Por Leandro Eustaquio*
O surgimento de um novo vírus, identificado em Wuhan na China em Dezembro de 2019, é o responsável pela disseminação da doença denominada Covid-19, que pode causar diversos sintomas, dentre eles o desenvolvimento de doença respiratória grave.
A Covid-19 foi, inicialmente, declarada como Emergência de Preocupação Internacional em 30/01/20, para, em 11/03/20, ser declarada como Pandemia pela Organização Mundial de Saúde.[1] Enquanto este artigo estava sendo redigido, a Covid-19 já tinha infectado 3.502.956 pessoas e levado a óbito 245.081 pessoas mundo afora[2]. Após o primeiro caso diagnosticado no país, em 26/02/2020[3], o Brasil já soma 96.559 casos confirmados e 6.750 mortos. Depois da publicação deste artigo os números já serão outros.
A Pandemia, que se alastrou rapidamente por todo o planeta, produziu diversos efeitos na área do Direito Ambiental, conforme apontado pelo especialista Talden Farias em artigo recém publicado[4], e também trouxe consequências na destinação final de resíduos, dentre eles os resíduos hospitalares.
Notícia veiculada pelo Jornal Estado de São Paulo[5] dá conta de que o volume de resíduos hospitalares vai aumentar quatro vezes, aumento esse que foi informado pela Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos ao Ministério da Saúde ainda no mês de abril.
É natural que a preocupação da geração de resíduos tenha como foco os hospitais, pois é para lá que as pessoas contaminadas devem se dirigir, para se cuidar e se tratar. É nos hospitais que estão também diversos profissionais da área de saúde, técnicos, enfermeiros, médicos, que podem se contaminar, inclusive.
A preocupação tem volume, tem foco e também tem dimensão, já que o novo Corona Vírus poderia sobreviver por 72 horas em superfícies e teria potencial de se espalhar por todo o material onde ele for alocado, replicando a contaminação.
Vale lembrar que todo hospital deve fazer o gerenciamento dos resíduos desde a geração até a disposição final, de forma a atender aos requisitos ambientais e de saúde pública e saúde ocupacional, sem prejuízo de responsabilização solidária de todos aqueles que, direta ou indiretamente, causem ou possam causar degradação ambiental, em especial os transportadores e operadores das instalações de tratamento e disposição final. Pelo momento atual, os hospitais devem redobrar sua atenção, exigindo de seus profissionais respeito ao protocolo determinado.
Todavia, não são apenas os hospitais que devem fazer a gestão dos resíduos contaminados. O gerenciamento de resíduos deve ser feito por todo e qualquer serviço gerador de resíduos de saúde relacionado com o atendimento à saúde humana ou animal. Também devem fazer o gerenciamento os serviços de assistência domiciliar e de trabalhos de campo, os laboratórios analíticos de produtos para saúde, os necrotérios, as funerárias e serviços onde se realizem atividades de embalsamamento, os serviços de medicina legal, as drogarias e farmácias inclusive as de manipulação, os estabelecimentos de ensino e pesquisa na área de saúde. Da mesma forma, estão obrigados ao gerenciamento, os centros de controle de zoonoses, os distribuidores de produtos farmacêuticos, os importadores, os distribuidores e produtores de materiais e controles para diagnóstico in vitro, unidades móveis de atendimento à saúde, serviços de acupuntura, serviços de tatuagem, entre outros similares.
De toda forma, a questão da gestão dos resíduos precisa ser internalizada, para dentro dos nossos lares, com o perdão da necessária redundância. Com as medidas quem vêm sendo adotadas durante o período da quarentena, como o isolamento social e uso obrigatório de máscaras em boa parte dos Municípios Brasileiros[6], outra situação tem gerado preocupação: o correto descarte de resíduo produzido dentro de casa, com material possivelmente contaminado.
