Emissões de CO² na atmosfera atingem marca histórica. Há como sair dessa?
Por Vitor Lillo
Maio de 2013 já entrou para a história da humanidade como o mês no qual o planeta entrou em “zona de perigo” com a alta concentração de dióxido de carbono (CO²) que atingiu impressionantes 400 partes por milhão (ppm) na primeira semana do mês.
A marca simbólica foi registrada no dia 9 pelo observatório situado no alto do vulcão Mauna Loa, no Havaí (EUA) e serve como padrão internacional de medição da concentração de gases na atmosfera.
O dado corrobora um cenário alarmante apontado em levantamento de 2012 do Instituto de Energia Renovável da Alemanha (IWR). Segundo a instituição, as emissões mundiais de dióxido de carbono chegaram a 34 bilhões de toneladas em 2011.
Esse número não significa que estamos à beira de um colapso, mas também não deixa de ser preocupante. Afinal, se considerarmos que ao final da II Guerra Mundial (1939-1945) o nível de concentração de gases estava em 280 ppm, essa subida até os 400 ppm no período relativamente curto de 70 anos, é um fato impressionante.
E a conta chegará, cedo ou tarde. De acordo com projeções científicas, é inevitável que a temperatura do planeta se eleve em até 2 graus Celsius, por conta da concentração atual de CO² que já é a maior em 15 milhões de anos. Mas se esse ritmo de emissões de 400 ppm continuar, a temperatura global pode subir em 4 graus Celsius até 2060.
Nesse cenário, o nível dos mares pode subir com o derretimento das geleiras, o regime de chuvas e secas seria alterado afetando a agricultura. O nível de acidez na água aumentará, ameaçando a existência dos recifes de corais, fundamentais para a pesca e a proteção do continente contra furacões, isso só para citar alguns efeitos.
“Tem consequência também para o sistema financeiro, e isso já está acontecendo. Os riscos climáticos começam a ser maiores e, por isso, cobra-se mais caro pelos seguros, e prêmios de risco. Se os preços sobem, os países mais vulneráveis vão ter mais dificuldade de acesso ao crédito”, explica Nino Bottini, diretor técnico da consultoria Neutralize Carbono.
Onde há fumaça…
Enquanto as previsões pessimistas se avolumam, fica a pergunta: de onde vem tanta poluição? O professor de agrometeorologia Hilton Silveira Pinto da Universidade de Campinas (UNICAMP) explica que o homem não é o único responsável. Pelo menos metade do aumento nas emissões de dióxido de carbono vem da própria natureza.
“Você tem mais ou menos uma distribuição equivalente, cerca de 50% do aumento de CO² é de origem natural. Os vulcões, por exemplo, lançam muito gases; o oceano, graças à mudança de temperatura da água também, os mangues são grandes emissores de metano, um gás trinta vezes pior que o carbono”, explica Silveira.
Para o professor e pesquisador, o acúmulo de dióxido de carbono na atmosfera pode ser considerado um fenômeno cíclico, se utilizarmos a história como parâmetro. “Há dois milhões de anos atrás, a terra já teve cerca de 800 ppm de CO². Mas hoje temos habitação, agricultura, essa quantidade atual [de 400 ppm] é muito mais perigosa. Temos que nos preocupar, na verdade, é com o futuro próximo”, afirma Hilton.
Fogo de palha
Um ditado português diz que “em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”. O pensamento serve para ilustrar a falta de consenso em torno de um pacto global para a redução nas emissões de dióxido de carbono. Muitos interesses econômicos em jogo, e o da população mundial fica em segundo plano.
“O ponto mais importante dessa concentração é esse certo fracasso nas negociações internacionais para que se chegasse a isso, o que aconteceu por conta da crise econômica e uma série de razões. Os países se desinteressaram”, opina o consultor Nino Bottini.
“É tarde demais pra fazer alguma coisa. Desde 1992 se fala disso [acordo global para redução de emissão de CO²], e os Estados Unidos e a China assinaram?”, afirma o professor Nivar Gobbi, da Universidade Estadual Paulista (UNESP). Ele é o fundador do Departamento de Ecologia da universidade.
“Tem que ser feito algo? Claro que sim, mas por todos. Isso tudo me parece uma grande máfia. Jogam em cima do Brasil a responsabilidade quanto à questão das queimadas florestais, mas elas não têm o mesmo impacto da produção industrial das grandes potências”, afirma Gobbi.
Já para Bottini, a solução é mais local que global. “O alicerce para se mitigar os efeitos, seria a regulação de cada país, não global, porque se depender dos outros países, fica mais complicado.”
E o Brasil nessa história?
Nosso país tem o verde da floresta e o dos pastos. Já somos o 12º do mundo em emissões de carbono e vivemos um conflito entre preservação ambiental e desenvolvimento econômico. Mas, apesar disso tudo, somos referência quando se fala em cumprimento das metas de economia de emissões.
“O Brasil hoje, no nosso ponto de vista, é certamente o melhor país do mundo em termos de controle. Não só está cumprindo a meta da COP15, como está ultrapassando as metas de economia de emissões [entre 36 e 39% até 2020]. Somos citados como o melhor país em sistema de controle.”, afirma Hilton Silveira Pinto.
O pesquisador fala com propriedade sobre esse assunto. Foi ele quem coordenou um estudo pioneiro inédito sobre Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (ABC). Essa prática, instituída por uma lei federal de 2009, prega a adoção de práticas agrícolas que diminuam a emissão de CO². Como incentivo aos produtores, o Ministério da Agricultura destinará R$ 3,4 bilhões em investimentos ainda neste ano.
Uma das alternativas já postas em prática é o sistema de plantio direto. Nesse sistema, o agricultor não queima mais o resíduo de colheita, mas planta por cima dele, o que causa uma absorção pelo solo de mais de 500 gramas de carbono por hectare. E as soluções não ficam restritas às lavouras.
Hoje no Brasil possui 50 milhões de hectares de pastos abandonados. A recomendação do pesquisador é o replantio da grama. “Isso aumenta o verde na região e também, quando se melhora o pasto, passamos a ter uma maior densidade de gado, por hectare”, explica Silveira.
Do campo para a cidade, o grande desafio – e solução – para o controle de emissões de CO² no Brasil está na área de Energia. 80% da matriz energética do país vem da água, uma fonte renovável. Outras fontes como o vento, o Sol e mesmo a cana de açúcar possuem grande potencial, mas ainda carecem de apoio governamental.
A área industrial é outro setor que apresenta grandes avanços. “No Brasil se caminha para uma produção de baixo carbono. As indústrias estão diminuindo em geral, por meio de otimização dos seus sistemas de consumo de energia e água e utilização de fontes renováveis”, explica Nino Bottini.
Esses exemplos mostram que nem tudo é frustração e medo quando se trata de emissões de dióxido de carbono e o aumento da temperatura no globo. Se faz necessário um maior empenho por parte da comunidade internacional para que bons exemplos como o do Brasil e de outros tantos países não se sejam meros raios de luz entre espessas camadas de prepotência.