Por Paulo de Tarso Siqueira Abrão*
Antônio Fernando Pinheiro Pedro está muito longe de ser o negacionista pintado na mídia depois de dizer que o planeta se salva sozinho do aquecimento. Sem entrar o mérito da declaração, acho relevante situá-la em sua trajetória política.
Conheci o ex-secretário-executivo de Mudanças Climáticas da cidade de São Paulo na década de 1990, quando eu era membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB de São Paulo, que ele presidia.
Assinamos a petição inicial da Ação Civil Pública movida pela OAB/SP contra o rodízio estadual de veículos, implantado no governo Mário Covas. Uma das razões expostas era a de que não havia uma metodologia, um estudo que parametrizasse a necessidade de um rodízio naqueles moldes, além das razões jurídicas ali apontadas.
Nossa convivência como advogados ambientalistas não resultava (e nunca resultou) em concordância política. Nossas abordagens ou modo das falas são diversos, mas com pontos de proximidade que podem e devem ser instrumentalizados nas políticas sociais ambientais implantadas com a participação das populações para as quais são endereçadas.
Por essa razão, trabalhamos juntos considerando objetivos comuns relativos à preservação ambiental e à qualificação dos agentes públicos e privados. Na época, tais intervenções eram vistam como uma “categoria inferior” do Direito pelas clássicas visões, ainda individualistas, impostas pelos códigos civil e de processo civil. O passar dos anos, com a atuação dele e de um grupo que se reunia na OAB/SP, mostrou o contrário.
Trago essas informações para dizer que, em que pesem nossas diferenças quanto às intervenções políticas do Estado, nunca o vi como um negacionista, uma palavra da moda, genérica, que não leva em conta gênero, poder hegemônico ou de grupos identitários (sempre é bom reler “Por que a guerra”, de Freud).
Estive no Fórum sobre Mudanças Climáticas, no qual o posicionamento de Pinheiro Pedro gerou intervenções despropositadas da mesa de trabalhos e, ao que me parecem, com um objetivo determinado.
Não vou discutir as alegações, às vezes violentas, de integrantes da mesa quanto aos protocolos de apresentação que, em geral, não eram obedecidos, mesmo porque o local para essa discussão adquire um invólucro de epistemologia e hermenêutica jurídicas que este texto não alcança.
Em mais de 20 anos de convivência, estivemos com frequência na mesma trincheira. Debatemos a educação ambiental nas escolas no Ministério da Educação de Fernando Henrique Cardoso. Participamos de encontros nacionais e internacionais, representando a OAB/SP. Fomos professores no Núcleo de Informações em Saúde Ambiental (Nisam/USP).
Não poderia faltar menção, neste breve depoimento, ao fato de que Pinheiro Pedro foi um dos aglutinadores das discussões da lei 9.605/98, conhecida como Lei de Crimes Ambientais.
Por fim, como representante que sou da OAB/SP junto à Secretaria Executiva de Mudanças Climáticas, afirmo, sem medo de errar, que membros da sociedade que se reúnem no Comitê Gestor do Programa de Acompanhamento da Substituição de Frota por Alternativas mais Limpas (Comfrota) e no Comitê Municipal de Mudanças do Clima e Ecoeconomia (CMMCE) são originários de universidades, indústria, comércio, serviços, e têm contribuído para uma discussão, com ação efetiva da Secretaria, na melhoria das condições climáticas.
Depois de tantos debates e conversas, em que Pinheiro Pedro sempre demonstrou honestidade intelectual, posso afirmar que o ex-secretário, além de não se encaixar no perfil de negacionista, sempre primou, ao defender seus posicionamentos, por expor divergências de maneira republicana e democrática.
*Paulo de Tarso Siqueira Abrão – Mestre em Direitos Fundamentais. Professor no Curso de Graduação em Direito da FACAMP, Campinas, SP, nas disciplinas Direito Ambiental, Crimes Ambientais e Contra a Ordem Econômica. Membro titular da Comissão Permanente do Meio Ambiente da OAB/SP. Representante titular da OAB/SP junto ao Comitê Municipal de Mudança do Clima e Ecoeconomia – CMMCE.
Publicado originalmente em Folha de São Paulo.
Fonte: O autor
Publicação Ambiente Legal, 23/07/2023
Edição: Ana Alves Alencar
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