Agora não se pode mais dar beijinhos na face nas reuniões de escritório, comer carne às segundas e nem fazer trilha de bicicleta no parque…
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
Nossa democracia está se desfazendo sob a ditadura da caneta “politicamente correta”, manipulada por gente problemática. Esse risco de desfazimento das garantias da cidadania parece ser maior e mais extenso do que parece.
“Iluminados” decidem que a bisteca constitui infração administrativa, punida com multa, no primeiro dia útil da semana. Especialistas em “compliance” proibem beijinhos no rosto no local de trabalho, pois pode revelar “assédio” e “desrespeito à figura feminina”. Autoridades plenas de certeza e nenhuma dúvida resolvem proibir passeios de bicicleta em parques, por achar que a felicidade do contato humano com a natureza é nociva… à natureza.
Os conflitos jurídico-institucionais, no entanto, desbordaram para o campo da psicologia. Em verdade, normas legais e comportamentais “politicamente corretas”, parecem surgir em função da inconfessável necessidade que muitos têm… de interferir na vida alheia.
É o ápice do regime político comandado por “gente com problema”.
Quando gente com problema… era apenas gente com problema.
Triste modernidade…
Quando eu era jovem, gente extremamente arrogante ou excessivamente humilde, muito agressiva ou muito covarde, ostensivamente lasciva ou puritana, invejosa ou soberba, exageradamente introvertida ou extrovertida, intrometida ou dona da verdade, era sempre vista com reserva. Tratava-se, como diziam os mais sábios de então, de “gente com problema”.
Havia também aquela gente que trazia na testa a marca de presunçosa, idiota, “afetada”, desonesta, rancorosa ou inconveniente. Éramos então, orientados pelos mais sábios a sempre a tratar com os tipos educadamente, sem, no entanto, “nos deixarmos envolver”…
O mundo daquela época era cordial. Não era de bom tom discriminar ostensivamente, muito menos ser deseducado mas… “gente com problema devia ser observada com o devido cuidado”.
Cautela e caldo de galinha nunca foram sinal de preconceito.
Na literatura, nos divertíamos com a mediocridade e a vulgaridade pedante do “Conselheiro Acácio”, no romance “Primo Basílio”, de Eça de Queiroz. Sentíamos náusea de Vilefort – o procurador covarde que traiu a confiança de Edmond Dantés, na trama “O Conde de Montecristo”, de Alexandre Dumas. Tinhamos raiva do ativismo justiceiro do inspetor Javert, na grande obra “Os Miseráveis”, de Victor Hugo. Sabíamos que Pateta, era mesmo pateta, em suas trapalhadas com Mikey, nos quadrinhos, e compreendíamos perfeitamente as sandices do Capitão Haddock, o alcóolatra neurastênico de alma limpa, amigo de Tintin.
Não era crime conhecer a natureza humana.
O advento da mediocridade
Mas os tempos mudaram. Na escalada da injustiça apocalíptica, bíblicamente prevista, a vida tornou-se chata e judicializada.
Não basta, agora, ignorar. É preciso adular e promover o problemático.
A excessiva tolerância à diversidade, imposta pela Constituição de 1988, proibiu a cautela (e parece agora proibir o próprio caldo de galinha) – permitiu aos esquisitos, complexados, corruptos, e idiotas, os mais diversos, de todos os gêneros, galgarem cargos expressivos na estrutura do Estado brasileiro.
De fato, hoje, os imbecis ganharam destaque em nossa sociedade.
O nerdismo, o idiotismo, a mediocridade, o rancor e a covardia, tornaram-se forças hegemônicas.
“Gente com problema”, hoje ocupa cargos concursados, galga nomeações em assessoria a outros idiotas bem postados, aparelha a mídia idiotizada e…principalmente, toma conta dos partidos políticos e canaliza votos de outros idiotas.
Nelson Rodrigues já havia identificado esse fenômeno. Segundo ele, quando os idiotas, em dado momento, perceberam-se maioria, perderam a vergonha. Trataram de se candidatar a cargos públicos, obter mandatos populares e exercer funções executivas em grandes empresas.
