Em vez de só focar esforços para concorrer pelo mercado consumidor, companhias devem se unir para solucionar também questões ambientais e contribuir ativamente para a mitigação das mudanças climáticas
Por Carlos Abras*
O best seller internacional “A Estratégia do Oceano Azul”, de W. Chan Kim e Renée Mauborgne (2005), destacou-se por apresentar uma nova abordagem às estratégias de negócios. Nela, gestores são orientados pela inovação e pela busca de novos mercados, livres de concorrentes, para, assim, obterem vantagem competitiva. Essa era a proposta ao invés de seguir num “oceano vermelho”, que se tratava do caminho tradicional caracterizado por um mercado saturado e de intensas batalhas.
Em tempos complicados como o que estamos vivendo, penso que seja o momento de navegarmos por um “oceano verde”, a partir da metáfora ambiental. Os problemas e as soluções econômicas, sociais e ambientais de dimensões globais não serão passíveis de serem compreendidos e solucionados isoladamente por estarem naturalmente interligados e serem interdependentes. O mesmo ocorre na natureza. Significa que, para superar essa crise de percepção existente, em vez de atuarem contra ou livre da concorrência, as empresas devem compartilhar o que possuem de melhor para solucionarem questões que já são realidade em seu ambiente de negócios e em nossas vidas, como a escassez dos recursos naturais e o impacto do clima.
De fato, a pandemia moldou um retrato no qual estamos todos inseridos e nos convoca para uma revisão dos modelos de exploração, de produção e de consumo. Sabemos que a jornada não é fácil, mas é viável. Soluções e recursos existem e podem ser disponibilizados para evitar novas pandemias e desastres provocados pelo aquecimento global. Seja no “oceano vermelho” ou azul, a onda climática nos levará para o mesmo lugar. E a melhor e mais complexa tecnologia já existente para mitigar e sequestrar os gases de efeito estufa da atmosfera, que incorpora uma ciência simples e aceita empresas de todos os setores, portes e níveis de concorrência, são as árvores.
Esse movimento é necessário e não se trata de caridade nem filantropia, mas de tomarmos a decisão certa. O meio ambiente precisa estar no epicentro das tomadas de decisões. Sem os serviços ambientais que nos permitem viver e prosperar, nosso futuro estará comprometido. Os biomas brasileiros pedem socorro. Na Mata Atlântica, casa comum de mais de 145 milhões de brasileiros, entre 2018 e 2019 houve um aumento de 27,2% no índice de desmatamento, segundo o Atlas da Mata Atlântica, iniciativa que a Fundação SOS Mata Atlântica desenvolveu em parceria com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Mas, nesse contexto, qual vem sendo o papel das empresas em relação à preservação ambiental? Muito se fala da importância do meio ambiente, principalmente, para que a sociedade evite novas pandemias, mortes e paralisação econômica do mundo. Nesse tempo, quantas empresas aproveitaram o momento para reforçar seus compromissos com a agenda ambiental? Se o meio ambiente equilibrado é uma das principais saídas contra futuras crises, como a própria OMS (Organização Mundial da Saúde) já afirmou, é preciso fazer mais e melhor. A nossa realidade exige um compromisso de longo prazo e ininterrupto.
Na Fundação SOS Mata Atlântica, temos exemplos inspiradores de muitos parceiros que reafirmaram seu compromisso nesses tempos difíceis. Outras marcas chegaram e nos inspiram para continuarmos firmes e fortes na missão de conservação deste que é o bioma mais ameaçado do país com 12,4% de remanescentes. São empresas em seus vários estágios da gestão para a sustentabilidade; de uma multiplicidade incrível de setores produtivos e de porte. Sabemos que as prioridades mudaram e a sociedade está pensando no que realmente faz sentido. E os consumidores, da outra ponta da cadeia de valor, estarão com as marcas em que confiam para passar pela crise.
Evidências existem e influenciam positivamente o processo de decisão das empresas em incluir o capital natural em suas estratégias de negócios. Há o estudo lançado pela revista Nature que aponta a Mata Atlântica entre os biomas prioritários para a restauração no mundo. A pesquisa mostra que a restauração de 30% das áreas prioritárias do planeta evitaria a extinção de 71% das espécies ameaçadas, sequestraria 49% do aumento total de carbono na atmosfera desde a revolução industrial e reduziria 41% dos custos. Destaque, também, para a Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas) que declarou o período de 2021 a 2030 como a década para a restauração de ecossistemas.
Será muito difícil superar a crise atual e também as perdas ambientais que podem ser irreparáveis se não agirmos agora. Não precisamos ser disruptivos e complexos. Conservar a natureza é simples e depende da vontade de cada um em fazer o que é certo. Existe um custo ambiental para produzir nesse planeta e devolver a ele parte das receitas é uma atitude ética.
Portanto, evidenciar nosso compromisso com a preservação do meio ambiente é um dever cívico. Não estamos sozinhos e os problemas ambientais que também são globais precisam de soluções coletivas. Estejamos e continuemos juntos nessa jornada e esperemos que essa onda nos aproxime, cada vez mais, de um “oceano verde” repleto de belezas naturais e abundâncias dos serviços que são essenciais para a vida no planeta.
*Carlos Abras é coordenador de negócios e mobilização de recursos da Fundação SOS Mata Atlântica.
Artigo publicado originalmente no Nexo Jornal em 28/01/2021
Fonte: SOSMA
Publicação Ambiente Legal, 30/03/2021
Edição: Ana A. Alencar
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