Congresso está prestes a votar projeto de lei que prorroga até 2021 prazo para acabar com lixões
POR CARLOS ROSSIN
Já está na hora de a sociedade e o Congresso acordarem para o caótico cenário da destinação do lixo. O Brasil tem participado de eventos internacionais e assinado tratados, como fez com o Acordo de Paris, e para implementá-los precisa de ações básicas. Hoje, dos 5.568 municípios brasileiros, 3.353 ainda utilizam lixões sem qualquer constrangimento e sem se importar com os graves danos ao meio ambiente e à saúde da população. Por ano, 41,5% dos 78 milhões de toneladas de resíduos produzidos vão para vazadouros a céu aberto.
A situação é gravíssima. Estima-se que o SUS gasta anualmente cerca de R$ 1,5 bilhão com o tratamento de doenças causadas pela falta de destinação e tratamento corretos dos detritos. Apesar do quadro caótico, o Congresso está prestes a votar — em caráter de urgência e sem passar pela Comissão de Meio Ambiente — o Projeto de Lei 2.289/15, que prorroga o prazo até 2021 para que municípios acabem com os lixões, sem debater com a sociedade e muito menos buscar uma forma efetiva de solucionar a questão.
Desde 1954 a destinação inadequada de lixo é proibida no Brasil, vedação reforçada em 1981 com a Política Nacional de Meio Ambiente, novamente intensificada com a Lei de Crimes Ambientais e, posteriormente, com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, de 2010. Temos a legislação adequada, mas precisamos cumpri-la, como alguns poucos municípios têm feito.
Prefeitos têm pressionado pela aprovação da prorrogação do prazo para erradicação dos lixões. Entretanto, o problema não é de prazo para cumprimento da medida, mas de falta de capacidade técnica e financeira. O orçamento das prefeituras, em geral, é dividido em 25% para educação, 15% para saúde e os outros 60% vão para o custeio da administração pública, sendo quase a totalidade para o pagamento de salários. Está claro que não há dinheiro para coleta, tratamento e destinação adequados de resíduos.
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Os governos federal e estaduais precisam ajudar os prefeitos a encontrar uma forma de custear os serviços. Até porque o gerenciamento inadequado do lixo também impacta na economia, pois a falta de ação para resolver a situação “está custando aos países de 5 a 10 vezes mais do que os próprios investimentos em gerenciamento de lixo”, como revela Associação Internacional de Resíduos Sólidos. Ou seja, gastamos muito mais na saúde e no meio ambiente com os efeitos dos lixões.
Se aprovado como está, o projeto aumentará o déficit ambiental, intensificará os problemas de contaminação e saúde da população menos favorecida, constituindo retrocesso ambiental que não se coaduna com os direitos fundamentais e as legítimas aspirações da sociedade brasileira, terminando por nos afastar cada vez mais da comunidade internacional comprometida com a gestão responsável dos resíduos e do meio ambiente.
*Carlos Rossin é especialista em sustentabilidade e coordenador de diversos estudos em resíduos sólidos. Foi Diretor de Sustentabilidade da PwC e Conselheiro do Pacto Global da ONU em São Paulo
Fonte: 21/04/2017 https://oglobo.globo.com/opiniao/efeito-dos-lixoes-21237247#ixzz4hChHNdoU
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