Felizmente (para ele), Nelson Rodrigues faleceu sem ter o desprazer (que hoje temos), de testemunhar a complexa construção da doutrina do “politicamente correto”, pelas supremas idiotias…
A supremacia dos idiotas
No Brasil, triste verdade, somos hoje tutelados por “gente com problema”.
Não é raro toparmos com complexados, rancorosos, hipócritas e psicopatas perigosos, postados em várias posições de comando nos poderes da República. Esses tipos passaram a ocupar cargos na administração pública e privada, e hoje redigem bobagens nas redações, formulam denúncias e excretam “regras” na jusburocracia nacional.
Essa cadeia da mediocridade afeta o tecido social e a estrutura do Estado. Atinge o balcão do cartório, o juízo da comarca, o centro acadêmico, a programação da TV. Também transforma universidades públicas em fábrica de militontos, institui a Ditadura da Caneta na burocracia de Estado, prestigia a delação e despreza a verdade.
Essa idiotia gera, também, intransponíveis paradoxos.
Não por outro motivo, pretextando combater o racismo, “comissões raciais” são criadas nos melhores moldes fascistas – para verificar lombrosianamente se um ser humano “é mesmo negróide” – visando ocupar cotas afrodescendentes na universidade que “não discrimina”(?). Há inclusive manifestações de militontos, em favor desse tipo de “operação etnográfica”, acompanhadas de faixas desfraldadas por orgulhosos ativistas com frases do tipo “mestiçagem é genocídio” (????).
Outro exemplo é de transviados, que confundem patologia sexual com sexualidade e substituem sexualidade por gênero. Com isso, pervertidos terminam por resgatar o antigo preconceito puritano-fascista, que afirmava que o homossexualismo ocorria por arbítrio próprio e não por determinação bio-genética.
No mesmo sentido, feministas promovem repressão sexual similar à das antigas ligas das senhoras católicas, para proibir cumprimentos hetero com beijinhos na face ou mesmo o uso do termo “beijos”, ao final de correspondências entre colegas de escritório, pois entendem que isso pode constituir assédio. Descarregam seu ódio contra o sexo oposto combatendo o fenômeno natural da sexualidade.
Ávidos por usar o rancor sexista em favor de sua atividade burocrática, especialistas em “compliance de formulário” pretendem examinar até as cuecas dos funcionários, buscando “falhas humanas” em quem deveria, segundo eles, se comportar como máquina.
Deformidade de caráter virou regra
Uma vergonha.
Está tudo dominado pela supremacia de tipos problemáticos…
A deformação de valores tornou-se inevitável.
Direitos tradicionais do cidadão, quando exercidos transformam-se em crimes, inteligência passa a ser ameaça, riqueza honesta vira desaforo, delito penal torna-se “atividade marginal reativa” (portanto, respeitável), saúde pública vira desculpa e a justiça reduz-se a mera válvula de escape para tiranetes.
“Gente com problema” decide, corrompe, investiga, acusa, fiscaliza, aplica a norma e faz a lei.
Exemplos dos danos que essa imbecilidade causa ao país, não faltam. Basta ler o diário oficial ou ouvir a “Voz do Brasil” (programa este certamente feito para gente com problema).
De fato se pode haver limites à inteligência humana, parece não haver limites para a mediocridade.
Os sábios estavam certos em avisar: jamais devemos subestimar um imbecil, pois ele sempre se supera…
Recalque, moralismo e sexismo
O mundo anglo saxão sempre foi marcado pela crítica moralista ao comportamento sensual. Não por outro motivo, como num movimento em ondas, europeus e norte-americanos vêem-se às voltas com duros dilemas comportamentais originados da dificuldade em lidar com a sexualidade.
Agora, por exemplo, a moda é resgatar o preconceito sexual eliminando a figura do sexo para substituí-la pela do “gênero”.
Essa moda, graças aos recalcados postados ao sul do equador, também vêm se latinizando.
Típico conflito provocado por gente com problema. É como se a sensualidade fosse riscada do mapa, autorizando-se a escatologia no seu lugar.
A escatologia aqui tratada nada tem de teosófica. O escatológico vinculado ao obsceno é termo criado no século XIX a partir do grego skatós – “excremento”. Nesse sentido, a adoção da escatologia como mecanismo de expressão na ideologia de gênero degrada, não sensualiza.
