Paisagismo sustentável oferece soluções para melhorar o meio ambiente e a qualidade de vida
Por Vitor Lillo
Para vários gostos e bolsos, o paisagismo sustentável desponta como uma solução criativa para a falta de espaços verdes nas grandes cidades. E não se está falando aqui daquele paisagismo meramente decorativo, mais focado na estética.
“É preciso que o projeto tenha caráter educativo. Por isso é importante ter plantas nativas, porque ajuda a reequilibrar o ambiente urbano. Por exemplo, plantar uma espécie de palmeira que produz o palmito juçara, alimento do tucano-de-bico-preto, uma espécie nativa”, ilustra Ricardo Cardim, diretor da SkyGarden Telhados e Paredes Verdes.
Esqueça o “gramadão” com algumas plantas e arbustos em volta; a densidade de plantas no espaço deve ser a maior possível. “Vegetação densa tem biomassa, só assim você traz a diminuição de temperatura, reciclagem do ar e diminuição de barulho”, salienta Ricardo.
O paisagismo sustentável parece complexo e de fato é, como aponta Cardim. “O paisagismo convencional se preocupa com a estética enquanto no sustentável a preocupação é mais técnica. […] Preciso ter uma equipe multidisciplinar, com botânico, engenheiro agrônomo e arquiteto”.
Montar jardins em edificações é uma prática que remete à Antiguidade. Hoje, a técnica ressurge com várias técnicas para espaços impermeabilizados. Além disso, São Paulo e Rio de Janeiro, as duas grandes metrópoles do país, já incentivam construções com espaços verdes. O que é tendência pode virar – ou voltar a ser – uma regra.
Modo de Fazer
Mas o que é preciso fazer para ter um espaço desses em uma casa ou prédio? O primeiro passo, segundo a bióloga e paisagista Natasha Navazinas, é estudar. “Você precisa conhecer a localização, o histórico do local, o que seria a [vegetação] original. Se você vai fazer no litoral, tem que pesquisar o que é de lá”.
No estado de São Paulo, por exemplo, predominam espécies da Mata Atlântica como ipê, jabuticabeira, palmeira jerivá, manaçá da serra, isso para citar algumas espécies.
No caso do jardim ser construído em uma casa, por exemplo, é preciso ter atenção à espécie da planta e ao solo. “É preciso ter certeza que a terra é de boa qualidade. Se a planta é exótica, geralmente é preciso usar produtos para preparar o solo. Mas quando a planta originária do local, isso já não é preciso”, completa Natasha.
Outra dica da paisagista, que vale tanto para casas quanto para prédios, é variar as espécies de plantas. “Quando você coloca uma árvore, arbusto é importante misturar um pouco, em vez de fazer maciço [técnica que consiste em concentrar espécies de plantas em um mesmo local formando uma espécie de mancha]”.
A reciclagem de materiais também é outra premissa do paisagismo sustentável. “Para a drenagem, por exemplo, a gente tem muito isopor em embalagens de eletrodoméstico. Eu poderia usar isso no vaso, na composição do vaso. Quebro em partes menores e ele escoa a água para a raiz da planta”, explica Natasha.
Esse mesmo vaso de plástico para plantas poderia ser reutilizado em vez de descartado. “A gente compra muito plantas em vasinhos. Quando uma planta morre, não é preciso jogar o vasinho fora, ele pode ser reutilizado. Em Campinas [município a 100 km de São Paulo], já existe uma iniciativa assim entre os viveiros [locais que cultivam e vendem mudas de plantas]”, relata Navazinas
No caso dos edifícios, a situação é mais delicada, não só pela impermeabilização do solo pelo concreto, mas também por outras características como sol e, principalmente, o vento. “O vento provoca choque mecânico em que a planta fica batendo e rasga, isso é ruim porque ela fica menos vistosa, floresce com menos abundância, tem grande perda de água com o vento”, aponta Natasha.
E como se planta em uma laje, por exemplo? A solução lembra as camadas de um bolo. “A drenagem na laje pode ser feita com argila expandida, ela é leve, uma manta geotêxtil que parece um feltro e pode agregar terra em cima, ou se for um jardim de plantas suculentas, pode colocar um pouco de areia”, explica a paisagista.
Mas talvez de todas essas dicas, a mais importante seja pensar no projeto paisagístico com antecedência. “o paisagismo [geralmente] entra por último. O montante destinado à obra é bem pequeno para o paisagismo e a gente tem prazos mais curtos. São poucos arquitetos que tem o cuidado de chamar com antecedência. Seria interessante chamar quando a obra está começando”, alerta Navazinas.
