Por Enio Fonseca e Décio Michellis*
“Vamos passear depois do tiroteio
Vamos dançar num cemitério de automóveis
Colher as flores que nascerem no asfalto
Vamos todo mundo, tudo que se possa imaginar
Vamos duvidar de tudo o que é certo
Vamos namorar à luz do polo petroquímico
Voltar pra casa num navio fantasma
Vamos todo mundo, ninguém pode faltar”
(“Pose” de autoria do músico Humberto Gessinger – Engenheiros do Hawaii – https://youtu.be/lcrsW2tCRMg)
A Mineração
A mineração é a extração de materiais geológicos valiosos da Terra, que não podem ser cultivados por meio de processos agrícolas ou criados artificialmente em um laboratório ou fábrica. Inclui a extração de qualquer recurso não renovável, como petróleo, gás natural ou mesmo água.
Segundo a classificação internacional adotada pela ONU, define-se mineração como sendo a extração, elaboração e beneficiamento de minerais que se encontram em estado natural: sólido, como o carvão e outros; líquido, como o petróleo bruto; e gasoso, como o gás natural. Nesta acepção mais abrangente, inclui a exploração das minas subterrâneas e de superfície (ditas a céu aberto), as pedreiras e os poços, incluindo-se aí todas as atividades complementares para preparar e beneficiar minérios em geral, na condição de torná-los comercializáveis, sem provocar alteração, em caráter irreversível, na sua condição primária.
Os minérios recuperados pela mineração incluem metais, carvão, xisto betuminoso, pedras preciosa s, calcário, giz, rochas ornamentais, sal-gema, potassa, cascalho e argila entre outros.
Os processos de mineração envolvem prospecção de corpos de minério, análise do potencial econômico de uma mina proposta, extração dos materiais desejados e recuperação final ou restauração da terra após o fechamento da mina.
Os materiais de mineração podem ser obtidos de corpos de minério, veios, jazidas, recifes ou depósitos de aluvião. A exploração dessas jazidas depende de investimento, mão de obra, energia, refino e custo de transporte.
Para obter acesso ao depósito mineral dentro de uma área, muitas vezes é necessário minerar ou remover materiais residuais que não são de interesse imediato. A movimentação total de minério e estéril constitui o processo de mineração. Em geral, mais material estéril do que minério é extraído durante a vida útil de uma mina. A remoção e colocação de resíduos além de ser um custo relevante pode ser um fator importante de impactos ambientais negativos e não desejados. A caracterização detalhada do material residual constitui uma parte essencial da operação de mineração.
As minas dividem-se em dois tipos principais: minas subterrâneas e minas a céu aberto. A mineração de superfície é muito mais comum e produz 85% dos minerais (excluindo petróleo e gás natural), incluindo 98% dos minérios metálicos.
As operações de lavra (mineração) podem envolver diferentes métodos: A céu aberto; Subterrânea; Realce autoportantes; Câmaras e pilares; Subníveis; VCR – Vertical Crater Retreat (Recuo por Crateras Verticais); Suporte das encaixantes; Recalque; Corte e enchimento; Abatimento; Subníveis; Garimpagem Manual; Garimpagem manual com auxílio da ação de águas pluviais; Garimpagem manual com auxílio da ação de águas fluviais; Garimpagem manual por catas; Garimpagem mecânica por desmonte hidráulico; Garimpagem mecânica por desmonte hidráulico em leitos submersos com auxílio de mascarita, escafandro e chupadora; Dragagem. Esta lista apenas exemplifica a diversidade de técnicas e processos envolvidos na mineração.
