Atlas da Costa Atlântica, publicado pela Fundação SOS Mata Atlântica, avalia a fisionomia e ecossistemas costeiros nos 14 estados litorâneos do bioma
A Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais lançam um mapeamento inédito dos ambientes costeiros da Mata Atlântica, na região litorânea do Brasil. O estudo, batizado como “Atlas da Costa Atlântica”, tem como objetivo evidenciar as peculiaridades de cada estado e região, colaborando para o seu monitoramento e preservação.
O levantamento avaliou de forma detalhada as diferentes fitofisionomias e ecossistemas costeiros nos 14 estados litorâneos no domínio do bioma, indo além do mapeamento das formações arbóreas de mangues e de restingas, elaborado tradicionalmente no âmbito do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, estudo em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) que monitora o bioma há 30 anos. Dessa vez, foram consideradas as áreas com vegetação arbustiva e rasteira, entre outras formações, e aquelas ocupadas por atividades como carcinicultura e salinas.
Os resultados apontam, por exemplo, que a Bahia é o estado com maior cobertura de manguezais da Mata Atlântica. São mais de 73 mil hectares (ha), contando, ainda, com 4,2 mil ha de áreas de apicum – formações integrantes do ecossistema manguezal, caracterizadas por terrenos com alta concentração de sal e com pouca vegetação.
Na sequência, estão São Paulo e Paraná, que concentram a maior quantidade da área de manguezais das regiões Sudeste e Sul. Juntos, os dois estados somam mais de 60 mil ha de manguezais, sendo 26,6 mil em território paulista e 33,4 mil em território paranaense. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, 80% dos manguezais paranaenses se encontram em Unidades de Conservação (UC). Já em São Paulo, quase metade da área está fora de regiões protegidas por este instrumento legal.
O litoral paulista também é o responsável pelas maiores áreas de restinga – presentes nos ambientes de praia, vegetação de dunas e florestas de transição na Serra do Mar. Isso se deve à menor taxa de ocupação urbana nos municípios do sul do estado e a existência de UCs na região, embora o levantamento aponte que há a expansão de loteamentos em diversos trechos.
Ainda de acordo com o Atlas da Costa Atlântica, a maior área ocupada por tanques de carcinicultura e de salinas, técnica de criação de camarões em viveiro e áreas de produção de sal marinho, encontra-se no Rio Grande do Norte. Ao todo, são 36 mil ha no estado potiguar adjacentes aos mais de 9,5 mil ha de florestas de mangue, seguido por Ceará (5,7 ha), Bahia (2,8 mil ha) e Pernambuco (2,1 mil ha).
No Rio Grande do Sul, a extensão das dunas é maior do que a somatória de todos os estados do Nordeste: são mais de 102 mil ha dessa formação. O território possui ainda mais de 95% de toda a área de banhados do litoral brasileiro – áreas úmidas de transição entre ambientes terrestres e aquáticos.
O Atlas da Costa Atlântica é uma iniciativa da SOS Mata Atlântica em conjunto com o INPE, com o patrocínio de Bradesco Cartões, execução técnica da empresa de geotecnologia ArcPlan e participação de especialistas. A análise se baseia em imagens geradas pelo sensor OLI a bordo do satélite Landsat 8. O Atlas utiliza a tecnologia de sensoriamento remoto e de geoprocessamento para monitorar remanescentes florestais e áreas naturais acima de 3 ha.
Para consultar o Atlas da Costa Atlântica, clique aqui.
Conhecimento para conservação
O Brasil é o segundo maior país em extensão litorânea na América Latina, com aproximadamente 10.800 km de costa. Vivem no litoral cerca de 42 milhões de pessoas, ou 25% da população brasileira, concentradas principalmente em 13 das 27 capitais situadas à beira-mar. É também no mar que estão aplicados investimentos bilionários para a produção de petróleo nas camadas pré-sal, além de diversas outras atividades econômicas.
Diego Igawa Martinez, biólogo da Fundação SOS Mata Atlântica, observa que apesar dessa importância, a zona costeira e marinha do Brasil ainda carece de uma atenção maior para seu uso sustentável.
“Esperamos que as avaliações do Atlas da Costa Atlântica possam contribuir para isso. O país ainda caminha para cumprir suas metas de proteção da biodiversidade com a necessária criação de novas UCs marinhas, mas isso também inclui implementar uma rede representativa de áreas protegidas contemplando os diferentes ecossistemas e fisionomias da costa brasileira. Para além disso, há a necessidade do planejamento territorial integrado entre zona costeira e marinha para otimizar os benefícios das áreas protegidas e conciliar usos econômicos, porém, muitas vezes os instrumentos legais existentes hoje ainda se mostram insuficientes e pouco aplicados nessa escala mais ampla”, diz Martinez.
Para Márcia Hirota, diretora-executiva da SOS Mata Atlântica, o estudo é mais uma ferramenta que contribui com a preservação de nossas riquezas naturais. “Esse levantamento é de extrema importância para conhecer melhor e monitorar a nossa rica costa brasileira. A ideia é realizarmos essa avaliação a cada dois anos, para que possamos acompanhar mais de perto e intensificar a ação de preservação”, afirma.
“O Atlas da Costa Atlântica representa mais um passo na constante busca do aprimoramento na geração de dados e de informações sobre a dinâmica das formações vegetais e do uso da terra que ocorre no domínio da Mata Atlântica, se constituindo, portanto, em mais uma oportunidade de a sociedade conhecer um pouco mais das suas ações sobre os recursos naturais disponíveis em território brasileiro”, declara Flávio Jorge Ponzoni, responsável técnico do Atlas da Costa Atlântica por parte do INPE.
Lei do Mar
Em 2013, cerca de 70 especialistas de diversos setores discutiram e desenharam o Projeto de Lei 6.969, chamado de “Lei do Mar”, voltado a promover o uso e a conservação marinha. Baseado em experiências de outros países, como Austrália, Canadá, Estados Unidos, Costa Rica e Noruega, o texto traz duas inovações principais.
De acordo com Leandra Gonçalves, especialista em Mar da Fundação SOS Mata Atlântica, a primeira inovação é que a “Lei do Mar” cria o bioma marinho. Hoje são reconhecidos no Brasil seis biomas: Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa. A zona costeira e marinha é considerada um ecossistema associado aos demais biomas.
A segunda inovação é a obrigatoriedade de ser conduzido no Brasil um processo de Planejamento Espacial Marinho (PEM), a exemplo do que vem sendo feito em outros lugares do mundo. O PEM é, de acordo com o texto da Lei, um processo de planejamento espacial abrangente, adaptativo, integrado, ecossistêmico, transparente, participativo e fundamentado no conhecimento científico, de forma a identificar áreas mais adequadas para os vários tipos de atividades, reduzir impactos ambientais e conflitos entre os usos, promover usos compatíveis e preservar serviços ecossistêmicos, atingindo os objetivos ambientais, econômicos e sociais.
Em agosto, o projeto de lei foi aprovado na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados e seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de ser encaminhado ao plenário.
“Se o texto for aprovado, as novas medidas podem elevar o país ao mesmo patamar de outras nações desenvolvidas que olham para o mar buscando um futuro sustentável, aliado ao desenvolvimento e ao bem-estar social. Olhar para nossa costa e mar, e conhece-los, é o primeiro passo para alcançarmos esse desafio. Nesse sentido, o Atlas da Costa Atlântica é uma ferramenta fundamental de monitoramento desse novo bioma marinho”, conclui Leandra.
Fonte: SOSMA