Gentileza urbana
Benedito Abbud enxerga o paisagismo além dos muros e lajes. “Em minha opinião temos que pegar o todo. A pessoa faz um projeto paisagístico da casa como se não tivesse uma cidade em volta. É muito importante ter essa visão mais globalizada”, vaticina o arquiteto e paisagista que dá nome a um escritório com 32 anos de história e projetos pelo Brasil, América do Sul e África.
Um grande avanço nesse sentido, segundo Abbud, é o novo Plano Diretor da Cidade de São Paulo que entrou em vigor em 2013 e incentiva prédios com áreas verdes abertas ao público, como o Conjunto Nacional na Avenida Paulista. “Essa legislação faz com que os prédios comecem a fazer o que chamo de ‘gentileza urbana’”.
“O projeto tem que ser pensado como uma continuidade da praça, aumentar a largura das calçadas para você começar a ter uma cidade mais amigável, que se volte mais para as pessoas e não para os carros, como nós pensamos até outro dia”, explica Benedito.
É consenso geral entre arquitetos e urbanistas que São Paulo é uma cidade pouco amigável para as árvores. Faltam espaços para plantio e, sobretudo, falta manutenção para aquelas já estão de pé. Mas Abbud vai além e aponta a falta de planejamento no plantio como outro fator de ameaça.
“Em São Paulo não temos muito planejamento de espécies de plantio, então temos uma cultura de plantar aquilo que ganhei do vizinho. Grande parte das figueiras, seringueiras, eram plantados naqueles vasos que lembram cone de sorvete. Com o tempo virou uma figueira enorme. O problema não é a figueira, mas é onde e como ela foi plantado”.
Milton Ribeiro, professor do Departamento de Biologia da UNESP de Rio Claro, concorda com Benedito. “Temos que pensar, essas áreas verdes, a primeira coisa é evitar a ‘arbusterização’, por conta dos conflitos com as redes elétricas, paulatinamente as árvores são substituídas por arbustos que são menores e além de não gerar sombra, não permite o uso por parte da fauna”.
Quando falta espaço para as árvores na calçada, uma alternativa são os tetos verdes. Nova York e Buenos Aires já dão incentivos fiscais para quem plantá-las no topo dos prédios. Mas será que isso resolve? Ribeiro discorda. Se você pensar na Grande São Paulo que tem muitos prédios, imagine que você está a 15 andares e apenas a cobertura com árvores. Isso vai modificar o microclima local só no teto”.
Benedito por sua vez sugere “verdejar” as paredes e muros. “Não é questão de beleza cênica, falamos de minimizar a retenção de calor. São Paulo é uma cidade que junto a um parque denso você chega ter dez graus de variação de temperatura. Quando falamos de verdejar os muros, não falamos só dos vasinhos”, argumenta.
Na teoria a prática é outra
Enquanto as técnicas – e discussões – sobre arborização e paisagismo só aumenta, a procura por mudas de espécies nativas também. A situação gera enorme preocupação entre os profissionais da área.
Para Ricardo Cardim, está cada vez mais difícil encontrar espécies de plantas nativas disponíveis para paisagismo. “O mercado ainda é formatado pra espécies estrangeiras. É preciso garimpar atrás de sementes para replantar no nosso viveiro, que fica lá na Zona Sul [de São Paulo]”, ilustra.
Luiz Paulo Lima, encarregado de produção do viveiro Muda Brasil, situado em Bauru (331 km da Capital) que vende cerca de 90 mil mudas por mês, aponta a subida do preço. “A muda de árvore no sacão [muda com porte de dois metros de altura] era vendido por R$10,00, agora passamos à R$ 20,00 [preço válido somente para algumas espécies]. E isso que mantivemos o preço baixo pra atrair clientela”.
A razão é que muitos viveiros tiveram de encerrar suas atividades por conta do comércio florestal estar em baixa por um tempo considerável, afetando a capacidade de atender a demanda. Além disso, em janeiro de 2012, entrou em vigor a Instrução Normativa nº 56 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que regulamenta a produção, comercialização e utilização de sementes e mudas de espécies florestais, nativas e exóticas. A intenção é de garantir a procedência, identidade e qualidade das mudas.
Natasha Navazinas aponta a falta de tecnologia para melhoramento genético das plantas como outra dificuldade do setor. “Até mesmo uma flor originalmente brasileira e bem conhecida, que é a astromélia, foi produzida com maior variedade de cores e tamanhos lá na Holanda. A planta veio daqui, mas a tecnologia não”.
Com plantas nativas ou exóticas, no quintal ou nas paredes, em muros ou tetos, as pessoas parecem buscar desesperadamente por algo que as conectem à Natureza. O que é extremamente positivo por um lado e irônico por outro,visto que – como diz a canção – dela somos todos filhos.