Idade da Pedra
A Idade da Pedra é a fase da Pré-história na qual os seres humanos criaram ferramentas de pedra sendo então, a tecnologia mais avançada naquela época. Está dividido em 3 fases:
- Paleolítico (2,5 milhões anos – 10.000 a.C. ou Idade da Pedra Lascada), com um sistema econômico de caça-coleta, com a aparição da primeira ferramenta humana (ou pré-humana). E é desde o momento em que um hominídeo ancestral passou a escolher as melhores pedras, para conseguir as melhores lascas e aprimorar seus artefatos, que a mineração começou. Basta que você esteja procurando o melhor mineral, seja qual for a aplicação, e você já estará minerando. A Pedra Lascada ou Lasca é qualquer produto do talhe intencional pelo ser humano de rochas duras criptocristalinas que se depreende da massa pétrea, e que adquire forma de esquírola cortante. As lascas são suportes para fabricar uma enorme variedade de ferramentas. Veja detalhes muito interessantes no link: https://pt.wikipedia.org/wiki/Lasca;
- Mesolítico (13.000 anos – 9.000 a.C.), no qual usavam, ao mesmo tempo, instrumentos de pedra lascada e pedra polida. São desta época as oficinas de sílex, onde eram produzidos objetos de pedra talhada. O sílex é uma rocha sedimentar silicatada, constituída de quartzo criptocristalino, muito dura e com elevada densidade e fratura conchoidal. Foi muito utilizada pelos hominídeos para confecção de armas (por exemplo em pontas de seta) e utensílios de corte, devido a sua grande dureza e a seu corte incisivo, devido as arestas afiadas que são produzidas quando fraturada. Nesse período, com o início de uma organização, a sociedade desenvolveu métodos de polimento de rochas que seriam usadas como um princípio de roda rudimentar para moer grãos e sementes e assim desenvolver a agricultura, ou ainda um carro de boi. Nesse mesmo período é de conhecimento das primeiras pinturas rupestres, com a utilização de pó de rocha rica em ferro, que fornece a coloração avermelhada, tão comum nessas primeiras artes. Outra utilização é do caulim, que é originado de um mineral bem friável, a caulinita, com a qual podemos desenvolver em pinturas na cor branca; e
- Neolítico (10.000 anos – 3.000 a.C. ou Idade da Pedra Polida), no qual se produz a revolução para o sistema econômico produtivo e sedentário: agricultura e pecuária. Caracteriza-se essencialmente pelo surgimento da pedra polida, que era usada em machados e outros instrumentos, bem como a cerâmica. As pessoas ocupavam-se sobretudo da obtenção de sílex e cherte para a fabricação de utensílios e armas de pedra. Estas pedreiras levaram a criação primeiro de galerias e mais tarde de poços e finalmente as primeiras explorações subterrâneas.
O que há em comum no período da Idade da Pedra é que os antepassados do ser humano/hominídeos começaram a praticar uma mineração rudimentar à 2,5 milhões de anos e a produzir artefatos de pedra lascada e pedra polida. Desde os primórdios da civilização, as pessoas usaram pedra, argila e, posteriormente, metais encontrados próximos à superfície da Terra. A evolução tecnológica da humanidade sempre esteve associada a mineração.
Sem a mineração nunca teríamos chegado aonde estamos do ponto de vista de bem-estar, conforto, segurança e tecnologia.
Idade dos Metais
Idade dos metais se refere a fase da Pré-história com o fim da Idade da Pedra, marcado pelo início da fabricação de ferramentas e armas de metal.
O ser humano começava a dominar a técnica da fundição. A princípio, utilizou como matéria prima o cobre, o estanho e o bronze (uma liga de cobre e estanho), metais cuja fusão é mais fácil.
- Idade do Cobre: (3.300 – 1.200 a.C.) Antes de se generalizar o uso do bronze (cobre + estanho), o cobre era o metal mais utilizado. O cobre nada mais é do que o bronze natural. Existem evidências de mineração de cobre em 7.000–5.000 a.C. Machados, lâminas, armas, ornamentos pessoais, pulseiras de cobre, pontas de flechas e outras ferramentas (de olaria para cortar e moldar a cerâmica não queimada) foram feitas com minério de cobre.
- Idade do Bronze: (3.300 – 700 a.C.) Ocorreu o desenvolvimento desta liga metálica, resultante da mistura de cobre com estanho, arsênico ou outros metais. O bronze é mais duro e durável do que os outros metais disponíveis na época, permitindo que as civilizações da Idade do Bronze ganhassem uma vantagem tecnológica. Foi um período de uso intenso de metais e de redes de desenvolvimento do comércio. A produção de artefatos de bronze exigia longas rotas comerciais até as fontes de estanho. A metalurgia deu um salto tecnológico: elaboraram vasilhas rituais, machados, punhais, capacetes, armas e armaduras de grande maestria.
