Cada homem deve inventar o seu caminho – Otávio fez o dele.
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro*
Otávio foi meu contemporâneo de faculdade.
Juntos, participamos da política estudantil, várias vezes em polos opostos, algumas vezes do mesmo lado, sempre em favor da liberdade e da democracia. Cruzamos nas arcadas do Largo de São Francisco, em cafés, no cinema e na Folha, nas vezes em que fui ao jornal.
Sempre foi circunspecto, absolutamente voltado á administração de suas dúvidas e hesitações. Talvez por isso mesmo tenha infelizmente construído, desde os bancos de faculdade, um círculo de relações de gente dissimulada – coisa que ele nunca foi. Isso impediu que ele tivesse ampliado seu círculo de relações de forma a se permitir libertar da tensa posição defensiva que mantinha em relação ao entorno.
Fino, educadíssimo, raciocínio rápido, Otávio Frias era, no entanto, engajado na luta estudantil pelas liberdades democráticas. No final dos anos 70 e início dos anos 80 pudemos conviver bastante no movimento.
Frias, juntamente com vários outros estudantes, como Luiz Antonio Marrey e Marcos Martins Paulino, organizou um diferenciado movimento pela social-democracia no ambiente político acadêmico, abrindo uma brecha para o debate pluralista em um período de estreitezas filosóficas, bastante polarizado. Seu partido acadêmico, “Transformação”, rachou, de forma que ele aliou-se aos “gauchistes de la realpolitik”, enquanto os “mais democratas que sociais” alinhavam-se à direita, na Mobilização Democrática – algo que ampliou o quociente de inteligência dos quadros acadêmicos da faculdade de direito, no tempo em que a burrice stalinista e trotskista reduzia a inteligência na Universidade de São Paulo.
No campo dos costumes, foi o primeiro estudante a frequentar a faculdade usando calça jeans e blazer – lançando uma moda que, hoje, virou norma…
Ao se formar, voltou-se para o negócio da família, o jornalismo. Assumiu a secretaria do conselho editorial da Folha e, de lá, iniciou um projeto de transformação impressionante. Destruiu o “pacto” firmado entre Folha e Regime Militar, tomando de assalto a redação da Folha da Tarde – então administrada pela “direita”. Ao mesmo tempo iniciou a contratação de colunistas “progressistas”, na Folha de São Paulo, tornando o jornal uma referência e base para o período de alteração do horizonte político paulista e brasileiro.
Assim, a Folha apoiou e noticiou a luta pelas eleições diretas, a implantação da Nova República, a Assembleia Nacional Constituinte e todo o período de ebulição dos anos 90.
Desse período em diante, nos encontramos poucas vezes, e nessas ocasiões, sempre pudemos trocar boas energias. De fato, eu o admirava à distância.
Otávio sempre manteve uma postura discreta. Na verdade, era um típico circunspecto. Ele sempre me lembrou aquela frase do Marquês de Maricá: “Querendo prevenir males de ordinário contingente, o homem prudente vive sempre em tortura, gozando menos do presente do que sofre no futuro.”
Talvez por isso, Otávio Frias tenha sido a exata descrição de Jean Paul Sartre, e assim tenha completado seu ciclo terreno:
“Nasci para satisfazer a grande necessidade que eu tinha de mim mesmo”.
Descanse em paz.
*Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB. Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API, é Editor – Chefe do Portal Ambiente Legal, do Mural Eletrônico DAZIBAO e responsável pelo blog The Eagle View.