Por Gen.Sérgio Westphalen Etchegoyen*
A humanidade alcança hoje impressionantes 8 bilhões de pessoas espalhadas em todos os rincões do planeta, num mundo politicamente organizado em estados-nações segundo o modelo westfaliano do século XVII, no qual convivem 195 países, desde gigantes territoriais como a Rússia até o Vaticano em seus reduzidíssimos 44 hectares, 4,5 quarteirões.
Curiosamente, neste momento em que a sociedade internacional experimenta um vigoroso aprofundamento da integração e lida com sua consequência mais visível, a interdependência, o noticiário internacional saiu de moda, deixando uma incômoda lacuna que nega ao cidadão comum o conhecimento das profundas transformações que se vêm produzindo.
Dois fenômenos globais nos apontam de forma dramática o imperativo da cooperação entre soberanias: a pandemia e as impressionantes manifestações das forças da natureza registradas neste ano como resultado das mudanças climáticas.
O combate à Covid-19 e suas variantes exigiu troca de informações e de experiências que interconectou profissionais de saúde de todos os continentes, tanto para o aperfeiçoamento do tratamento como para a produção de vacinas.
As causas e consequências das alterações do clima, por seu lado, também não poderão ser enfrentadas sem um elevado grau de cooperação.
A primeira grave questão que se apresenta nesse cenário é como estados soberanos se associarão para combater ameaças igualmente compartilhadas sem ferir suas autonomias, uma vez que ainda não se encontrou formato mais eficaz do que o multissecular modelo já citado?
A urgência de uma solução efetiva esbarra nas inúmeras contradições que poluem a discussão.
A China, responsável por quase 50% das emissões mundiais de dióxido de carbono e campeã no risco climático, sustenta um discurso de descarbonificação da economia que a prática nem as metas que estabeleceu confirmam. O regime não democrático consegue, por intermédio da hegemonia do Partido Comunista, impor a conveniência política sobre o interesse da sociedade.
Da mesma forma, que credibilidade se pode conferir às promessas de países detentores de arsenais nucleares capazes de destruir múltiplas vezes o planeta?
Como interpretar o pensamento de potências e alianças que incluíram os câmbios climáticos entre as ameaças à segurança nacional?
No próximo domingo, em Glasgow, na Escócia, será iniciada a 26ª Conferência das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas (COP-26) na busca das respostas a essas e outras dúvidas.
A soberania brasileira é inegociável sim, como afirmou o Presidente Bolsonaro em resposta ao seu colega francês, mas ela não se pode furtar ao diálogo com outras soberanias para preservar o interesse do nosso povo. O exercício da soberania, antes de proteger a população de ameaças externas, impõe e assegura o interesse dessa mesma população nas suas relações internacionais.
Vivemos um daqueles momentos históricos em que a humanidade é, literalmente, a dona do seu destino. A batalha para preservar para as próximas gerações o mundo como o conhecemos será travada dentro de cada um de nós, entre o egoísmo autodestruidor e a solidariedade que potencializa a força individual em benefício do conjunto.
*Sérgio Westphalen Etchegoyen é General de Exército da Reserva do Exército Brasileiro. Foi ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional – GSI, da Presidência da República do Brasil no Governo Michel Temer. Foi oficial do Estado-Maior da Missão das Nações Unidas em El Salvador e chefe da Comissão do Exército Brasileiro em Washington – Estados Unidos. Comandou a 4ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e chefiou o Núcleo de Implantação da Estratégia Nacional de Defesa. Comandou a 3ª Divisão de Exército, foi Chefe do Departamento-Geral do Pessoal e Chefe do Estado Maior do Exército Brasileiro.
Fonte: o autor
Publicação Ambiente Legal, 01/11/2021
Edição: Ana Alves Alencar
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