- Idade do Ferro: (1.200 a.C. – 1.000 d.C.) O ferro apesar de ser o quarto elemento mais abundante na crosta terrestre, seu uso prático começou 7.000 anos mais tarde que o do cobre e 2.500 anos depois do bronze, quando então se desenvolveu tecnologia para trabalhar minerais ferrosos. A “Idade do Ferro” começa quando a produção de ferro ou aço avança a ponto de ferramentas e armas de ferro substituírem seus equivalentes de bronze de uso comum, com menor custo e melhor qualidade. O ferro era mais barato, mais forte e mais leve, e os implementos de ferro forjado substituíram permanentemente as ferramentas de bronze fundido.
A mineração sempre teve uma relação estreita com a evolução tecnológica, seja na Idade da Pedra ou na Idade dos Metais. Nossa dependência da mineração só aumentou: importante na obtenção de matérias-primas para as indústrias metalúrgicas, siderúrgicas, fertilizantes, petroquímica etc.
“Hoje estamos no que se denomina a Idade do Silício, que se inicia a partir da segunda revolução industrial junto com a expansão tecnológica. A evolução da mineração é um dos motivos principais pela evolução do ser humano”. (Marcos Lopes)
A Mineração no Brasil
A economia do Brasil está intimamente ligada com a mineração. Desde o Brasil colonial, a mineração foi um dos principais fatores que alavancaram a economia nacional.
A atividade da mineração é considerada em nossa legislação como de utilidade pública, sendo por isso, essencial e estratégica para o País. Assim como a energia, está na base dos planejamentos voltados à promoção do desenvolvimento socioeconômico, de quase toda a cadeia produtiva, impactando diretamente a melhoria das condições e da qualidade de vida dos brasileiros, sendo responsável também pela produção de conhecimento dos ambientes onde se faz presente, gerando impostos e renda, e sendo praticada sob princípios ESG, e da sustentabilidade, traz também ganhos ambientais para toda a sociedade.
De acordo com o IBRAM – Instituto Brasileiro de Mineração, a produção mineral brasileira em 2021, em toneladas, cresceu cerca de 7% em relação a 2020, passando de 1,073 bilhão de toneladas para 1,150 bilhão de toneladas estimadas.
Em 2021, a variação de preços das commodities no mercado internacional impulsionou o faturamento do setor em 62%, na comparação com 2020, crescendo de R$ 209 bilhões para R$ 339 bilhões.
O Setor é responsável por 2,4% do PIB, gerando cerca de 200 mil empregos diretos e mais de 2 milhões indiretos. Nada menos que 80% do saldo comercial brasileiro em 2021 veio da atividade de mineração, responsável por US$ 58 bilhões em exportação, tendo movimentado no último ano 372 milhões de toneladas nos portos brasileiros.
Em 2021 o setor recolheu R$ 117 bilhões em tributos e encargos, sendo R$ 10,3 bilhões para a CFEM – Compensação Financeira pela Exploração Mineral, e vai investir US$ 40,4 bilhões até 2026.
Todos estes resultados utilizando apenas 0,6% do território brasileiro.
Trata-se de um setor indutor de negócios em extensas cadeias produtivas na indústria, atacado, varejo, serviços e no agronegócio, impulsionando a economia e o IDH– Índice de Desenvolvimento Humano de muitos municípios e respectivas regiões.
Economia Circular
Em nossa economia atual, exploramos os recursos naturais do planeta, extraímos minérios e, eventualmente, os jogamos fora como lixo. Já a economia circular, como o nome sugere, tem outra proposta. Com foco na regeneração da natureza, ela permite que os produtos e materiais circulem, aumentando a vida útil, além de eliminar a produção de resíduos. A eliminação de resíduos e o uso seguro e contínuo dos recursos naturais que envolve uso conjunto de recursos ou espaços de bens inerentemente finitos, arrendamento, reutilização, reparação, renovação e reciclagem de materiais e produtos existentes durante o maior tempo possível. A implementação está baseada em três princípios básicos: eliminação de resíduos e poluição, circulação de produtos e materiais e regeneração da natureza.
A Economia Circular tem alguns problemas ainda não equacionados:
- O fechamento de ciclos de materiais e produtos, de fato, impede a produção primária?
- Limites da ‘circularidade material’ frente a uma realidade com demanda crescente.
- As atividades de produção secundária (reutilização, reparo e refazimento) realmente reduzem ou substituem a produção primária (extração de recursos naturais)?
