Há inversão de valores na crítica às algemas postas pela escolta do ex-governador…
Por Marco Aurélio Arrais
22.01.2018
Foram muitos os queixumes, as lamentações, as demonstrações de piedade e de compaixão, diante da patética figura do ex-governador Sérgio Cabral algemado e agrilhoado nos pés por correntes.
Essas demonstrações de solidariedade partiram das mais diversas “autoridades” do país, enojadas com o tratamento humilhante, feudal, bárbaro, desproporcional que a Polícia Federal dispensou ao ilustre político, tão próximo a elas. Não aceitaram que alguém da “Casa Grande” sofresse tais humilhações descabidas.
Pronunciaram-se contra tais medidas políticos, juízes, ministros de tribunais, jornalistas e outros “mais iguais”. Isso parece demonstrar algum temor quanto ao futuro. Esse procedimento vil, nojento, primitivo não é cabível para alguém pertencente a uma elite pretensamente intocável, pasteurizada e inatingível.
O traficante Fernandinho Beira Mar sempre é transportado assim, como os Marcola, os Nem, os 157 e outros criminosos negros, pardos e saídos das cloacas da sociedade, dos guetos impostos aos miseráveis. E assim deve ser! Fazendo um balanço dos crimes por eles cometidos, encontramos o tráfico de drogas ilícitas e armas, atentados a agentes públicos e muitos homicídios e inúmeros estupros.
O “notável” ex-governador é branco, culto e nunca vendeu cocaína. Nunca assaltou com armas pesadas. Nunca foi estuprador. Nunca morou em favela. E tomara que nunca tenha ordenado a morte de alguém. Apenas desviou verbas da educação, saúde, segurança, saneamento, infraestrutura e transformou seu (des)governo em balcão de negócios. Negócios seus.
Sendo um marido apaixonado, presenteou sua querida esposa com algumas joias escolhidas. Equivalentes à sua afeição. Pois quem muito ama, muito dá.
Nesta demonstração de louca paixão, roubou as verbas destinadas à compra de medicamentos R$158.000,00 e R$162.000,00 para comprar o “Anel Rubro” e o par de “Brincos Rubros”. Os rubis dessas joias foram tingidas com o sangue do povo miserável e indigente do Rio de Janeiro.
Também subtraiu R$1.800.000,00 que seriam destinados ao combate à dengue e à febre amarela. Comprou assim o “Anel de diamante amarelo”. Tirou a resplandecência desta joia da pele emaciada, da bílis vertida pelos agonizantes largados nos assoalhos dos corredores de hospitais imundos.
Com R$800.000,00 roubadosdos cofres públicos comprou em Paris, através de seu preposto Cavendish, o “Anel de ouro branco e brilhantes”. Era o dinheiro destinado a vacinas que imunizariam as vítimas de doenças que, num passado distante, já haviam sido erradicadas.
Da merenda escolar, condenando à fome centenas de milhares de crianças, sacou R$612.000,00 e pagou o “Brinco espeto de turmalina paraíba com diamantes”; R$229.000,00 foram gastos com o “Colar Blue Paradise com turmalina paraíba”; no “Brinco Fascínio Especial” pagou R$200.000,00 e pelo “Brinco Folhagem com esmeraldas navetes” gastou R$138.960,00. Muitos desses pequeninos têm nessa merenda a única refeição decente do dia. A fome não tem cor. Tem dor!
Das vidas tiradas de policiais mal armados, mal aparelhados, desvalorizados e humilhados, R$77.000,00 pagaram o “Brinco Climax com diamante”; R$60.000,00 custearam o “Brinco Fractalis especial”; R$158.000,00 se transformaram na “Pulseira Soul com diamantes fancy e topázio imperial”; e quem sabe, se para rezar pelas famílias desamparadas desses policiais executados, comprou o “Terço Angel com diamante” por R$121.500.00. Os mortos são sepultados e esquecidos!
Do dinheiro destinado ao material escolar, livros, uniformes e transporte escolar, para a sua querida adquiriu por R$82.000,00 o “Brinco Volúpia”; por R$125.200.00 o “Brinco Blue Cluster”; por R$67.050.00 e R$138.960,00 dois “Anéis Folhagem com esmeraldas navetes”; por R$65.790.00 o “Brinco Pólen triplo especial de turmalina com rubelitas”. R$98.000,00 comprou a “Pulseira Ala”; R$78.000,00 o “Anel Gênesis com diamantes”; R$55.900.00 foi o preço do “Brinco Ray com pérola e beads de diamante negro”. O “Anel Mozart turmalina paraíba oval” custou R$159.000,00. Da ignorância nascem os votos fáceis, comprados com vinténs.
Até agora foram apreendidas 40 peças de joias. Foram, por enquanto, identificadas 189 peças. Então 149 peças estão escondidas. Além dessas, muitas foram adquiridas em dinheiro vivo e sem nota fiscal. Há muita coisa a ser revelada!
Ficamos por entender a choradeira desses ilustres cidadãos por causa das algemas e grilhões. Os atos de Sérgio Cabral, durante toda a sua vida política, devem ter levado à invalidez e ao túmulo centenas de milhares de seres humanos. Isso não foi apenas crime. Foi genocídio que as “autoridades” e a mídia fingem não ver.
Se compararmos cada joia que enfeitava a amada Adriana Ancelmo a um dos grilhões e algemas que prendiam as pernas e mãos de Sérgio Cabral, sobrarão muitas joias. E faltarão muitos grilhões.
Esses grilhões que faltam estão à espera das muitas pernas e braços de seus merecedores. Esperamos que algum dia sejam utilizados.
Marco Aurélio Arrais, natural de Goiânia, advogado (PUC-GO), contador de causos, é pesquisador da história do Brasil ou, como ele mesmo se denomina, “um curioso de nossa história”. Cronista, é colunista do Portal Ambiente Legal.
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Podiam caprichar no visual, colocando algemas banhadas a ouro.
Excelente matéria. Essa verdade embrulha meu estômago mas fico feliz com a imagem desse ladrão do erário e da fé pública! Parabéns