GOVERNO FEDERAL AVANÇA A UNIVERSALIZAÇÃO DA LOGÍSTICA REVERSA DE EMBALAGENS
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
O presidente Michel Temer baixou o Decreto Federal 9.177, de 24 de outubro de 2017, que firma um passo definitivo em direção à universalização da logística reversa de embalagens – fator essencial para conferir racionalidade à economia circular e implementar a responsabilidade compartilhada na gestão dos resíduos sólidos urbanos.
Universalização e circularidade
De fato, como leciona a Professora Maria José Salles, “o saneamento não admite excluídos” (*1).
Vale dizer: não há como admitir-se uma política nacional de resíduos sólidos (parte integrante da política de saneamento básico) que não seja universalizada, e isso inclui isonomia na aplicação das normas que a regem.
Essa isonomia implica adesão implementadora à economia circular, nos moldes da escola econômica da “ecologia industrial”, adotada pelo legislador pátrio.
Sob a ótica da escola da Ecologia Industrial, a economia circular aborda e orienta o fluxo de materiais e energia nos sistemas de transformação. Traça conexões entre os atores atuantes no ‘ecossistema industrial’ buscando criar processos de ciclo fechado para reduzir e eliminar externalidades. Nesse circuito, os resíduos transformam-se em insumo.
Segundo os professores Clift e Allwood, a Ecologia Industrial adota um ponto de vista sistêmico, projetando processos de produção de acordo com as restrições ecológicas locais, enquanto observa seu impacto global desde o início, e procura moldá-los para que funcionem o mais próximo possível dos sistemas vivos.
Lecionam os professores:
“Onde isso deixaria as economias em desenvolvimento? De uma perspectiva global, todos se beneficiariam se eles se desenvolvessem incorporando a eficiência material. O uso de material em circuito fechado, formando simbiose industrial entre atividades co-localizadas ou conexas, de forma a que o desperdício ou um subproduto de um, torne-se insumo para outro – são bases estabelecidas para o desenvolvimento planejado” (…). (traduzi livremente) (*2)
A economia circular enfatiza, ainda, a restauração do capital natural, focada no bem-estar social. Daí a importância do compartilhamento de responsabilidades envolvendo todos os atores, inclusive o consumidor, no ciclo de vida dos produtos.
Responsabilidade e isonomia
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010), vincula o ciclo de vida dos produtos à responsabilidade compartilhada, definindo-a como um “conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental” (*3).
Estas definições de universalização e compartilhamento de responsabilidades no bojo da economia circular constituem elementos importantes para contextualizar a ação do governo federal, objetivada no Decreto 9.177/2017.
De início, importante observar que o decreto visa dar suporte à regulação instituída pelas diretrizes de seu Comitê Orientador para Implementação de Sistemas de Logística Reversa, em especial a Deliberação CORI nº 11/2017 – agora devidamente respaldada.
Nesse sentido, o decreto federal 9.177/2017, assegura isonomia na fiscalização e no cumprimento das obrigações imputadas aos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de produtos (e embalagens) sujeitos à logística reversa – portanto, obrigados a apresentar planos visando internalizar os custos ambientais nos termos da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
A universalização dos benefícios da economia circular implica na aplicação isonômica de suas regras de autoridade. Assim, o decreto confere efeito vinculante aos acordos setoriais firmados em âmbito federal, estendendo seus efeitos a todos os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de produtos e embalagens inseridos no sistema de logística reversa. Vale dizer, os não signatários de acordo setorial ou termo de compromisso firmado com a União, são mesmo assim obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, consideradas as mesmas obrigações imputáveis aos signatários e aos aderentes de acordo setorial firmado com a União.
As obrigações abrangem a operacionalização, prazos, metas, controles e registros dos programas de logística reversa, planos de comunicação, avaliações, monitoramento, penalidades e demais obrigações imputáveis aos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes – seja pela submissão às regras, seja por cláusulas nos acordos federais.
Os acordos de logística reversa, portanto, como já apontado na diretiva do CORI, terão efeito vinculante setorizado, similar às convenções coletivas de trabalho ou como deveriam ser as convenções de consumo, previstas no “vetusto” sistema de defesa do consumidor (e não implementadas).
A fiscalização do cumprimento do Decreto competirá aos órgãos do SISNAMA.
Como dito em nossos comentários sobre a deliberação anterior, do CORI (*4), o próximo lance, sem dúvida, será mensurar as obrigações para com a destinação dos resíduos, calculando-se o balanço de massa na produção. Porém, como também já dito, isso é assunto para outro artigo, baseado em outro estuda que já tivemos a oportunidade de realizar.
Notas:
(*1) Salles, Maria José, “Política nacional de saneamento: percorrendo caminhos em
busca da universalização”. Tese (Doutorado) – Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca, Rio de Janeiro, 2009, Orientador: Machado, Jorge Mesquita Huet, pg. 15
(*2) Clift, Roland e Allwood,Julian, “Rethinking the Economy”, Ellen Macarthur Fundation, in https://www.ellenmacarthurfoundation.org/news/rethinking-the-economy , visto em 24/10/2017
(*3) Lei Federal 12.305/ 2010, art.3º, XVII
(*4) Pinheiro Pedro, Antonio Fernando, “Nova Regulação Sobre a Logística Reversa”, in http://www.theeagleview.com.br/2017/09/nova-regulacao-sobre-logistica-reversa.html, 27/09/2017
Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e das Comissões de Política Criminal e Infraestrutura da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB/SP. É Vice-Presidente da Associação Paulista de imprensa – API, Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.