- “A recuperação e reciclagem de materiais que foram dispersos pela poluição, resíduos e eliminação de produtos em fim de vida requerem energia e recursos, que aumentam de forma não linear à medida que aumenta a percentagem de material reciclado (devido à segunda lei da termodinâmica: entropia causando dispersão). A recuperação nunca pode ser de 100% (Faber et al., 1987). O nível de reciclagem apropriado pode diferir entre os materiais” (Conselho Consultivo Científico das Academias Europeias – EASAC).
- O fato de que o processo de reciclagem de produtos modernos está longe de ser 100% eficiente. Os bens de consumo modernos são compostos por uma diversidade imensa materiais, que na maioria das vezes não são passíveis de decomposição ou facilmente recicláveis. A perda de recursos durante o processo de reciclagem sempre precisa ser compensada com mais extração de recursos naturais. A reciclagem de materiais também requer energia, tanto pelo processo de reciclagem quanto no transporte de reciclados e a serem reciclados.
- Alguns processos de reciclagem produzem apenas materiais inferiores (“downcycling”) que entram no fluxo de lixo/resíduos logo depois. A reciclagem infinita é uma utopia para a maioria dos materiais e matérias primas.
- Os metais reciclados só podem suprir 1/3 da demanda anual por novos metais, mesmo que o metal tenha capacidade de reciclagem relativamente alta. Não há matéria-prima reciclável suficiente para pôr fim à economia extrativa em contínua expansão.
- “O crescimento torna impossível uma economia circular, mesmo se todas as matérias-primas fossem recicladas e toda reciclagem fosse 100% eficiente. A quantidade de material usado que pode ser reciclado será sempre menor que o material necessário para o crescimento. Para compensar isso, temos que extrair continuamente mais recursos.” (Kris De Decker)
- O uso global de recursos — energia e matérias primas — continua aumentando ano a ano (em média 3 % ao ano). O dobro do crescimento populacional.
NYMBI
Embora as questões ambientais tenham avançado bastante – não há mágica que faça as interferências dos empreendimentos minerários desaparecerem, como por encanto. As operações de mineração podem criar um impacto ambiental negativo, tanto durante a atividade de mineração quanto após o fechamento da mina.
Especialmente quando não são cumpridas as normas legais associadas, em particular as do licenciamento ambiental e não são utilizadas as melhores técnicas de engenharia nos processos produtivos.
A mineração é a única atividade econômica, que de acordo com a Constituição Brasileira de 1988, em seu artigo 225, & 2º, que tem a obrigação de recuperar as áreas afetadas.
As pessoas podem até ser favoráveis à mineração – com a presença crescente do conceito: desde que não no meu quintal (not in my backyard – NIMBY).
Veja alguns impactos ambientais negativos (lista exemplificativa, não exaustiva):
- Poluição ambiental da terra, ar e água: mineradoras podem ser acusadas de contaminar a terra, o ar ou a água ao seu redor. Especialmente instalações com odores fortes e ou desagradáveis podem causar objeções, bem como a existência de lagos ou barragens de produtos químicos tóxicos.
- Risco de um desastre (ambiental): como o rompimento de barragens de resíduos, contaminação do solo e das águas.
- Poluição sonora: além do ruído do tráfego, um projeto pode ser inerentemente ruidoso pelo movimento de máquinas pesadas, detonações etc.
- Aumento do tráfego: muitas vezes aumentam o volume de tráfego de caminhões.
- Perda de valor da propriedade residencial: casas próximas a um desenvolvimento indesejável podem ser menos desejáveis para potenciais compradores.
- Poluição luminosa: projetos que funcionam à noite ou que incluem iluminação de segurança (como postes de iluminação em estacionamentos) podem ser acusados de causar poluição luminosa.
- Prejuízo visual: uma mineradora dificilmente será uma atração turística.
- Perda da sensação de cidade pequena de uma comunidade: propostas que podem resultar na mudança de novas pessoas para a comunidade, mudando o caráter da comunidade.
- Dificuldade de recursos públicos e escolas: esse motivo é dado para qualquer aumento na população da área local, pois instalações de infraestrutura adicionais podem ser necessárias.
- Benefício desproporcional para não residentes: o projeto parece beneficiar pessoas distantes, como investidores ou pessoas que não fazem a mínima ideia dos impactos gerados pelo recurso natural extraído.