Toneladas e toneladas de lixo contaminados com vírus da Covid-19 são produzidas dentro das casas com doentes isolados, em tratamento. A despeito dos serviços geradores de resíduo de saúde, que devem seguir um protocolo pautado por normas da Agência de Vigilância Sanitária[7] e do Conselho Nacional do Meio Ambiente[8], não há qualquer orientação normatizada quanto ao que deve ser feito com o resíduo domiciliar.
Na falta de protocolo, os cuidados dispensados aos pacientes hospitalizados também podem ser feitos dentro de casa. A prevenção por parte dos familiares, por parte das pessoas que residam ou frequentem o mesmo ambiente deve ser contínua.
Se o cidadão que não tem nenhum sintoma do coronavírus ainda pode continuar separando o resíduo de forma convencional, as pessoas que têm sintomas ou já tiveram diagnóstico positivo precisam abrir os olhos e mudar de atitude. Recomenda-se fazer a segregação, o acondicionamento e a identificação do material contaminado, que é o protocolo determinado pela Anvisa para os Geradores de Resíduos de saúde. É um procedimento simples. Basta cautela, prevenção e boa vontade.
Depois de segregado, o resíduo contaminado pode ser acondicionado em sacos duplos, por exemplo. Acondicionar em sacos duplos significa colocar o lixo em uma sacola, e, posteriormente, envolver em outro saco, para diminuir as possibilidades de contaminação. Isso vale para todo o material com o qual tiveram contato aqueles que testaram positivo. As luvas e máscaras podem ser colocadas em sacos duplos, devendo ser descartadas no mesmo local que o lixo comum, para que seja coletado e encaminhado ao aterro sanitário. A identificação do material contaminado é a etapa mais fácil.
Embora simples, requer mudança de hábito, mudança cultural. Talvez a Pandemia consiga êxito rumo a um “novo normal” para o gerenciamento dos resíduos, efetivando aquilo que é determinado pela Política nacional de Resíduos Sólidos[9] há 10 anos, de que a responsabilidade pela gestão dos resíduos sólidos é de responsabilidade de todos, sejam pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, diretamente ou indiretamente, pela geração de resíduos. Ou seja, é possível que se inicie de dentro de casa.
Notas:
[1] Informação prevista em https://www.who.int/dg/speeches/detail/who-director-general-s-opening-remarks-at-the-media-briefing-on-covid-19—11-march-2020. Acesso em 28/04/20.
[2] Informação disponível em tempo real: https://www.worldometers.info/coronavirus/?fbclid=IwAR0zkpRD_zQZb4UkziGI_Xvv75s5Q3eynf7-f9pOspxGbgHbe7OqpGBrIBI. Acesso em 03/05/20.
[3] Disponível em https://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/46435-brasil-confirma-primeiro-caso-de-novo-coronavirus. Acesso em 28/04/20.
[4] https://www.conjur.com.br/2020-mai-02/ambiente-juridico-efeitos-praticos-covid-19-advocacia-ambiental?pagina=5
[5] https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,lixo-hospitalar-do-coronavirus-cresce-pelo-menos-quatro-vezes-e-vira-bomba-relogio-da-doenca,70003283862. Acesso em 28. Abril. 2020
[6] https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2020/04/17/apos-decretos-veja-em-quais-cidades-o-uso-de-mascara-e-obrigatorio.htm – Acesso em 2-5-20
[7] ANVISA. RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA – RDC Nº 222, DE 28 DE MARÇO DE 2018
[8] RESOLUÇÃO CONAMA nº 358, de 29 de abril de 2005.
[9] Lei 12.305, de 02 de agosto de 2010.
*Leandro Eustaquio – Advogado e Professor Especialista em Direito Ambiental. Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB/MG. Membro do Conselho Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais na Unidade Regional Colegiada do Alto São Francisco e na Câmara de Proteção à Biodiversidade e de Áreas Protegidas.
Fonte: Direito Ambiental
Publicação Ambiente Legal, 18/05/2020
Edição: Ana A. Alencar