Como pequenos elementos podem gerar grandes benefícios à Natureza?
Por Vitor Lillo
Pense numa coisa bem pequena que, comparado à moeda de um centavo, daria a mesma relação entre uma bola de futebol e a Lua. Isso é um nanômetro. Nanotecnologia, portanto, é a capacidade de criar tecnologia com matéria de tamanho que equivale a um nanômetro. Por isso temos os smartphones e tablets de hoje e podemos vir a ter computadores que pensem como nós ou até mesmo próteses humanas amanhã.
Mas essas partículas, átomos ou “tijolinhos de matéria” podem ajudar também a construir um futuro mais sustentável. Exemplos disso são as embalagens biodegradáveis que dispensam totalmente o uso de combustíveis fósseis ou mesmo transformar a fuligem da queima de resíduos sólidos em nanotubos, materiais utilizados como base para dispositivos médicos, implantes e peças de eletrônicos.
Todas as realizações citadas têm em comum o fato de serem realizadas por laboratórios e especialistas brasileiros. Apesar dos altos custos com esse tipo de pesquisa e mesmo da falta de mais profissionais especializados, o país já conta com centros universitários e instituições de prestígio empenhadas em projetos que exploram as inúmeras possibilidades oferecidas por essa novíssima ciência.
Plástico “verde”
Se muitos dos produtos que você compra no supermercado são perecíveis, o mesmo não se pode dizer da embalagem. O plástico comum resiste por pelo menos 400 anos até ser absorvido no meio ambiente. Além do problema do descarte existe o da fabricação, para a qual o petróleo é indispensável, ou era, como descobriram os pesquisadores da Embrapa em São Carlos, interior de São Paulo.
Isso porque o amido de alimentos como milho, mandioca, trigo e arroz, com uma pequena ajuda da nanociência, pode servir como elemento para fabricação de plástico biodegradável, ou seja, que se decompõe em contato com a natureza. Esse tipo de plástico degrada-se em incríveis 18 semanas e ainda pode ser misturado ao solo, servindo como adubo, princípio básico da compostagem.
Revolução na sacolinha do mercado e também no plástico-filme utilizado para embalar aquela bandeja de legumes ou verduras que você compra no supermercado: os pesquisadores de São Carlos já descobriram uma forma de adicionar nanopartículas que, ao entrar em contato com o alimento, desenvolve uma espécie de barreira contra bactérias e fungos que diminuem o tempo de consumo do produto.
“Essa nanopartícula é baseada em quitosana, um polissacarídeo derivado dos crustáceos, que apresenta essas características microbicidas. A vantagem de se utilizar esse composto nanoarticulado, você melhora a propriedade mecânica, microbicida. Como ele é um aditivo comestível não causa problemas se aplicado ao filme”, explica Daniel Corrêa, pesquisador da área de pesquisas em materiais da Embrapa.
As linhas de pesquisa em nanotecnologia da Embrapa, têm financiamentos na ordem de R$ 10 mi e são mantidas com recursos da Agência Brasileira de Inovação, do CNPq e também da Fapesp, e não se resumem ao plástico, mas também à nanobiossensores para monitoramento de processos e produtos agropecuários, até a produção de fertilizantes, pesticidas e remédios para animais.
A queima de resíduos para a produção de energia é conhecida, e também polêmica, dada a quantidade de fuligem – que por sua vez contém monóxido de carbono (CO²) – liberada na atmosfera. Mas e se esse poluente fosse transformado em um material de alto valor agregado, de grande procura pela indústria médica e de eletrônicos? O que à primeira vista parece ficção já é estudo premiado pela UNESCO.
Quem esteve à frente deste trabalho foi o pesquisador Joner de Oliveira Alves, orientado pelo professor Dr. Jorge Alberto Tenório Soares, do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), com parte dela sendo realizada na Northeastern University, em Boston (EUA), na modalidade sandwich. O estudo teve apoio do CNPq e da CAPES.
O sistema funciona assim: após a queima do resíduo (bagaço da cana, resíduo de milho, e até garrafa PET usada) os gases, em vez de irem direto para a chaminé vão para um catalisador que decompõe os hidrocarbonetos, restando o carbono – que ao final do processo toma a forma sólida como pó de grafite – e o hidrogênio, limpo, que é enviado à atmosfera. Como diz o ditado, “mata-se dois coelhos numa cajadada só”.
“O sistema catalisador empregado reduziu as emissões gasosas provenientes da queima dos resíduos. Deste modo, a metodologia elaborada representa um incentivo para a cadeia de produção de energia através de resíduos através da criação de valor agregado com a produção dos nanotubos. Outro importante fator é a possibilidade de redução do custo da produção dos nanomateriais”, explica Alves.
A pesquisa fez enorme sucesso e já rendeu seis prêmios entre eles o Mercosul de Ciência e Tecnologia na categoria jovem pesquisador, organizado pela UNESCO. Joner cita ainda o Prêmio Vale-Capes de Ciência e Sustentabilidade, conferido à melhor tese de doutorado na área de tratamento de resíduos. São pequenos grandes passos em uma corrida pelo domínio dessa tecnologia tão recente.
A nanotecnologia é a nova fronteira da pesquisa mundial e o Brasil não poderia ficar atrás. Com forte incentivo dos órgãos de fomento à pesquisa, a intenção é competir com os países desenvolvidos. “A ideia é que começando a pesquisa em nano junto com estes países, o Brasil tem maiores chances de competitividade do que em tecnologias das quais começamos bem depois”, afirma Joner.
Daniel Corrêa acredita que o Brasil “está muito bem” na área de nanotecnologia, em comparação a outros países emergentes. “Existem alguns cursos já específicos de graduação e pós em nanotecnologia. Vamos precisar da formação mais intensa de pesquisadores e que eles atuem não somente nas agências de pesquisa, mas também nas indústrias, porque a grande vantagem é a de agregar valor aos produtos”.
Mas esse apoio não deixa os cientistas imunes às dificuldades enfrentadas por pesquisadores de outras áreas. “Grande parte dos equipamentos necessários para a pesquisa em nanotecnologia precisa ser importado. Isto gera um custo maior, além de uma burocracia que atrasa o processo”, relata Alves que cita alguns dos muitos benefícios ao meio ambiente propiciados pela nanotecnologia.
“A grande maioria [dos projetos de pesquisa] é voltada para aplicações de produtos nanométricos, como o emprego de filtros para purificação de águas poluídas, redutores de emissões de gases poluentes, ou o reforço de materiais atuais para um menor consumo de matéria-prima. O Brasil possui projetos voltados para este fim. como por exemplo, a parceria da qual o minha tese de doutorado participou, a Rede Nanobiotec-Brasil”, completa.
Corrêa acredita que a nanotecnologia pode contribuir e muito para a área de agricultura, especificamente a de insumos agrícolas. “Quando se trabalha com nano, até mesmo pelas características desses materiais, você utiliza uma quantidade menor de insumos. No caso da agricultura na qual se utiliza alguns tipos de pesticidas com nanotecnologia, fertilizantes feitos de cápsulas nanofertilizadas, já fabricadas aqui”.
Tudo que existe na Natureza é feito de átomos e moléculas. O que acontece quando o Homem aprende a manejá-las é uma pergunta que começa a ser respondida. Muitas polêmicas – e mesmo restrições – poderão surgir durante esse processo, mas, enquanto aliada do meio ambiental e fator de melhora da qualidade de vida, o desenvolvimento da nanotecnologia segue imparável.
É possível fornecer o nome de instituições de ensino, no Rio de Janeiro, que tenha cursos de pós-graduação ou mestrado envolvendo o tema nanotecnologia?