Por Paulo de Bessa Antunes*
Uma característica marcante do Direito Ambiental é a sua forte internacionalização e a influência recíproca entre o Direito interno e o internacional.
Aliás, não é pouco frequente que, em questões internas, haja um grande recurso a normas de direito internacional. Tem sido muito comum que decisões judiciais nacionais “apliquem” normas internacionais a casos nacionais. Em função disso, entendemos necessário que se faça uma brevíssima explanação das principais características do Direito Internacional do Meio Ambiente[DIMA] como forma de contribuir para uma compreensão mais adequada da matéria.
A proteção do meio ambiente é, atualmente, parte da agenda global e, em tal condição, um dos principais temas discutidos nos diferentes fora internacionais; isso permitiu que, no âmbito do DIP, um setor específico começasse a se especializar (REI, 2018). Com efeito, desde 1992, a Organização das Nações Unidas [ONU] realizou diversas conferências internacionais que tiveram como tema central a discussão e a deliberação sobre questões ambientais. O DIMA é uma das respostas dadas pela comunidade internacional à deterioração dos recursos ambientais em escala planetária. É resposta jurídica, originada na compreensão comum dos sujeitos de Direito Internacional no sentido de que somente uma ação uniforme e articulada entre os diversos atores internacionais é capaz de solucionar problemas que ultrapassam a fronteira de um único Estado.
O DIMA surgiu no século XX, assim como a questão ambiental. É fato que, no passado, existiram alguns acordos internacionais sobre problemas comuns que afetavam os seus recursos naturais. Entretanto, foi somente no século passado que a preocupação se tornou mais eloquente e visível no cenário internacional.
Todavia, deve ser observado que o interesse com a proteção do meio ambiente surge, inicialmente, no âmbito interno de cada país e, daí, se propaga para a arena internacional. Uma condição essencial para que o DIMA se desenvolva é a existência de instituições internacionais estáveis que expressem, no mínimo, o desejo de cooperação entre os Estados, pois não é concebível o tratamento de problemas multilaterais, sem instituições que os articulem de forma pacífica e cooperativa. O tema meio ambiente e o direito que sobre ele incide têm vocação universal (MORAND- EVILLER, 2010, p. 6) e, como tais, precisam ser abordados de forma que envolva a comunidade internacional e os diversos mecanismos por ela criados.
O DIMA pode ser definido como o conjunto de regras (cogentes ou não), princípios e práticas internacionais que criam obrigações e direitos relativos à proteção do meio ambiente, da natureza e dos recursos naturais no âmbito da comunidade internacional. Nele, estão incluídas as matérias que, simultaneamente, são de interesse de múltiplos Estados, tais como as poluições transfronteiras, os recursos do mar, as mudanças climáticas globais e a proteção da diversidade biológica, bem como matérias de interesse regional, e.g., a proteção de um determinado rio internacional ou de florestas que se espalham por mais de um país.
Dentre as características mais marcantes do DIMA, podem ser apontadas (1) a sua juventude (MALJEAN-DUBOIS, 2008), (2) a sua setorização, (3) o seu caráter prospectivo, (4) a modificação do conceito de soberania nacional e a (5) transformação de elementos constitutivos, tais como sistema de fontes e os seus sujeitos. Estes são os elementos que a obra pretende examinar de forma crítica.
Geraldo Eulálio do NASCIMENTO E SILVA (2002) sustenta que a Assembleia Geral das Nações Unidas [AGNU], ao convocar a Conferência do Rio de Janeiro, utilizou a expressão “Direito Ambiental Internacional”, resolvendo o problema relativo à existência de um novo ramo do DIP, quanto à designação; a prática tem preferido utilizar Direito Internacional do Meio Ambiente, adotada nesta obra.
O DIMA é composto pelos tratados, convenções e declarações internacionais relativos à proteção da natureza, sendo muito difícil identificar coerência entre as suas diferentes normas. A harmonização entre todo o conjunto é tarefa dificílima, senão impossível. Dessa forma, é melhor utilizar a noção de setorialização do DIMA, ou seja, que se busque a harmonização entre conjuntos específicos de tratados e convenções internacionais. Igualmente, não se deve desconsiderar as profundas relações entre o DIMA e o Direito Internacional dos Direitos Humanos e, também, com o Direito Internacional Econômico, haja vista a grande interpenetração entre eles. Logo, o DIMA é abrangente e não pode ser entendido fora dos contextos econômicos e sociais.
A Declaração de Estocolmo, proclamada em 1972, é uma demonstração eloquente do que se argumenta. Na proclamação, a Conferência afirma que o meio ambiente humano possui dois aspectos, a saber: (1) o natural e o (2) artificial. Ambos são essenciais para que o ser humano desfrute de bem-estar e dos direitos humanos fundamentais e até mesmo da própria vida. Assim, protegê-lo e melhorá-lo é uma questão fundamental que afeta o desenvolvimento econômico de todo o mundo, sendo desejo dos povos e obrigação dos governos.
Francisco REZEK (2002) afirma que o primeiro tratado bilateral comprovadamente existente foi o firmado entre Hatusil III, rei Hitita, e Ramsés II, faraó egípcio. Acredita-se que a paz entre as nações tenha sido firmada entre 1280 e 1272 a.C. Surgido na época das poluições globais, o DIMA, com a inquietação própria dos jovens, necessita romper as barreiras de um modelo jurídico milenar para encontrar a sua afirmação plena.
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*Paulo de Bessa Antunes é Advogado, Professor Associado da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO, foi Procurador Regional da República – Ministério Público Federal por trinta anos. É presidente da União Brasileira dos Advogados Ambientais – UBAA
Fonte: GenJuridico
Publicação Ambiente Legal, 11/01/2021
Edição: Ana A. Alencar
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