Por Fábio Pugliesi*
Neste artigo analisa-se a disciplina relativa ao crédito do ICMS na exportação, far-se-á breve comparação com o ressarcimento na exportação dos tributos federais, bem como se aludirá à abordagem na PEC n. 110/19 em discussão no Congresso Nacional. Em tempos do COVID-19 é ainda mais essencial os contribuintes defenderem seus direitos
O voto do Senador Roberto Rocha, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal para a PEC n. 110/19, para transformar o crédito acumulado do ICMS nas exportações em títulos da dívida pública dos Estados e do Distrito Federal. Admitindo-se até que este tema desapareça do relatório da Comissão Mista, nada impede que ressurja como destaque na votação no plenário.
A PEC n. 45/19 é silente quanto aos créditos do ICMS e promete ressarcimento imediato do IBS.
Verifica-se assim, alguns aspectos do sistema tributário renovado da PEC n. 293/04, aprovada na Comissão Especial Câmara dos Deputados em 2018.
Afinal, a reforma tributária de 1965 foi feita, segundo a condução técnica de alguns juristas, dentre os quais se notabilizaram Gilberto de Ulhôa Canto e Rubens Gomes de Souza, e um Congresso alinhado com o Presidente Castelo Branco. Por sua vez, em 1988, a Comissão do Sistema Tributário, Orçamento e Finanças, presidida por Francisco Dornelles, relativamente a impostos fez poucas alterações, salvo as que refletiram o poder dos governadores dos Estados federados na época, e deliberadamente criou condições para a recepção integral do Código Tributário Nacional-CTN. O projeto de lei complementar, apresentado pelo então Senador Fernando Henrique Cardoso em articulação com o Senador Roberto Campos, teve por objeto manter o CTN, dada a possibilidade de surgir um “CTN” na Câmara dos Deputados. Segundo nos relatou o Presidente Fernando Henrique Cardoso, o objetivo de ambos era prevenir um CTN que comprometesse a racionalidade do sistema.
Como ocorreu, por ocasião dos debates e aprovação do Código de Processo Civil, atualmente em vigor, e observadas as devidas proporções, a “Emenda à Constituição da Reforma Tributária” deverá ter influências sem necessariamente um rigor técnico, cabendo ao advogado perante o Poder Judiciário garantir sua melhor aplicação.
O apoio da GAFAM (acrônimo de Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft), segundo ofício entregue ao Presidente da Câmara dos Deputados, deverá impulsionar ainda mais a instituição do Imposto de Bens e Serviços – IBS, pois a DIVISÃO do ICMS e ISS tem obstaculizado as suas atividades no território brasileiro.
O Ministro Marco Aurélio fez afirmação paradigmática no Recurso Extraordinário n. 606.107, tendo restado fixado até não incidir o PIS e a COFINS na transferência a terceiros dos créditos de ICMS (mantidos na exportação): “…(deveria o contribuinte) ir ao guichê do Estado e receber o crédito (acumulado da exportação)”.
Logo cabe disseminar o aproveitamento e transferência do crédito acumulado na exportação, relativamente ao ICMS.
Preliminarmente, destaca-se que, nos tributos federais, existe a sistemática do Reintegra em que a União faz uma estimativa de quanto repassa de IPI, PIS e COFINS ao exportador, por se tratar de medida puramente discricionária e sem racionalidade, tem sido objeto de questionamentos nos tribunais superiores, pois trata o aproveitamento do crédito acumulado na exportação como um favor.
De uma maneira geral a utilização do crédito acumulado é tratada como um favor ao exportador, deixando para trás a importância disso na inserção brasileira no comércio internacional.
A disciplina atual do ICMS consiste no seguinte:
Em virtude das exportações realizadas e da manutenção do crédito do imposto cobrado nas operações anteriores, a exportadora é autorizada a aproveitar o crédito acumulado, segundo a garantia estabelecida pela alínea “a”, inciso X, parágrafo 2o do artigo 155 da Constituição da República Federativa do Brasil.
Afinal sem o aproveitamento do crédito é inócuo o direito à manutenção do crédito nas exportações o que, além de ofender o princípio da não cumulatividade, previsto no inciso I, parágrafo 2º do artigo 155 da Constituição da República Federativa do Brasil, e o direito de propriedade da Impetrante-Transmitente, constante no “caput” do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, bem como acaba por mediatamente tributar a exportação e prejudicar a inserção do Brasil no mercado externo, ao fazer tábula rasa da imunidade do ICMS na exportação acima referida.
Por sua vez, o inciso II do parágrafo 1o do artigo 25 da lei complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996, na qualidade de norma geral do ICMS, assegura a transferência do saldo do crédito acumulado para outros contribuintes no Estado, mediante documento da autoridade competente que reconheça o crédito.
Segundo já pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça basta o reconhecimento do crédito para haver a transferência e os Estados limitam isto, condicionando a utilização do ICMS para determinados fins e dependendo da disciplina do Estado federado o contribuinte deve levar o tema ao Poder Judiciário seja por mandado de segurança, ação declaratória ou, dependendo do que ocorrer no processo legislativo da emenda à Constituição da Reforma Tributária, restituição do crédito acumulado.
A crise fiscal dos Estados federados pode suscitar a hipótese da não restituição do crédito acumulado do ICMS e isto se encontra fora de cogitação dado que, em caso de ação judicial de restituição pode gerar um precatório ou segundo já destacado título da dívida pública “da reforma tributária”, ambos os títulos têm liquidez e deságio variáveis no mercado de “distressed assets”.
Existem fundos, administrados por instituições financeiras, que aplicam bilhões na aquisição destes títulos. O precatório e o título da dívida pública dos Estados, segundo o proposto na Comissão de Constituição e Justiça do Senado relativamente à PEC n. 110/19, constituem tais títulos que geram portfólios de créditos que podem ser precificados de diferentes maneiras segundo estimativa de realização líquida, além de serem aptos a negociação no mercado secundário.
A travessia para o IBS deve ser de cinco a dez anos. Neste ínterim os exportadores têm um valioso ativo consistente em créditos acumulados de ICMS, em razão das mercadorias e serviços aplicados nas mercadorias exportadas e várias alternativas. O mandado de segurança para liberar JÁ o crédito acumulado garante maior remuneração.
Publicado originalmente em Conversando com o Professor
*Fábio Pugliesi é advogado em São Paulo e Santa Catarina. Membro do Instituto dos Advogados do Estado de Santa Catarina (IASC). Doutor em Direito, Estado e Sociedade (UFSC), Mestre em Direito Financeiro e Econômico (USP), Especializado em Administração (FGV-SP), autor do livro “Contribuinte e Administração Tributária na Globalização” (Juruá) e professor em cursos de graduação e pós-graduação. Colaborador do Ambiente Legal.
Fonte: O próprio autor – Blog Direito Financeiro e Tributário
Publicação Ambiente Legal, 24/08/2020
Edição: Ana A. Alencar