- Aumento da criminalidade: projetos que atraem ou empregam trabalhadores de baixa qualificação podem ser percebidos como aumentando diretamente a quantidade de crimes na área.
- Outros problemas ambientais possíveis são a erosão, subsidência, abandono de resíduos perigosos, perda de biodiversidade e contaminação de aquíferos e cursos de água.
Geralmente, muitas objeções NIMBY são imaginadas ou temidas, porque as oposições têm maior probabilidade de serem bem-sucedidas antes do início da construção. Muitas vezes é tarde demais para contestar o empreendimento após sua operação, pois é improvável que sejam revertidos.
Mineração: Um Mundo Distópico?
As usinas de minério geram grandes quantidades de rejeitos. 99 toneladas de resíduos são geradas por tonelada de cobre. Na mineração de ouro apenas 5,3 g de ouro são extraídos por tonelada de minério, uma tonelada de ouro produz 200.000 toneladas de rejeitos. Esses rejeitos podem ser tóxicos. Geralmente são produzidos como uma pasta e despejados em lagoas feitas de vales existentes naturalmente. Essas lagoas são protegidas por represamentos (barragens de aterro). Em 2000, estimou-se que existiam 3.500 represamentos de rejeitos e que, a cada ano, ocorreram de 2 a 5 grandes falhas e 35 falhas menores (http://www.infomine.com/publications/docs/Martin2000.pdf).
Em 2010 entrou em vigor a Lei Nº 12.334, que estabeleceu a Política Nacional de Segurança de Barragens destinadas à acumulação de água para quaisquer usos, à disposição final ou temporária de rejeitos e à acumulação de resíduos industriais, e criou o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens.
Apesar da previsão legal do Relatório (anual) de Segurança de Barragens, sob coordenação da ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico, nem Mariana (05/11/15), nem Brumadinho (25/01/19) aparecerem com alertas ou apresentaram riscos relevantes em qualquer um dos relatórios anteriores ao rompimento.
Neste relatório anual, os fiscalizadores listam as barragens que mais os preocupam, contendo algum comprometimento estrutural importante que impacta a segurança, incluindo os possíveis impactos. Busca priorizar as barragens que mais apresentavam comprometimento de sua segurança, tanto para ações de fiscalização como para investimentos em manutenção e recuperação.
Minas Gerais tem 400 minas abandonadas ou desativadas e que pertencem a empresas que hoje em sua maioria estão com as atividades paralisadas. Duas das instalações seriam mais perigosas do que a barragem que se rompeu em Brumadinho. Uma verdadeira “bomba-relógio”. Veja mais detalhes em https://www.correiodopovo.com.br/notícias/geral/mg-tem-400-minas-abandonadas-e-especialistas-falam-em-bomba-relógio-1.319079.
Em 25/02/23 venceu o prazo para a desativação de barragens a montante. Segundo dados da SEMAD – Secretaria de Estado e de Meio Ambiente Sustentável de Minas Gerais, são 54 barragens a montante. As mineradoras informaram que irão descumprir o prazo para 42 barragens (https://www.synergiaconsultoria.com.br/fique-por-dentro/prazo-para-desativacao-de-barragens/).
Foi feito um TAC – Termo de Ajustamento de conduta com o MP – Ministério Público Estadual, ajustando o prazo original da lei Nº 23.291/2019 (MG) vencido e, validando novos prazos de acordo com o porte e volume de cada empreendimento, observado a boa técnica da engenharia. As empresas pagaram multas superiores a R$ 600 milhões. o MP e a SEMAD, monitoram os acordos feitos, com acompanhamento da ANM – Agência Nacional de Mineração.
O Poço do Visconde
Monteiro Lobato sempre foi um escritor polêmico. Mesmo em vida sofreu “cancelamento” de suas obras como os livros do Sítio, que foram reprovados para compor conteúdos pedagógicos em 1920.
Trechos hoje considerados racistas, estão sendo reescritos e adaptados.
O livro infantil de sua autoria “O Poço do Visconde” (1937) em sua primeira edição tinha o subtítulo “Geologia para crianças”. Sua publicação sofreu críticas na época, visto que o livro afirma que havia petróleo no Brasil enquanto os técnicos do governo federal diziam que o Brasil não tinha nem poderia ter petróleo, apesar das descobertas em São Paulo e Alagoas.