Basta ver a tal “Arte Queer” – ligada à ideologia de gênero: um poço escatológico de sublimação de problemas (*1).
Mas não basta “chocar a moral burguesa”… É preciso tornar o choque obrigatório.
Tal mudança de comportamento imposto pela ideologia de gênero, segue padrão paradoxalmente puritano, em busca de oficializar o reconhecimento ao diferente, nega-se sexualidade ao relacionamento hetero – e também ao homossexualismo natural. Não há determinação biológica. Tudo é fruto da “escolha”, e esta pode se dar inclusive a quem não possui maturidade para escolher.
Não se trata de liberdade e, sim, de perversão. Em nome de um estreito e conceito de “diversidade”, trata-se de privilegiar o perverso, obrigando todos à sua aceitação.
Esse mecanismo de condução à perversidade não é gratuito. Está íntimamente ligado á busca pela quebra da instituição da família, da eliminação do amor como “sentimento burguês”. Visa a estatização das relações e sentimentos humanos, vinculados à regras policialescas de conduta que vedam a sensualização das relações ao mesmo tempo que obriga todos a tolerar a perversão militante…
O resultado dessa degradação escatológica é conduzir o Estado a invadir a intimidade do cidadão, para coisificá-lo primeiro e, depois, retirar-lhe a sensualidade. Isso, por óbvio, não é natural.
A filósofa estadunidense Judith Butler, uma das porta-vozes dessa praga “politicamente correta”, prega que “o gênero é aprendido”. Para ela, é possível que se aprenda e se ensine relações de gênero – mas não só, também raciais, de classe, de orientação sexual – “com base na igualdade”.
Essa tolerância à escatologia, seguida pela culpa por expressar heterosexualidade, deve, segundo os teóricos da ideologia de gênero, ser adquirida e ensinada na escola e introduzida como forma de policiar o comportamento em família, tudo sob profundo comprometimento do Estado.
A dessensualização da sociedade em prol da escatologia pressupõe repressão ao comportamento sensual – do elogio ao beijo no rosto.
Essa a razão de hoje, o controle do comportamento social passar por “não desqualificar ou banalizar qualquer denúncia de constrangimento sofrido por assédio no espaço público”…(*2)
A sutileza dessa banalização escatológica é ainda mais perversa. Enão se trata de um fenômeno tupiniquim, está internacionalizado.
Todo desejo é proibido, menos a perversão
Multiplicaram-se denúncias de “assédio sexual” “no passado”. Ou seja, como o antigo macartismo fazia ao denunciar o passado comunista de políticos, artistas e intelectuais, agora a onda é escolher ícones corporativos e referências culturais, expô-los a denúncias unilaterais, jogá-los no opróbrio juntamente com sua obra e queimá-los na fogueira das múltiplas vaidades.
Importante ressaltar: pouco importa se a denúncia é justa. De uma forma ou outra, o que importa é a notória maledicência, que no fundo visa vincular a denúncia do assédio à repressão da sexualidade na atividade cultural.
Na visão dos ideólogos de gênero, a explosão das denúncias de assédio e pela crescente “afirmação feminina”, não representa um resgate da justiça, um impulso à transformação radical dos códigos de conduta entre os sexos.
É uma forma idiota de dizer que a banana… finalmente virou banana.
Como num lapso coletivo de memória, a revolução sexual enfrentada nos últimos cinquenta anos, simplesmente inexistiu.
O ser humano tornou a ser um ser “hiposuficiente”, vítima de predadores sexuais. A cada denúncia (ainda que justa) de um assédio, esconde-se a negação da sexualidade. Quando o assunto é atração entre sexos opostos, então, a criminalização de condutas atinge o climax da contradição. A sensualidade está desmoronando nas mãos de gente recalcada, que pretende, de novo, transformar o espaço público e privado em convento.
