Por Alexandre Machado*
Passados quase 3 meses em que a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou pandemia global, em resposta ao novo coronavírus (2019-nCoV), este já se espalhou para mais de 170 países, somando até o momento (01/04), mais de 846.156 casos e 41.494 mortes (Johns Hopkins, 2020; WHO, 2020). E, diferentemente do início da contaminação, a Europa e os EUA se tornam os novos epicentros da doença, ou seja, mais de 90% dos casos globais estão atualmente fora da China.
Diante desse novo contexto, e sendo o transporte marítimo internacional responsável por mais de 80% do comércio global de mercadorias em volume, e tendo a China como principal parceiro comercial dos diversos continentes afetados, o surto também vem causando um grande impacto no setor portuário e de transporte marítimo chinês, muito embora as operações de carregamento e descarregamento estejam funcionando normalmente, tanto que as empresas chinesas já iniciaram a retomada do trabalho e de sua produção (Bloomberg, 2020).
Atualmente, os chineses abrigam sete dos dez portos de contêineres mais movimentados do mundo, onde as interrupções provocaram um profundo impacto no comércio internacional (UNCTAD, 2020). De acordo com a China Ports and Harbours Association (2020), o volume de contêineres dos oito principais portos, aumentou 6,2% no mês de março, especialmente para os portos de Shenzhen e Guangzhou, no entanto, a associação alertou para o risco de queda na movimentação do volume de contêineres mundial, isso devido à disseminação global da pandemia nos próximos meses. Ainda destaca que os três portos do HUB (porto concentrador de cargas e de linhas de navegação) ao longo do Rio Yangtze – Nanjing, Wuhan e Chongqing mantiveram volumes semelhantes de contêineres movimentados em comparação com o mês de fevereiro, no entanto, o volume total de carga caiu 10,7%, muito devido ao atraso no serviços de barcaça.
Vale destacar que o governo chinês implementou fortes restrições ao setor portuário para conter a propagação da doença, da mesma forma, após a disseminação mundial, diversos países e companhias de navegação, anunciaram medidas rigorosas de prevenção e controle, buscando impedir a propagação do vírus, o que está causando sérias interrupções no setor, e que resultou em um crescimento econômico global mais baixo e, consequentemente, em uma menor demanda por movimentação de mercadorias, com reflexo em um desabastecimento global.
Metade dos dez principais parceiros comerciais da China anunciaram restrições ao setor para conter o surto, o que trará impactos diretos nos principais portos de contêineres. Com base em uma estimativa inicial, a taxa de transferência de contêineres no segundo trimestre deste ano poderá cair em torno de 5% a 10% (Alphaliner, 2020), podendo gerar uma crise de desabastecimento em vários setores, como medicamentos, alimentos e energia.
Em meio ao atual momento de crise global, a UNCTAD TrainForTrade Port Management Programme (2020), faz um apelo ressaltando a importância em se manter as cadeias de suprimentos abertas e permitir que o comércio marítimo e o transporte transfronteiriço continuem. Isso significa manter os portos do mundo abertos, mais sempre observando os protocolos de saúde necessários. Os portos devem tratar seus trabalhadores como trabalhadores-essenciais, proporcionando-lhes as melhores condições de segurança, pois devem considerar os potenciais riscos para a saúde pública, caso o seu papel seja comprometido.
Já no Brasil, em 20 de março, o Ministério da Infraestrutura classificou os serviços de logística portuária como essenciais para o país – “todos os portos abertos”- informando que as operações, deverão ser realizadas com a devida salvaguardar dos estivadores e trabalhadores locais, garantindo as operações das embarcações, as quais foram ressalvadas através de procedimentos elencados nas Notas Técnicas nº34 e 47 da ANVISA, de 25 e 27 de março, e da Resolução CONAPORTOS nº.2, do mesmo período, que cuida explicitamente das atividades a serem realizadas nos portos com a chegada de embarcações internacionais, além de orientações detalhadas como medidas a serem adotadas para o controle e prevenção do coronavírus.
Diante do exposto, fica claro que a regularização internacional do trânsito de mercadorias dependerá da velocidade da propagação do vírus, em detrimento da rapidez de seu combate, o que definirá a recuperação do setor marítimo e portuário global.
Leia também: https://www.ambientelegal.com.br/impactos-do-novo-coronavirus-ncov-no-comercio-internacional/ de (20/02/2020)
*Alexandre Machado é Doutor em Direito Ambiental Internacional e Mestre em Direito Ambiental, possui Especialização em Direito do Petróleo e Gás e Didática do Ensino Superior, professor de Terminais Offshore, Transporte Marítimo e Comércio Exterior e Logística na Faculdade Estadual de Tecnologia da Baixada Santista (FATEC Rubens Lara/SP).
Fonte: próprio autor
Publicado originalmente no Jornal A Tribuna
Publicação Ambiente Legal, 03/04/2020
Edição: Ana A. Alencar