Por Pablo Valente*
Todos nós já fomos, alguma vez em nossas vidas, a lugares que nos despertaram sensações boas e ruins, conforme a disposição do lugar, conforme a disposição dos elementos que compunham o lugar, de suas regras e do ambiente em geral, suas cores e outros detalhes que normalmente passam despercebidos.
Os estudos sobre Psicologia Ambiental dizem respeito a esse e outros temas, ao relacionamento que estabelecemos com os ambientes em que estamos e de que forma essa relação tem o poder de impactar nossas vidas e saúde mental.
São estudos que levam em consideração a forma como o ser humano lida com os espaços aonde se encontra, como se sente neles e quais ações toma para moldar esses lugares ao seu bem estar, ao mesmo tempo em que é moldado por eles. Uma ciência necessária e importante.
Adentremos um pouco mais no universo amplo da Psicologia Ambiental…!
Um pouco sobre a história da Psicologia Ambiental
O surgimento da Psicologia Ambiental enquanto ciência e tema de pesquisa deu-se alguns anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), em decorrência da necessidade existente de que se reconstruíssem as cidades europeias devastadas pela guerra levando em consideração o estado psicológico das pessoas.
Nesse contexto, arquitetos e pesquisadores da psicologia passariam a trabalhar juntos em formas de utilizar elementos de ambas as áreas para a construção das novas cidades, como uma maneira de aliar conteúdos estéticos e psicológicos com o fim de que se preservassem a saúde mental e física dos novos habitantes desses lugares.
Naquela época, a visão de arquitetos e psicologistas diferia na medida em que a arquitetura olharia para o ambiente de forma bastante determinista, sendo ele o único agente causador de mudanças, enquanto a psicologia – ainda que também determinista – se interessaria mais sobre a compreensão do que faria com que indivíduos se comportassem de determinadas maneiras em determinados lugares.
Seus interesses – dos psicologistas –, desse modo, se voltam para novas descobertas a respeito de regras ambientais, que envolviam desde os papéis de cada ambiente até os objetivos, sentimentos e intenções do homem ao estar presente em cada um deles.
Em suma, a finalidade dessa vertente passa ser os estudos sobre a relação entre atividade, ambiente e homem. E desse contexto, surgem os primeiros estudos psicossociais visando um entender aprofundado sobre esses temas.
O termo específico “Psicologia Ambiental”, por exemplo, tem suas primeiras aparições em seminários sobre o relacionamento entre o “design” de espaços de atendimento e evidências positivas do progresso terapêutico de pessoas vivendo ou frequentando esses ambientes.
Ao menos 10 anos depois de sua origem, a Psicologia Ambiental passa a ser oferecida como disciplina (e depois como curso) por departamentos de psicologia de universidades importantes do mundo, sendo a Universidade de Nova York uma das pioneiras desse processo de inclusão.
As principais características da Psicologia Ambiental
Uma de suas características mais importantes, uma que da base a muitos de seus estudos, é a multidisciplinariedade, dado que a troca de conhecimentos com áreas correlatas como geografia, sociologia, antropologia e arquitetura, ocorreriam em vários momentos do processo de construção de novos conteúdos.
Inicialmente, correspondendo ao que foi dito acima sobre a arquitetura nos anos 50/60, a Psicologia Ambiental também teria passado por fases mais deterministas no passado, visto que ainda se pensava nos ambientes como algo rígido – como uma cozinha e um quarto de dormir inalteráveis em sua essência – e pouco modificável pelo homem.
Posteriormente, pesquisadores e especialistas reconheceriam a influência que o ser humano poderia ter nos espaços em que habita por meio da relação homem e meio ambiente, entendida sua capacidade de alterar esses lugares ao seu bem estar e objetivos.
Nesse sentido, os estudos relativos ao contexto ambiental passam a ser interpretados como uma inter-relação entre o ambiente físico (natural e/ou construído) e o comportamento humano, ou seja, o ambiente influencia o comportamento, e este por sua vez, também leva a uma mudança no ambiente (Melo, 1991).
Além da multidisciplinariedade e do inter-relacionamento, a unicidade da Psicologia Ambiental, ao não fazer dela uma partícula voltada apenas para o ambiente, torna-se outra de suas características importantes.
A noção de que não se deve separar a análise psicológica do contexto sócio-político e econômico da pessoa surge dessa unidade de estudos, na medida em que não se analisa mais nessa vertente somente o comportamento ou as reações isoladas sem o conhecimento dos ambientes frequentados pelo indivíduo.
A partir desse momento, unindo esses três elementos, o alcance da psicologia se expande e sua percepção comum se altera em decorrência da influência exercida pela Psicologia Ambiental ao todo e a estudos que, quando realizados anteriormente, só levariam em conta elementos interiores do comportamento humano.
Os pressupostos básicos da Psicologia Ambiental
1) A psicologia ambiental parte do pressuposto de que o homem não possui apenas uma existência social, mas que ele possui, acima de tudo, uma existência física, ocupando espaços aonde quer que ele esteja.
2) Acredita-se que só podemos perceber o ambiente ao nosso redor porque construímos um sistema conceptual, a partir de nossa experiência sequencial, que nos permite identificar o que representa cada uma das edificações a nossa volta. Esse processo leva o nome de conceptualização.
3) No processo de conceptualização do ambiente, deve ser levado em consideração não apenas as experiências passadas do indivíduo, mas também o papel que ele exerce num determinado lugar, bem como as regras sociais utilizadas em determinados locais que são aprendidas e repassadas.
4) Ao estudar a interação entre homem e meio ambiente, deve-se sempre levar em consideração a atividade na qual o indivíduo está envolvido e o seu papel no exercício dessa atividade, pois acreditamos que o indivíduo está em algum lugar não por acaso, mas porque tem algum objetivo/meta a cumprir.