Nesse clima repressivo, o altar da liberdade sexual e autodeterminação só será tolerado se for escatológico, transviado e expressamente desconectado de sensualidade ou interesses heterossexuais…
Na edição de início de janeiro de 2018 da Revista Veja (*3), uma matéria absurda, lotada de conceitos e opiniões rasteiras, que merecem uma análise psicanalítica, afirma que os tempos atuais são confusos para “homens criados no tempo em que era aceitável virar a cabeça diante da passagem de um derrière feminino”
Completa a matéria:
“Mas, ei, isso também não pode mais? Não, senhores, não pode. O mundo não apenas mudou — mudou rapidamente. Daí o fato de muitos homens reagirem com perplexidade aos olhares de repreensão provocados por algo que eles sempre fizeram e que ninguém antes lhes havia dito que não podiam fazer.”
Ou seja, se interessar pelo corpo do sexo oposto, um instinto herdado ao longo da evolução da humanidade, agora é crime. Beijar na face da colega de trabalho, ou abrir a porta para uma senhora então… nem pensar.
Afinal, o que foi feito da sexualidade liberta após séculos de repressão? Foi recolhida aos manuais corporativos?
Claro que a legislação de combate ao assédio moral e sexual vem se aperfeiçoando ao longo dos tempos, e a igualdade de sexos no local de trabalho, hoje, é uma realidade.
Mas a “gente com problema” não se ocupa disso. Importanto verificar a sutileza do atual combate aos padrões comportamentais. O que visam os idiotas é eliminar a possibilidade da sensualização, reprimir o contato físico e a possibilidade da expressão emocional.
Há uma “novilíngua” em construção, sob o pretexto de redesenhar o padrão comportamental masculino. E a preocupação é desvirilizar o homem e tornar a mulher asceta.
Algo precisa ser feito, antes que o padrão “orwelliano” de comportamento proiba o amor hetero, tal qual no romance 1984…
Ditadura alimentar, ditadura comportamental…
Virado à paulista afeta o clima do planeta
Por isso, não surpreende, por exemplo, que Deputados estaduais tenham aprovado e pretendido tornar lei a chamada “Segunda sem Carne” no Estado de São Paulo.
No parlamento paulista, até mesmo políticos inteligentes encontram-se envolvidos na névoa da idiotia institucional – difícil de evitar. Se sancionado o projeto pelo governador Geraldo Alckmin, o cidadão paulista ficaria privado de consumir proteína animal às segundas feiras e seria proibido o fornecimento de carne em bares, restaurantes e refeitórios de órgãos públicos, todo primeiro dia útil da semana.
Está aí um exemplo gritante do fenômeno tratado neste artigo. Um primor de inconstitucionalidade passou a ser constitucionalmente justificado por operadores do direito “bem intencionados”, aparentemente preocupados com a saúde alimentar do cidadão paulista… e com o clima do planeta.
A medida, disseram ( e dizem) os pressurosos deputados neo-naturebas, veio sustentada por estudos médicos, econômicos e climáticos – relacionados ao papel da proteína animal no organismo humano, no manejo da pecuária, nos impactos da flatulência e da aerofagia na atmosfera e no clima.
O instinto de imitação, herdado dos símios, de “copiar” padrões da “Europa-Maravilha”, com o apoio de celebridades do mundo Pop e comedores de sucrilhos (orgânicos), com certeza integrou o cardápio lotado de ingredientes ecológicos e vegetarianos.
Lideranças importantes do mundo ambientalista surgiram para apoiar a lei “vegano por um dia” – incluso parlamentares com currículo respeitável nesse campo, próceres de uma convicção que remete à educação alimentar e ao convencimento político – JAMAIS, porém, á imposição legal.
Todo esse discurso pretensamente natureba e fortemente paternalista, contudo, não condiz com a garantia democrática da autonomia privada do cidadão, cada vez mais limitada pelo Estado no Brasil.
Impor uma mudança de habito alimentar e interferir no mercado de alimentação e abastecimento – por meio de uma “lei de calendário”, configura inaceitável invasibilidade. Desequilibra o pluralismo democrático e fere o conceito de “bem comum”.
Do ponto de vista jurídico, a medida é um desastre conceitual. Na relação material de custo-benefício, o “interesse público” em causa não resiste à notória assimetria do conflito de natureza conceitual e difusa em causa. Vale dizer: o entendimento de “interesse público” sobre os interesses da cada um, no campo das assimetrias envolvendo interesses difusos – intrinsecamente conflituosos – é igualmente difuso e intrinsecamente conflituoso.
