Infestação de escorpiões amarelos já preocupa e pode aumentar 70% em dois anos
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
Escorpiões invadem as cidades
Verão é a estação propícia para se ouvir notícias de pessoas que se depararam com escorpiões amarelos no jardim, na janela ou na pia da lavanderia.
No entanto, o minúsculo artrópode está se reproduzindo em proporção fora do comum. Originário do cerrado, ele se adaptou inteiramente ao ambiente urbano e, agora, começa a infestá-lo. Predador natural das baratas, não é difícil entender a que ciclo ecológico sua proliferação obedece…
Segundo Randy Baldresca, biólogo e pesquisador, o número de bichinhos andando pelas ruas deve aumentar até 70% nos próximos dois anos.
“Se o acúmulo de lixo permanecer nas ruas, a população continuar mal informada em como lidar com o animal e o número de edificações for ampliado, a situação vai se agravar”, diz Baldresca.
A população urbana já começa a sentir esse efeito. Na cidade de São Paulo, por exemplo, moradores de um bairro nobre – Morumbi, relataram que em apenas uma semana, cerca de cem escorpiões foram capturados em um condomínio.
No fim do ano passado, o Tityus serrulatus (seu nome científico), também foi responsável por desclassificar uma estudante de Campinas (SP) no vestibular da Fuvest, prova que dá acesso à Universidade de São Paulo (USP). Pouco antes de iniciar o exame, ela passou mal e teve que deixar o local.
Casos como estes figuram numa série de relatos notificados desde o início deste ano.
No início do ano, a prefeitura de São Paulo distribuiu comunicado que alertava sobre o aumento de ocorrência dos bichos, especialmente nas regiões de Pirituba, Itaquera e Butantã.
Eles também têm circulado por Pinheiros, Osasco e Barueri.
Espécie mortal
A espécie que está proliferando por aqui é a Tityus serrulatus, conhecida como “escorpião amarelo”. Trata-se de um tipo urbano, frequentador de esgotos ou redes pluviais, e considerado o mais perigoso da América Latina.
“Sua picada é muito dolorida, provoca náuseas, vômitos, sudorese, e o veneno pode matar crianças de até 12 anos e idosos após causar arritmia cardíaca e edema pulmonar”, diz o imunologista Luiz Vicente Rizzo, presidente do conselho curador do Instituto Butantan.
“Os feridos devem ser levados o mais rápido possível ao hospital mais próximo”, recomenda. Para não correr risco de morte, a pessoa tem de ser atendida em, no máximo, quatro horas. É preciso tomar soro contra o veneno e analgésico para aliviar a dor.
Empresas especializadas no controle de pragas informam que só nas duas primeiras semanas de 2016, mais de 60 infestações de escorpiões foram controladas pelos biólogos das equipes da Grande São Paulo.
Para se ter ideia da gravidade, uma única empresa de controle de pragas já registra cerca de 80 casos de infestação no período de um ano.
O Ministério da Saúde estimou a quantidade de acidentes por escorpiões em 2015. E o número assusta: aproximadamente 74,5 mil pessoas picadas em todo o Brasil – um aumento superior a 24% no período de quatro anos.
Super resistência, adaptabilidade e reprodução
“Esse animal é completamente adaptável ao ambiente urbano. Ele consegue se instalar em uma residência por até um ano sem precisar se alimentar”, diz Baldresca.
O biólogo faz ainda um alerta impressionante: “os inseticidas usados para combater insetos não funcionam para controlar escorpiões”, pelo contrário, estimulam a sua reprodução.
O biólogo explica que o escorpião amarelo se reproduz até duas vezes ao ano. Porém, quando esse animal sofre um stress (como quando jogamos veneno ou o cutucamos), ele entra em um processo de reprodução assexuada.
“Ou seja, quando provocado, ele se autoreproduz fora de época e libera de 20 a 30 filhotes no ambiente”, explica.
Contra a terceira espécie mais perigosa do mundo, só prevenção
A picada do escorpião amarelo pode matar. O governo do Estado de São Paulo informou que, no ano passado, cinco óbitos foram notificados.
Tratando-se da terceira espécie de escorpião mais perigosa do mundo, é preciso saber como se prevenir. As principais vítimas, e as que correm o maior risco, são as crianças de até 12 anos e os idosos.
Sendo assim, o biólogo recomenda que os jovens utilizem calçados nos jardins e que o ambiente de casa esteja sempre limpo e livre de sujeira.
“Evite deixar louça na pia da cozinha, retire o lixo do banheiro antes que ele acumule e tampe todos os ralos e pias”, diz. “Assim, você diminui a presença de baratas, que é a principal fonte de alimentação dos escorpiões e grande responsável por seu aparecimento nas residências”.
A saída é esmagar, cortar, destruir ou, comprar galinhas…
É importante lembrar que quanto mais próximo um local for de um cemitério, terreno baldio, trem ou riacho, maior é o risco de presença desse aracnídeo.
Como o veneno não ajuda e não mata o bicho, o recomendado é que ao se deparar com um, seja feita uma ação mecânica que mate o animal.
Na prática, a pessoa deve usar uma faca ou algum objeto que esmague ou corte o escorpião ao meio.
Predadores naturais também ajudam, como é o caso das galinhas e outras aves. Há condomínios em várias cidades que criam, em seus jardins comuns, galinhas d’angola – espécie ornamental e, também, excelente predador dos escorpiões amarelos.
Barreiras ambientais e falta de investimento
O problema maior no combate a esse espécime peçonhento é o mesmo para vários outros insetos que andam atormentando as populações em todo o planeta: o preconceito ambiental com relação ao desenvolvimento de defensivos químicos aplicados por aspersão e a falta de investimentos públicos e privados no saneamento e na pesquisa.
O escorpião cresce na razão exata do mosquito, com um agravante: ele dispensa a água. Os principais focos surgem, no entanto, onde o saneamento não está presente – e não se trata apenas do lixo ou esgoto expostos. No caso do escorpião, canais pluviais com manutenção precária, matinho alto e seco, locais com entulho, formam ótimo habitat.
O incrível é que o volume de chuvas observado nos primeiros meses do ano, que em tese deveria “afogar” a espécie, fez os escorpiões invadirem casas e apartamentos, pois os canais pluviais ficaram inundados. Assim, o perigo cresceu exponencialmente na mesma razão da proliferação dos mosquitos – incentivados justamente pelas chuvas – porém, por motivos diferentes.
Houvesse, portanto, investimento em manutenção e saneamento, bem como em pesquisas, o risco diminuiria.
Fontes:
exame, Veja-SP