5) Além de necessário levar em consideração os papéis sociais e/ou organizacionais dos indivíduos associados a seus objetivos, bem como, suas experiências passadas, deve-se analisar os padrões e regras que regem determinados locais para que se possa entender o efeito que o ambiente físico tem no comportamento humano.
Os níveis de abordagem da Psicologia Ambiental
De acordo com o desenvolvimento da Psicologia Ambiental e o aprofundamento de suas teorias, níveis de abordagem e estudo surgiriam para tornar do trabalho do psicologista ambiental algo mais bem definido, ao mesmo tempo que explicativo e de fácil entendimento.
Algumas categorias seriam criadas com esse fim, dada a amplitude da área e de seus temas. Elas envolveriam a pessoa, a arquitetura e ambientação de lugares e as estruturas urbana e rural como focos de pesquisa. Vejamos um pouco mais sobre elas:
Nível Pessoal
A Psicologia Ambiental de nível pessoal estuda aspectos relacionados ao comportamento espacial do ser humano, levando em consideração elementos como o espaço pessoal, a territorialidade, questões de privacidade e de superlotação (Melo, 1991).
A respeito do espaço pessoal, esse seria uma forma de espaço imaginário ao redor de cada indivíduo, necessário para manter um padrão de privacidade e um apropriado nível de intimidade individual, algo definido como uma maneira de comunicar-se não verbalmente aos outros de acordo com noções de distanciamento.
A ideia de um arco imaginário em cada um caracteriza bem o espaço pessoal que, na verdade, seria um processo dinâmico onde as inter-relações entre os sujeitos variariam de acordo com seus papéis, regras sociais, status, etc. (Melo, 1991).
Em correspondência a esse conceito, a territorialidade corresponderia a uma necessidade de possuir e manter um determinado espaço – como nossa casa ou mesmo lugar no sofá –, sendo qualquer ação de penetração sem permissão nesse território, algo sentido como uma invasão de privacidade.
Nesse sentido, territorialidade e espaço pessoal seriam mecanismos utilizados para atingir a privacidade, enquanto a situação de superlotação seria a condição na qual os objetivos da privacidade não estariam sendo atingidos ou estariam somente sob um custo elevado (Altman, 1985 apud Melo, 1991).
Nível Arquitetônico
Para o nível arquitetônico ficariam definidos os estudos sobre estruturas arquitetônicas em geral, indo desde a análise de residências e seus formatos, até prédios, escritórios, escolas, prisões, hospitais, museus e outras diversas formas de ambientes e espaços.
Dessa maneira, os princípios de superlotação, privacidade, espaço pessoal, territorialidade, percepção do ambiente como também os efeitos de ruídos, temperatura, circulação do ar, no comportamento são observados e analisados em relação à estrutura ambiental interna dos projetos habitacionais ou de várias outras instituições (Melo, 1991).
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A ideia dessa vertente, para além da parte estrutural, é entender também as necessidades das pessoas e fazer de cada ambiente um lugar agradável seguindo princípios da psicologia no sentido de preservar a saúde mental de cada um conforme as formas, os objetos, as cores e outros elementos que formariam os ambientes.
Nível Urbano, Rural e Regional
Nesse caso específico, as pesquisas em Psicologia Ambiental voltam-se para projetos e políticas urbanas/regionais, mesmo não deixando de estarem vinculadas diretamente às duas outras ramificações da pesquisa e dos estudos dessa área, entendida a complementariedade das três.
Seriam estudos a respeito do transporte como elemento de mudança urbana, da disposição das cidades, da ambientação de cada região e dos impactos de cada uma dessas realidades na vida das pessoas, dentre outros tantos exemplos; valendo para regiões rurais também.
São estudos que levam em conta a necessidade de que se preserve o ambiente como forma de auxilio a saúde mental das populações, entendida a relação micro e macro estabelecida entre homem e espaço como algo fundamental para sua vida, dia-a-dia e futuro.
Pensando os impactos positivos da Psicologia Ambiental
Como reflexão, vale ressaltar a importância do ambiente em nossas vidas mais uma vez, seja em nossa casa ou em qualquer lugar em que estamos ou vamos com alguma recorrência. A bagunça, por exemplo – e por mais bobo que ele possa ser –, pode nos influenciar de maneira negativa e isso ilustra bem sobre o que estamos falando.
A simples alteração do ambiente pode melhorar o desempenho das pessoas no trabalho, pode aumentar a motivação de um aluno a estudar e aprender, pode aumentar o número de interações sociais a ocorrerem em um ambiente, mesmo em casa, entre amigos.
A Psicologia Ambiental não altera somente os espaços ou lida com o comportamento dos indivíduos neles. As capacidades que tem de mudanças, cognitivas e perceptivas, têm efeitos incríveis no ser humano. Seus estudos são elucidativos e fundamentais pelas contribuições que propiciam.
A relação homem e meio ambiente é importante. A forma como nos relacionamos com o meio é importante. A maneira como preservamos o espaço é importante. E o impacto que tudo isso tem na gente é importante.
Desses elementos, surge a necessidade de que se conheça um pouco mais sobre Psicologia Ambiental e seus impactos. Uma vertente da psicologia que amplia seus horizontes ao colocar luz sob o meio como algo fundamental de qualquer análise ou trabalho terapêutico/psicossocial.
*Pablo Valente – Administrador, Membro da Intervoice Brasil, Membro da IMHCN e Diretor do Cenat.
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Fonte: Cenat Cursos
Publicação Ambiente Legal, 27/06/22
Edição: Ana Alves Alencar
As publicações não expressam necessariamente a opinião dessa revista, mas servem para informação e reflexão.