estas respostas se constituem num grau de complexidade muito maior do que aquelas dadas às lutas absenteístas e de sabotagem, pois envolvem um amplo processo de reorganização da máquina burocrática do sistema de ensino, além da implementação tecnológica no processo de trabalho na escola. Essas tecnologias implicam numa série de mudanças organizacionais que vão desde a transformações na arquitetura dos prédios escolares, criando ambientes mais integrados, distintos do panoptismo que sempre serviu de modelo para prisões, hospitais e escolas, até a implementação de tecnologias informacionais, mas nos padrões da Reengenharia e da Qualidade Total, ou seja, valoriza mais as máquinas em detrimento do ser humano.
As tecnologias informacionais geram e acumulam informação e informação não é conhecimento. O conhecimento é ação que se origina da habilidade cognitiva humana de associar distintas informações para produzir algo novo. Não se discute a validade das tecnologias informacionais, mas a sua implementação nas organizações do conhecimento somente tem sentido por meio de uma profunda transformação gerencial em que os trabalhadores passam de recursos humanos, para o principal ativo gerador de valor de que a máquina é apenas um acessório.
Lutas sociais coletivas de natureza ativa dos trabalhadores docentes
A resistência à inclusão às relações sociais de produção capitalistas diz respeito às lutas sociais dos trabalhadores quando estas se autonomizam dos movimentos sindicais, passando a tingir diretamente as formas organizacionais do processo de trabalho, originindo as condições para transcender o marco do próprio capitalismo.
Os tipos de lutas cujas práticas sociais têm sido antagônicas às formas de produção são as de natureza coletivas ativas. Elas são as contendas mais temidas pelos capitalistas, pois se caracterizam pela ocupação do local de trabalho incidindo na autogêrencia da produção. O componente revolucionário nesse tipo de luta não é a autogêrencia em si mesma, mas o fato dessa proporcionar padrões não-capitalistas de produção. Nesse processo são criadas relações sociais que quebram com a hierarquia e a disciplina no local de trabalho, atingindo diretamente o paradigma da produção pelo controle do tempo de trabalho.
Pode-se medir a capacidade revolucionária de uma luta social pelo grau em que esta atinge o modelo de relações sociais fundados no controle do tempo de trabalho. Historicamente, não há registro de lutas sociais de caráter coletivo-ativo realizadas por trabalhadores docentes; de outra sorte abundam experiências autogestionárias em vários outros grupos sociais proletários.
Referências Bibliográficas
BERNARDO, J. A produção de si mesmo. Educação em Revista. Belo Horizonte: nº 9, 1989.
MARX, K. O Capital. Rio de Janeiro. Editora Bertrand Brasil, 1988. Qualitymark Editorial.
NUNES, M. Lutas e movimentos sociais dos trabalhadores docentes das escolas públicas: integração e desintegração das formas organizacionais de gestão do trabalho docente. XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil
NUNES, M. Trabalho docente e sofrimento psíquico: proletaização e gênero. São Paulo: Tese (Doutorado) Universidade de São Paulo, 1999.
MARX, K. O Capital. Rio de Janeiro. Editora Bertrand Brasil, 1988. Qualitymark Editorial.
(*) Marilene Nunes é Doutora em Gestão e Políticas Públicas pela (USP), Mestre em Economia Política (UFRGS), Especialista em Gestão do Conhecimento (FGV – SP).
…
Muito interessante e inteligente seu texto, principalmente a primeira parte que fala sobre o capital intelectual, parte que eu tenho mais condições de comentar, que explica aquele artigo que foi publicado dizendo que os trabalhadores nos EUA são mais produtivos que no Brasil. Na verdade o que faz aqueles trabalhadores mais produtivos é o uso do capital intelectual.
http://www1.folha.uol.com.br/…/1635927-1-trabalhador…
Um belo exemplo sobre o uso bem sucedido do capital intelectual: existe uma empresa aqui em Cambridge chamada ARM (nenhuma relação com “braço” em ingles!) criada a partir de um acordo entre a Apple, Acorn (antiga fabricante inglesa de computadores) e VLSI (fabricante de semicondutores posteriormente comprada pela Philips e que hoje é a NXP) com o objectivo de desenvolver um processador (dispositivo semicondutor onde o software é executado) a ser usado pela Apple no seu projeto Newton (PDA fabricado entre 1993 e 1998) e pela Acorn no projeto Acorn Archimedes (que veio a se tornar um dos microcomputadores mais potentes entre o final dos 80s e começo dos 90s). Esse novo processador usava tecnologia desenvolvida por uma moça chamada Sophie Wilson (*).
