Ecoburocracia destrói o Estado de Direito
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
EXCESSO DE NORMAS = CORRUPÇÃO
O Brasil não padece por falta de marcos legais. Pelo contrário, o Brasil padece pelo excesso de leis e de maus protagonistas (que querem monopolizar a aplicação de cada uma delas).
Legislações redentoras, carregadas de hipocrisia e estupidez, pretextando solucionar conflitos antes tidos como insolúveis, surgem às pencas, ao sabor dos acontecimentos midiáticos de momento.
Sanções legais “justiceiras”, que fariam inveja à Liga da Justiça, aterrissam no solo normativo para reprimir todo tipo de fenômeno criminológico.
Enfim, um cipoal enorme de normas estelares, brilha num duvidoso firmamento, para conferir direitos extraterrenos… Uma orgia normativa, desacompanhada de capacitação, planejamento, dotação orçamentária, efetivo controle administrativo e transparência.
O termo orgia vem a calhar. O Marquês de Sade, preconizava que, sem planejamento, até a mais pecaminosa das orgias falharia. Nesse sentido, a já pecaminosa orgia normativa brasileira, além de malsã, sequer excita. Ela é inócua, frustrante e desanimadora.
Além das injustiças que causa, das arbitrariedades que propicia, essa orgia normativa gera indefinição, insegurança e, sobretudo, corrupção.
Os romanos, a propósito, alertavam que o excesso de leis era o mesmo que lei nenhuma. O imperador romano Adriano sentenciava: “leis em abundância, país corruptíssimo”.
AREIA MOVEDIÇA NORMATIVA AFOGA A ADMINISTRAÇÃO
A legislação ambiental brasileira não ficou imune a essa triste e funesta legisferança. Está próxima de seguir o mesmo rumo: constituir-se num biombo para a corrupção ou simplesmente não se ver implementada.
Três exemplos desse fenômeno:
1- O caso do lixão a céu aberto
Uma montanha equivalente a um edifício de 25 andares, urdido em poucos anos no Jardim Damasceno, periferia da cidade de São Paulo, revela a mistura perversa dessas duas hipóteses.
Poluidores, mancomunados com o crime organizado, ocuparam um terreno em meio a uma favela, passando a depositar, ali, todo tipo de resíduo, clandestinamente.
Quando o Estado resolveu reagir, reprimindo a atividade criminosa, assumiu a montanha de lixo e, em vez de resolver o conflito e sanear o local, quedou-se inerte.
O Poder Público manteve intacto o monumento de lixo, deixando-o onde estava, convivendo com a pobre e indefesa população do Jardim Damasceno.
A contaminação do solo, do lençol freático e o volume enorme de detritos pestilentos ali continuam, como homenagem à ineficácia do Poder Público – que tardou, falhou e… fugiu.
2- O Tribunal de Justiça de São Paulo
Outro caso revelador, atinge um ícone da burocracia implementadora do Estado: o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo.
De fato, ali, no TJSP, podemos ver grupos de desembargadores decidir processos judiciais em matéria ambiental, mal ambientados, em meio a tapumes e escoras – situação que perdura há anos e se estende por várias salas do Palácio da Justiça, na Praça da Sé. Tudo porque arquitetos, engenheiros encarregados e órgãos de preservação do patrimônio histórico e ambiental não se entendem, quanto ao restauro do edifício. Talvez, para os zelosos burocratas da ineficiência estatal, o conflito possa ser resolvido quando o teto desabar literalmente, esmagando parcela de nosso judiciário.
3- A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente paulistana
Na Prefeitura de São Paulo, graças a um volume assustador de “portarias” – que mudam ao sabor dos humores de burocratas absolutamente descompromissados com a segurança jurídica das atividades civis – um corte de árvore comprometida por cupim pode demorar até um ano para ser autorizado.
Compensações por corte de plantas de porte arbóreo de pouca expressão, podem vir a custar meses de tortura nos labirintos da burocracia da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (estigmatizada por muitos como Secretaria do “Meio Expediente” Municipal), gerando valores e exigências estratosféricos – valores esses cobrados de idosos, aposentados, donas de casa e chefes de família, cujos ganhos mensais não somariam um décimo do exigido pela zelosa fiscalização…
Esses três exemplos, tristes, revelam uma estrutura implementadora nacionalmente afogada em normas contraditórias, carente de meios materiais e recursos humanos capacitados e que, por isso mesmo, quase nada implementa.
O SEQUESTRO DA NORMA PELOS “INTÉRPRETES” ENCASTELADOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA…
Diz o saber popular que o que já está ruim, pode ainda piorar.
No campo ambiental, toda essa nuvem de fumaça normativa a gerar inevitável conflito, costuma ver-se analisada (sempre “sob a égide da Constituição Federal”), pela ótica torta de biocentristas “iluminados”, plantados nas estruturas do Ministério Público, nas Procuradorias de Estado e Municípios, quando não no Judiciário.
Acometidos de autismo doutrinário, esses operadores biocêntricos, ao invés de solucionar conflitos, acabam por perpetuá-los
Recursos administrativos, autuações, incidentes processuais, submetidos à assessoria jurídica dos órgãos ambientais, ou encaminhados ao judiciário, se incorrem na hipótese infeliz do expediente cruzar com biocentristas postados na cadeira do operador encarregado… fenecem no impasse dogmático.
O entulho normativo gerado por um lado, alimenta uma burocracia de carreira jurídica que trata de piorar ainda mais o que já está ruim. Essa chusma de impasses jurídicos impede, por outro lado, que se procure uma solução técnica que os resolva.
A saída acaba sendo a ilegalidade, a corrupção ou a perda de investimentos nos escaninhos recursais dos impasses judiciários…
Enfim, a montanha de entulho normativo e de impasses jurídicos, intoxica a cidadania e impede a justa implementação da lei.
NOSSA PROPOSTA
A saída está num corajoso esforço de consolidação de leis ambientais.
É preciso enxugar o excesso de normas regulamentares, eliminar regras reincidentes e contraditórias.
Isso poderia resgatar a segurança jurídica e conferir objetividade à Gestão Pública.
É urgente que os governos, em todos níveis, se esforcem para reduzir subjetividades interpretativas, reenquadrando o aconselhamento jurídico interno dos seus órgãos burocráticos.
A transparência deve passar a vigorar na gestão pública ambiental.
Os governos devem conferir publicidade aos acervos de relatórios técnicos, decisões administrativas e resolução de conflitos normativos.
Mais que necessária, a jurisprudência administrativa só ocorrerá com transparência e publicação reiterada de decisões dos órgãos envolvidos.
A publicidade permitirá ao cidadão aferir riscos na atividade que eventualmente pretenda empreender. A transparência irá orientar a condução dos processos administrativos com eficácia e respeito ao Estado Democrático de Direito.
O contínuo aprimoramento dos corpos funcionais é outra medida importantíssima.
A adoção periódica de eventos para análise e estudos de caso, seminários, mesas redondas e encontros deve envolver não apenas pessoal interno ou de órgãos implementadores (o autismo surge nesse tipo de comportamento isolacionista), mas, também, a participação de professores, lideranças civis, profissionais renomados, políticos e planejadores.
Por fim, o clima de cordialidade e respeito entre pessoas e profissionais deverá ocorrer por imposição legal e, também, como cultura nos órgãos ambientais.
Adotadas as sugestões, poderemos, finalmente, avançar no combate à poluição normativa e burocrática, onde nossa gestão hoje chafurda…