31 de Dezembro
Não me interessa lembrar o dia de ontem.
Não me importa estar no dia de hoje.
Eu quero ser o dia de amanhã.
Vou morrer a noite passada
e nascer o sol matutino.
Ser o último silêncio,
o primeiro ruído dos pássaros
e ser o voo inicial da revoada para o sul.
Quero dizer o primeiro — Bom dia!
E ser a espera de que ele seja o melhor.
Desejo ser as olheiras dos que se amaram na madrugada,
o gosto amargo da festa
e o aroma de hortelã do beijo cotidiano dos casais.
Quero beber o vinho da primeira missa e tontear a fé das beatas.
Preciso ser o sangue derramado no primeiro acidente de tráfego,
ser o asfalto quente, a calçada fria
e o brinquedo quebrado na euforia infantil da manhã.
Quero ser o primeiro gesto de fome,
o primeiro olhar de amor e a liberdade das ações iniciais.
Eu quero ser
o último a chegar no relógio de ponto
e bater o cartão de presença
no mundo ocidental,
no dia de amanhã…
Ricardo Viveiros
*Ricardo Viveiros – Jornalista e escritor, autor de 41 livros, lecionou por 25 anos para cursos superiores de graduação e MBA. Recebeu a medalha da Organização das Nações Unidas (ONU) no Ano Internacional da Paz (1986), foi escolhido pela ABERJE, “Comunicador Empresarial do Ano”, em 2013 e tem o título de “Notório Saber”, em nível de doutorado, recebido da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Fundou e dirige, desde 1987, a RV&A.
(Este poema de Ricardo Viveiros está no livro “Doces Beijos Amargos”, Editora Rios, 1a
edição em 1984, capa de Zélio Alves Pinto e apresentação de Dom Paulo Evaristo
Arns.)
Fonte: o próprio autor
Publicação Ambiente Legal, 31/12/2020
Edição: Ana A. Alencar
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