Não há maturidade no amor
Somos bebês a chorar na dor
Dos desejos não alimentados
Somos crianças mimadas
Chorando o brinquedo quebrado
Somos adolescentes inconsequentes
Desejando apenas o corpo amado
Somos jovens em chama
Ansiando o momento da cama
Somos adultos inseguros
A viver erguendo muros
Somos velhos de corpos cansados
Com as lembranças dos tempos passados
E vivemos assim
Procurando razão no incompreensível
Sem saber que emoção e desejo não tem idade
Buscamos em vão no amor maturidade
OLHOS DE MAR CINZENTO
E foram teus olhos que me chamaram
Que me mostraram
Mais do que pensaria haver
Foram teus olhos que me arrastaram
Pra dentro de mim mesma
E nesse ver-me
Perdi-me em você
Encontrar-me nos teus olhos
Naufragando nesse mar sombrio
Afogando-me em tuas águas revoltas
Foi como ressuscitar
Num turbilhão de desejos
De emoções desconexas
Perdida num bote à deriva
No mar dos teus olhos cinzentos
Querendo que sejam a lua
Na noite a me perder
Querendo que sejam estrelas
Brilhando no escuro do meu ser
Querendo que sejam o farol
A me guiar ao porto de você
Foram teus olhos que me cantaram
Qual canto das gregas sereias
E neles a me entregar
Meus ouvidos não tapei
E nessa insana viagem
Entre monstros e naves
Anjos e demônios
destemida naveguei
No mar revolto dos teus olhos
Inconstantes e profundos
Minha alma mergulhei
A VIDA
A vida é engraçada
Ela vem e aquece
Depois vai e esquece
Num momento acalma
No outro estremece
A vida é egoísta
Ela faz e acontece
Ela trama e tece
Veste depois se despe
Não ouve
Nem obedece
A vida é uma surpresa
Ela inflama e desaparece
Ela tira e oferece
Entre o assombro
E a prece
Eis que a rebelde fenece
CARTA AOS MEUS FILHOS
Que você sonhe
Os sonhos possíveis
Quanto os impossíveis
Que voe
Mergulhe
Se entregue
À vida
À sua vida
Preserve-a
Invista
Insista nela
Que você chore
De dor
De amor
Ou dor de amor
Quantas vezes houver
Tantas precisar
E sorria
Sempre
Por dentro
E por fora
Seja o seu bastar
Que você caminhe
Curtos ou longos caminhos
Junto ou sózinho
De pedra
Ou pergaminho
Trame seu linho
Plante seu pão
Pise seu vinho
Faça seu ninho
Que você ame
Sem medo
Sem freio
Sem travas
Sem receio
Sem jeito
Do seu jeito
Mas ame
O que desejar
O que buscar
O que conquistar
Sem dó
Nem pena de si
Ame o amar
Que você me chame
Quando quiser
Onde você estiver
Sempre que precisar
Que não me poupe
A tua vida
Nessa vida
Ou além dela
E me busque
Onde eu estiver
É esse meu legado
Certo ou errado
Pra você deixado:
Eu ter vivido
sofrendo
ou sorrindo
Mas ter amado !
Ana Alencar, poeta e pedagoga, é professora da rede municipal de ensino básico de São Paulo, colaboradora do Portal Ambiente Legal