Existem documentos que registram as batalhas do escritor contra a política de exploração mineral praticada no Brasil sob Getúlio Vargas. Lobato se envolveu ativamente na pesquisa e na prospecção do petróleo. Esperava que o Brasil alcançasse desenvolvimento semelhante aos EUA e ainda se firmasse como produtor. Lobato iniciou a Campanha do Petróleo. Chegou a ser preso por isto.
Crítico do entreguismo cobrava que Getúlio Vargas priorizasse os interesses do Estado brasileiro, inclusive em longo prazo. Quase um século se passou desde que Lobato lutou contra a burocracia institucional que opera na máquina política brasileira. Sua indignação visceral ainda inspira a defesa do interesse nacional na mineração. Os acidentes de Brumadinho e Mariana despertam sentimentos e desejos pelos quais Lobato dedicou a sua vida.
Meio Ambiente
A mineração tem investido de forma robusta na preservação ambiental, em novas tecnologias de apoio à mitigação de impactos negativos, em estratégias de monitoramento, em estudos ambientais, entre outros. Ao mesmo tempo, aprimora constantemente os seus processos produtivos, visando principalmente a redução da geração de resíduos, do consumo de energia e de água nova e a maiores índices de reaproveitamento deste insumo. Estas tendências marcam a nova mineração, mais aprimorada do ponto de vista ambiental, iniciativas que devem ser observadas e incluídas nos ritos dos licenciamentos, que devem ser otimizados e agilizados, sem perder o conteúdo técnico exigido pela legislação.
Para que a indústria mineral continue cumprindo sua missão ininterruptamente e apresente resultados cada vez mais positivos, afirma o IBRAM, é imprescindível a criação de ambientes regulatórios e institucionais favoráveis às transformações produtivas, além de um licenciamento ambiental ágil.
A ausência de uma política pública ambiental clara e objetiva, e a inexistência de um marco regulatório específico, por exemplo, refletem na subjetividade e na imprecisão das normas administrativas.
Além disso, a baixa capacidade institucional, a fragilidade técnica, a existência de instâncias decisórias paralelas, entre outras deficiências da estrutura reguladora, impedem a agilidade na análise dos estudos ambientais.
O melhor caminho para a compatibilização das legislações minerária e ambiental é, sem dúvida, a criação de um sistema de licenciamento ambiental específico para a atividade mineral, regulado no plano federal. Esse modelo já existe para os setores de petróleo, gás e energia elétrica, uma vez que todos são regidos pelo mesmo sistema de concessão pública e seria seguramente uma solução viável para os inúmeros conflitos que têm sido verificados pela indústria mineral na acessibilidade dos recursos minerais.
Mesmo que, em matéria ambiental, haja entraves em relação a competência concorrente entre a União e Estados, o tratamento do aspecto ambiental não pode ser concebido de forma isolada e estanque, afirma o IBRAM em seu documento de Políticas Públicas (https://ibram.org.br/noticia/carta-compromisso-do-ibram-perante-sociedade/).
Deve haver sinergia entre todos os interesses envolvidos na regulação do setor, e vale ressaltar que a acessibilidade aos recursos minerais é uma questão de caráter nacional, comum a todas as localidades por onde ocorrem os depósitos minerários.
Ainda de acordo com o IBRAM, 2022, para a mineração cumprir seu papel de promover uma melhor qualidade de vida aos brasileiros, figurando como uma das bases para políticas públicas voltadas ao desenvolvimento socioeconômico, e para o Brasil cumprir seu papel na agenda verde, providências se mostram fundamentais, tais como:
- Fortalecer o orçamento da agência responsável pela regulação e fiscalização da mineração – a Agência Nacional de Mineração;
- Combater o garimpo irregular e a lavra ilegal de minérios, que têm gerado severos impactos negativos à floresta e às comunidades, especialmente na Amazônia; virar o jogo em relação à destruição ambiental que a lavra ilegal produz;
- Incentivar a pesquisa geológica em escala mais detalhada;
- Assegurar acesso mais amplo a territórios, muitos dos quais apresentam restrições legais à atividade econômica.