O objetivo da ARM não era fabricar o novo processador, mas apenas desenha-lo. Hoje esse processador é usado em 98% dos telefones celulares (já havia mensionado isso) e pelo menos 80% dos aparelhos eletrônicos modernos. A empresa fabrica apenas “papel”, ou melhor, propriedade intelectual – ou ainda melhor, ela é uma empresa de conhecimento! Grandes fabricantes de semicondutores (como ST, NXP, Infineon, Samsung, Apple, Broadcom, até mesmo a Motorola que fabricava o proprio processador decidiu usar o da ARM, a lista é longa) compram o projeto e fabricam seu processador. Todos esse fabricantes usam ARM porque é mais barato, pratico, e reduz o tempo e investimento no projeto, o que chamam de time-to-market. No caso da Apple, como ela fez parte da fundação da ARM, eles usam uma versão modificada do projeto original, mas claro ela foi diretamente beneficiada – hoje esse processador é usado no iPod, iPad e iPhone. Quanto eu trabalhava na Broadcom (**), a ARM era fornecedora (porque usavamos seu processador) e concorrente, porque a ela também fabrica acelerador grafico, concorrendo com a divisão da onde eu exatamente trabalhava. Eu não conheço situação semelhante onde a mesma empresa é fornecedora e concorrente ao mesmo tempo, no mesmo projeto. Fato interessante é que hoje Sophie Wilson é diretora de projeto de semicondutores (IC Design) na Broadcom e tive a oportunidade de esbarrar com ela varias vezes, apesar dela trabalhar numa outra divisão.
O valor do trabalho dos engenheiros da ARM é tão alto porque é uma mão-de-obra (ou trabalho intelectual) rapidamente convertida em riqueza (lucro), o que mais uma vez explica aquela artigo sobre os trabalhadores dos EUA serem mais produtivos e tambem sobre o seu texto que 50% das empresas que mais crescem são os P&D e vinculadas à universidade. Os dois textos também se aplicam à Inglaterra. A ARM é apenas um exemplo.
Grande beijo!
(*) O nome de batismo de Sophie é Roger Wilson (transsexual).
(**) Não, hoje eu não trabalho na ARM apesar de ter tentado varias vezes. Ano passado quando saí da Broadcom quase consegui!!
BASTANTE ANALÍTICA E AMPLA DE CONTEÚDO SUA ANÁLISE !!!
…talvez “fujo” do CONTEXTO exposto e dito, entretanto, apenas citando-lhe algo como uma PARTE QUE SEMPRE OBSERVO: o item “conflitos sociais entre trabalhadores docentes e gestores da administração pública”; a POSIÇÃO dos GOVERNOS diante da ‘EDUCAÇÃO’, vejo-a como uma espécie de “SEI QUE A EDUCAÇÃO SEJA ISSO E AQUILO, MAS, QUERO-A ASSIM E ASSADO – PORQUE UMA COISA É A OBRA, A OUTRA É O ARTISTA DELA” !!! Não sei se me fiz por entender… Independente da FORMAÇÃO PEDAGÓGICA que o DOCENTE tenha, acima do conhecimento adquirido e tudo o mais relativo ao seu GRAU de qualificação, vai existir sobre ele a “POLÍTICA” (“interesses”) do GOVERNAMENTAL.
((( Profª Marilene Nunes … Diante do citado por Marcio Cherobim, entre os anos de 1990 e 1996, os chamados “Tigres asiáticos” (Cingapura, Coreia do Sul, Taiwan e Hong Kong) estiveram no ápice / auge da produção industrial e comércio mundial dos seus bens; e eu, através da mídia em 1994 (especialmente no “Jornal Gente” da Rádio Bandeirantes AM – São Paulo, e, nas aulas de História Contemporânea do Profº Wagner Horta, TV Cultura – Canal 2, São Paulo) tomei conhecimento que ESPECIFICAMENTE NO SETOR DAS MONTADORAS DE AUTOMÓVEIS: 1 trabalhador asiático (dos “Tigres”) poderia substituir cerca de 6 trabalhadores norte-americanos.
Pareceu-me que o GOVERNO dessas citadas regiões deram (ou tentaram dá) às outras todas ESTRUTURAS SOCIAIS o mesmo âmago visto no ‘campo industrial’; quer dizer: não basta apenas uma POLÍTICA que faça “mover” determinado “campo” que forma uma NAÇÃO, o ‘conjunto’ das ‘bases de sustentação’ de um país, vai muito além do seu aspecto ECONÔMICO !? )))