Tendo por parâmetro o Estado Democrático de Direito e o direito á dignidade e às escolhas privadas (incluso as alimentares), o marco legal votado pelo parlamento paulista, não passa de entulho autoritário – imposição de grupos ideologicamente vocacionados que pretendem exercer o monopólio da virtude ambiental, ditando normas de conduta aos outros (no caso, á população paulista).
Todo cuidado é pouco quando se trata de delimitar autonomias e adicionar na grade de restrições legais, convicções plenas de invasibilidade que irão interferir no cardápio de restaurantes, no regime alimentar de funcionários públicos e na alimentação de crianças em idade escolar.
Choca, outrossim, constatar que essa norma estrambólica foi editada pela mesma assembleia legislativa que, não faz muito tempo, transformou em circo a CPI da Merenda Escolar – um crime de corrupção inaceitável que afetou a alimentação de milhões de crianças. Agora, pelo visto, o parlamento paulista resolveu vestir o cidadão com uma tanga de crochê e colocá-lo no centro do picadeiro, sem direito a picadinho (às segundas, bem entendido…).
Para essa “gente com problema” devemos mesmo ser hiposuficientes – uma gentalha que clama para ser cuidada por agentes públicos tão bem intencionados quanto incompetentes.
Não é novidade. Já foi assim com o desarmamento civil, com os juros bancários, com a burocracia cotidiana, com os serviços de saúde, o transporte público, o fisco, as normas de trânsito, etc…
Portanto, no caso da “Segunda Sem Carne”, pouco importa o hábito alimentar ou a escolha do cidadão. Algum imbecil, doravante, cuidará disso para todos nós… incluindo nossos irmãos que não comem carne também nos outros dias da semana, porque não têm dinheiro para comprar.
E pensar que o governador titubiou ao vetar a obra prima dessa gente problemática. Afinal, os idiotas votam…
Bicicleta no Parque não pode…”porque não quero e pronto”.
O desembargador Lédio Rosa de Andrade, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, denunciou o ativismo ideológico do Judiciário, alertando para o risco das boas intenções carregadas de convicção, travestirem, na verdade, pura idiossincrasia.
Disse o desembargador que o risco é ainda maior em uma decisão “travestida de justiça, como se estivesse fazendo o bem e não o mal, razão pela qual leva mais tempo para cair a ficha da maioria da população”, ao que ele acrescentou: “Está travestida de bondade quando, na verdade, é pura maldade”.(*4)
É o que não raro ocorre quando problemas e orientações ideológicas pessoais são sublimados em verdadeiras “cruzadas” na defesa do ecologismo de ocasião.
No final de 2017, no intuito de consolidar o uso das bicicletas como meio sustentável de locomoção, e promover o contato dos ciclismo com a natureza, uma empresa multinacional de eventos resolveu trazer ao Brasil uma etapa do circuito internacional de “moutain bike”, realizando a disputa em uma trilha no trecho permitido do Parque do Ipiranga, na Zona Sul da cidade de São Paulo.
Para tanto, trouxe para o Brasil um feira internacional de ciclismo, contratou técnicos especializados em meio ambiente, buscou as autorizações necessárias junto às autoridades ambientais paulistas e utilizou da tecnologia para transmitir toda a corrida por circuito de televisão – evitando que o público ocupasse a área no entorno das trilhas na floresta.
Firmou a empresa, ainda, um contrato com o Jardim Botânico paulista, a maior autoridade em restauração florestal do Brasil, e tutor do parque e da trilha, tratando, também, de realizar a compensação de emissões de todo o evento.
Seria tudo uma alegria se, às vésperas do evento, o Ministério Pùblico não resolvesse “impedir” a disputa, promovendo ação judicial sob a alegação que ciclismo e preservação ambiental de unidade de conservação não combinam…
A ação foi proposta horas antes da abertura da feira e na véspera do uso da trilha, obtendo liminar, rapidamente propagandeada por ativistas ávidos por bancarem os “heróis da negatividade” (outra definição clássica de Nelson Rodrigues).