A iniciativa do IBRAM, em apresentar a toda a sociedade seu documento intitulado Políticas Públicas para o Setor Mineral (https://ibram.org.br/wp-content/uploads/2022/08/Livro_Politicas_Publicas-Digital.pdf.) merece aplauso, por demostrar o interesse setorial em discutir a importância do setor, seus pontos de excelência e os pontos de melhoria. O documento está aberto a considerações da sociedade e do poder público. Uma gestão de um setor tão importante como o mineral, amparada nas melhores práticas da sustentabilidade e dos princípios ESG, feitas com as melhores técnicas operacionais, primando pela segurança, respeito ao meio ambiente e inclusão social, beneficiando toda a população deve ser do interesse e objetivo de todos nós.
Net Zero e Green Deal
O termo “Net Zero” (Neutralidade de carbono) é cada vez mais usado para descrever um compromisso mais amplo e abrangente com a descarbonização e a ação climática, indo além da neutralidade de carbono. É uma política oficial do governo no nível federal nos EUA, em toda a Europa, na maioria dos estados americanos azuis e no Canadá, Austrália e Nova Zelândia.
Busca uma rápida eliminação do uso de combustíveis fósseis (proibições de fraturamento e exploração, impostos punitivos, processos ambientais onerosos para a perfuração de novos poços e minas). Força a redução na produção e uso de combustíveis fósseis de todas as maneiras possíveis.
O objetivo é fazer a transição para “eletricidade 100% livre de poluição de carbono até 2035” (como energia solar, eólica e baterias, mas não nucleares nem fracking) e para uma “economia líquida de emissões zero depois de 2050.”
Em teoria, nenhum novo investimento na produção de petróleo e gás seria necessário.
Isto implica em mudar a frota automotiva de motores a combustão para veículos elétricos (inclui máquinas agrícolas, tratores, caminhões etc.), equipamentos de mineração, equipamentos de construção, 50.000 jatos pesados e de longo alcance e mais de 50.000 navios mercantes pesados.
Muita da tecnologia necessária ainda não existe (ou certamente não na forma comercial).
Supostamente seria apenas uma questão de vontade e dinheiro mudar para toda a eletricidade do vento e do sol e que a população de 8 bilhões do mundo pode sobreviver sem os mais de 6.000 produtos em nossa economia e estilos de vida que dependem dos derivados de petróleo fabricados a partir de petróleo bruto.
Mas talvez um dos impactos mais relevantes seja sobre a mineração.
Atingir a meta do Green Deal da União Europeia de neutralidade climática até 2050 exigirá 35 vezes mais lítio e 7 a 26 vezes a quantidade de metais de terras raras, um fornecimento anual muito maior de alumínio (equivalente a 30% do que a Europa já usa hoje), cobre (35%), silício (45%), níquel (100%) e cobalto (330%). Tudo isso é essencial para os planos da Europa para a produção de veículos elétricos e baterias, tecnologias renováveis de energia eólica, solar e de hidrogênio e a infraestrutura de rede necessária para alcançar a neutralidade climática. Cria o risco de novas dependências de fornecedores “insustentáveis”.
Projetos de mineração para extração desses metais podem levar mais de uma década (em média 16 anos) para entrar em operação e, portanto, a escassez deve ser ainda maior na próxima década.
Neste novo cenário qual a importância dos investimentos em reciclagem? Como nós brasileiros estamos nos preparando para isto?
Sinalização de Virtude
Tem muito “alecrim dourado que nasceu no campo sem ser semeado” sinalizando virtude ou a correção moral de sua posição ao expressar publicamente opiniões de repúdio a todo e qualquer tipo de mineração como degradadora do meio ambiente. Pode ser um alinhamento socialmente aceitável, porém desprovido de valor intrínseco. Exibições públicas de indignação online ignoram o fato de que o resultado da mineração é consumido por todos nós em escala que não percebemos: o espaço que nos rodeia (todas as edificações utilizaram produtos minerais, sua roupa, sua comida, seu deslocamento só foi possível graças à mineração. E a sua “espada cintilante” – seu smartphone – é um “celular de sangue” no seu bolso: “Até 5 milhões de pessoas morreram em conflitos desencadeados pela extração de metais na África – usados na fabricação de celulares e computadores” (https://veja.abril.com.br/mundo/atencao-pode-haver-um-celular-de-sangue-no-seu-bolso/).
