Medida facilitaria desapropriações e licenciamento ambiental
Por Danielle Denny
O prefeito Fernando Haddad (PT) solicitou ao Ministério do Planejamento a desburocratização do processo para desapropriação de imóveis e regime diferenciado de licenciamento ambiental para o transporte público de massa. A proposta foi feita para iniciar o processo de construção de 230 quilômetros de corredores exclusivos para ônibus, sendo 150 entregues até 2016. Por enquanto, apenas 66 estão licitados, ainda pelo seu antecessor Gilberto Kassab (PSD), e o valor orçado chega a R$6,5 bilhões.
As recentes manifestações contra o aumento das passagens pode ser considerado um dos motivos para tanto já que a circulação dos ônibus em tráfego compartilhado com os automóveis reduz consideravelmente a velocidade média dos coletivos, o que eleva seus custos operacionais e, portanto, “faz pressão sobre a tarifa”, explica Luiz Carlos Mantovani Néspoli, superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP). Construir 230 km de corredores de ônibus em 4 anos é uma meta arrojada, mas factível, desde que haja recursos e que os processos de licitação sejam mais ágeis, avalia o especialista.
Para ele, o transporte público urbano é um serviço essencial e causará impactos positivos ao meio ambiente, logo, “não é justo que fique na fila aguardando o licenciamento ambiental de outros empreendimentos, como por exemplo, de um shopping center. Creio que os projetos públicos de interesse social deveriam ter procedimentos mais ágeis e prioridade de tratamento pelos setores de licenciamento ambiental, obviamente, cumprindo as exigências legais correspondentes.”
Para o vereador Aurélio Nomura (PSDB) a questão precisa ser vista por dois pontos, o licenciamento ambiental sem regime diferenciado, assegura compensações e ajustes mais adequados para as obras. Enfrentaram essa sabatina os projetos de monotrilho e metrô do governo estadual. Por outro lado, há a morosidade dessas obras, tão necessárias e urgentes, que já deveriam estar em execução, principalmente os corredores exclusivos aprovados e licitados nos governos anteriores.
No entanto, “não existe ainda sequer uma avaliação do governo municipal ou um projeto básico que trace, mesmo que em linhas gerais, as diretrizes, mostrando com detalhes quais as obras, os trechos afetados e quais as intervenções que devem ser feitas a fim de se obter o licenciamento ambiental. Não há nenhum projeto concreto ou estudo divulgado pela Prefeitura, além da promessa de campanha” ressalta Nomura.
A inclusão do sistema de corredores de ônibus no Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), previsto pela Lei 12.462/2011, aceleraria as licitações, mas, com menor transparência, há o risco de o interesse público ser relegado e de se favorecer a corrupção. O RDC também permite “contratação integrada”, em que o projeto fica a cargo da empresa vencedora, assim, sem garantia de prevalência do interesse público ou de qualidade do resultado final da infraestrutura para sociedade.
Angélica Benatti Alvim, professora e coordenadora geral de pós-graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie, defende que o projeto completo seja contratado por meio de concurso público, que priorize a qualidade técnica, não o menor preço. De acordo com a Carta do Direito à Cidade, lançada em 03/07/2013, pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), “as obras públicas devem ser licitadas somente a partir de projeto completo. Quem projeta, não constrói”.
Um dos fatores determinantes para o aumento de custo das obras é a ausência de projeto completo, explica Angélica. “quando a obra pública é licitada a partir apenas do chamado ‘projeto básico’ ou do ‘anteprojeto’, transfere-se à construtora vencedora da licitação a tarefa de detalhar e completar, existe, então, uma promiscuidade entre projeto e obra que é indutora de reajustes e superfaturamento e fator estimulante de corrupção”.
Além disso, Angélica considera que um sistema de corredores de ônibus a implantado isoladamente será insuficiente para alterar o padrão de mobilidade urbana. “Seria uma importante oportunidade de melhoria da qualidade socioambiental da cidade se a Prefeitura optasse pelo desenvolvimento de ações integradas e intersetoriais que envolvessem o sistema de transporte coletivo e o meio urbano ao longo da rede de transportes”, pondera a especialista.
Uma proposta como a dos corredores exclusivos deveria ser acompanhada de um “conjunto de intervenções urbanísticas com o objetivo de promover a requalificação de áreas por onde a rede de transportes passa, articulando o espaço público de modo a requalificá-lo, implementando ciclovias, áreas verdes, de lazer e principalmente planejando o uso do solo urbano de modo socioambientalmente inclusivo, permitindo ganhos expressivos para todas as faixas de renda da população”, sugere a arquiteta.
Acelerar o processo de desapropriação e licenciamento ambiental pode ser perigoso por favorecer a corrupção, desestimular uma abordagem mais abrangente e inclusive ser ilegal. Os princípios e diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, contidos na Lei 12.587/2012, preveem literalmente o “desenvolvimento sustentável das cidades” e que para tanto deverá haver “integração entre os modos e serviços de transporte urbano […] prioridade dos modos de transportes não motorizados sobre os motorizados e dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado” com a “mitigação dos custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas na cidade”.
Seria melhor e menos demagógico que a Prefeitura seguisse as normas vigentes e acelerasse os trâmites administrativos necessários.