A maldade estava na ação cronológica. O órgão ministerial, havia meses, já coletara laudos, informações e análises das entidades públicas aprovando o evento. Como tudo aprovava, a zelosa autoridade resolveu firmar sua convicção desaprovadora usando um único laudo técnico, da lavra de um assessor específico que faz da campanha contra o uso de parques por seres humanos o seu cavalo de batalha. Um biocentrista convicto…
Não fosse pela ação rápida do Tribunal de Justiça Paulista, derrubando o embargo imposto pela instância inferior, o evento não teria ocorrido, para desgraça da imagem do país perante o ciclismo mundial, e para desgaste maior da já péssima administração nacional do ecoturismo.
O detalhe sórdido é que o ICMBio – a agência nacional de controle das unidades de conservação do Brasil, propagandeia o uso controlado das unidades para o turismo de bicicletas, e o estado de São Paulo clama, diariamente, por eventos esportivos e turísticos que produzam receita para seus parques e estimulem a frequência dos turistas. Ademais, o ciclismo de montanha e trilhas é o esporte ecológico por definição, e sempre promoveu, em todo o mundo, a defesa do ambiente.
Ou seja, o que é prática no resto do mundo, por aqui é objeto de condenação por quem, seguramente, não usa bicicleta e não quer outros usem, não gosta de humanos em parques e não deixa que gente se divirta porque não quer… e pronto.
Gente com problema afeta a República
Tolerar o diferente não pode significar acatar como regra para si, a diferença representada pelo outro.
Confundir hipossuficiências, rancores sociais, complexos de inferioridade, sexofobias, racialismos, biocentirsmos fascistas e recalques sexistas como padrões determinantes de alguma correção comportamental, é problematizar o senso comum e transviar o tecido social.
Afinal, o que seria um “bem comum”, ou na visão de Rousseau, uma “vontade geral” que justificaria tamanha interferência do Poder Público na livre iniciativa, na livre escolha e no senso comum do cidadão?
Com certeza, o “bem comum” não está na convicção de grupos de pressão “bem intencionados” em busca de um maior “equilíbrio ambiental” no planeta… proibindo o consumo de carne “dos outros”, às segundas feiras… Muito menos se encontra na malediscência, ou no juízo pervertido de quem só enxerga coisas tortas em julgar uma troca de beijinhos no rosto no local de trabalho como “assédio” ou “redução da figura da mulher no ambiente corporativo”. Há limites para a idiotice.
Esopo já preconizava que todo tirano exerce sua tirania buscando pretextos justos. O psicanalista Jorge Forbes também já ponderou que normas proibitivas de hábitos individuais geralmente decorrem da necessidade que muitos têm… de interferir na vida de outros. Vale dizer, leis como a da “segunda sem carne”, fazem a festa dos que “têm problema”.
Portanto, ante o estado de coisas que vivemos hoje no Brasil, ao abrir o jornal, ler o diário oficial ou ouvir a poluição mental dos especialistas em generalidades na mídia, só podemos entender que a sociopatia deixou de ser um problema, porque virou regra.
Diria Freud, se estivesse vivo: “sintomático”…
Freud, hoje, seria com certeza processado pelos idiotas.
Notas:
*1 – Pedro, Antonio Fernando Pinheiro – “Ideologia de Gênero é o Gênero da Farsa Criminosa”, in The Eagle View – Blog, in http://www.theeagleview.com.br/2017/09/a-ideologia-de-genero-e-o-genero-da.html, visto em 30/12/2017
*2 – https://www.uai.com.br/app/noticia/saude/2013/09/19/noticias-saude,193830/quando-o-assedio-sexual-vira-caso-de-policia-mulheres-coitadinhas-ou.shtml, visto em 30/12/2017
*3 – https://veja.abril.com.br/revista-veja/nao-senhores-nao-pode-mais/, visto em 5/12/2017
*4 – Belluzzo, Luiz G. – “O X da Questão”, in https://www.cartacapital.com.br/blogs/blog-do-socio/o-201cx201d-da-questao
Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.
Publicado originalmente em The Eagle View