“Nunca se esqueça desta regra fundamental: o vento e a luz do sol são limpos, renováveis e sustentáveis. No entanto, aproveitar essas fontes de energia não confiáveis e dependentes do clima para alimentar as economias modernas requer milhões de toneladas de metais e minerais extraídos de bilhões de toneladas de minérios, principalmente usando processos sujos e poluentes em países que estão convenientemente fora da vista e da mente.” (Paul Driessen)
A falta de clareza e direção da iniciativa explicitando o que está errado, como deve ser feito e porque deve ser feito de forma diferente. Apenas indignar-se é “desafinado coro dos contentes”.
Os sinalizadores de virtude não raro apresentam “consumo ostentatório ou consumo conspícuo com gastos em bens e serviços adquiridos principalmente com o propósito de mostrar riqueza. Esta exibição serve como meio para ter ou manter um status social perante um grupo social, com base em bens adquiridos e exibidos.” (Fernando Nogueira da Costa).
Este consumo ostentatório tem maior impacto ambiental e é antagonista da sustentabilidade, pois induz a colossal exploração de recursos naturais para alimentar a produção de bens supérfluos.
O que nós somos nos controla, e ecoa tão alto, que os outros não conseguem ouvir o que nós dizemos ao contrário. Porém, conforme afirmou Willian Shakespeare “os homens podem, porém, interpretar coisas ao seu modo. Livres da finalidade da coisa propriamente dita.”
Conclusões
A mineração tem importância fundamental para a história da humanidade, fornecendo muitos bens minerais, matérias primas e insumos, que foram, são e serão imprescindíveis ao progresso e desenvolvimento das civilizações.
“A mineração, portanto, segue a velocidade da inteligência humana, pois basta projetar qualquer ideia inovadora e lá está a mineração novamente, buscando materiais para tornar possíveis as mirabolâncias criativas da humanidade… A mineração é uma atividade essencialmente cara, em todos os sentidos: cara por ser valiosa para a humanidade e cara no sentido de que, normalmente, exige o investimento de muitos recursos para acontecer.” (Edson Peres)
“Vamos duvidar de tudo que é certo”: mineração é sinônimo de destruição ambiental? “Vamos velejar num mar de lama”? Como todas as atividades humanas geram impactos ambientais negativos, mas que podem e devem ser mitigados, compensados e até mesmo indenizados.
Como produtores devemos cumprir e fazer cumprir na cadeia produtiva os atos normativos que regulam a mineração e o meio ambiente (estimada em 60.000 normas ambientais, entre atos normativos da União, dos Estados e Municípios brasileiros, bem como órgãos de normalização técnica). Eu produzo, você consome, nós poluímos.
Como consumidores (e todos nós somos consumidores de produtos minerários) podemos e devemos exigir uma mineração mais sustentável e socialmente aprimorada, com maior prosperidade econômica, saúde e padrões de vida, para a sociedade. “Vamos todo mundo, ninguém pode faltar”.
A vida humana sem mineração é impossível, mesmo para os padrões civilizatórios da Idade da Pedra.
A mineração é imprescindível à sadia qualidade de vida das atuais e futuras gerações!
*Decio Michellis Jr. – Licenciado em Eletrotécnica, com MBA em Gestão Estratégica Socioambiental em Infraestrutura, extensão em Gestão de Recursos de Defesa e extensão em Direito da Energia Elétrica, é Coordenador do Comitê de Inovação e Competitividade da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica – ABCE, assessor técnico do Fórum do Meio Ambiente do Setor Elétrico – FMASE e especialista na gestão de riscos em projetos de financiamento na modalidade Project Finance. Linkedin Decio Michellis Jr.
Enio Fonseca – Engenheiro Florestal, Senior Advisor em questões socioambientais, Especialização em Engenharia Ambiental, em Gestão Empresarial pela FGV, Conselheiro do Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico, FMASE, foi Superintendente do IBAMA em MG, Superintendente de Gestão Ambiental do Grupo Cemig, Chefe do Departamento de Fiscalização e Controle Florestal do IEF, Conselheiro no Conselho de Política Ambiental do Estado de MG, Ex Presidente FMASE, founder da PACK OF WOLVES Assessoria Ambiental, parceiro da Econservation. Linkedin Enio Fonseca
Fonte: Direito Ambiental
Publicação Ambiente Legal, 12/04/2023
Edição: Ana Alves Alencar
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