Por Alexandre Machado*
O Porto de Santos é realmente paradoxal, mesmo diante de sua importância nacional e das diversas discussões sobre privatização ou estatização, a construção de um túnel submerso ou ponte, dragagem de manutenção e aprofundamento, expansão portuária e outros… Tudo acontece muito lentamente…
Analisando as adaptações sofridas no pequeno Porto de SINES (Portugal), observa-se o quanto de interferência política sofremos e como pouco se estuda o problema de forma técnica – sem interesse (econômico/político). Longe de achar que não seja necessária a ação política, mas o conhecimento técnico e as experiências de quem já fez ajudaria bastante na sua otimização.
Nesse sentido, uma análise apurada da geopolítica internacional, da economia do transporte marítimo, além do redimensionamento da frota internacional, se faz necessária. Vale lembrar que antes da pandemia Covid-19, no último Review Maritime Transport da UNCTAD, de outubro de 2019, este já citava o Brasil, especificamente o Porto de Santos, ao tratar dos Fatores que influenciavam a concorrência e competitividade entre portos, já destacando seus impactos na logística relacionada ao acesso ao transporte terrestre e marítimo, exemplificados pelo contexto europeu e asiático.
“Operational capacity of port to receive larger vessels perceived as an imperative to maintain port competitiveness, for example in Asia and Europe
Operational incapacity of port to receive larger vessels results in losing maritime connections, for example, as in Port of Santos, Brazil, or the need for trans-shipment, inducing higher freight costs
Vertical integration between shipping companies and terminal operators can affect competition if all terminals in a port are controlled by the same company, and that company merges with a shipping company. In this case, the merged entity will have an incentive to discriminate against other shipping companies by providing lower quality services or charging higher prices.” (UNCTAD, 2019, p.51)
Diante do exposto, é difícil entender portos sem uma boa compreensão sobre economia marítima (logística marítima) e transporte marítimo internacional. Apesar das divergências sobre o crescimento exponencial da frota internacional, onde certa parte acredita que:
“Mega-ships are becoming an increasing headache to most ports and distribution centers…” (HARALAMBIDES, 2019
Por outro lado, algumas companhias acreditam no seu aumento exponencial, passando a investir na construção de novos navios porta-contêineres, carro-chefe da economia globalizada, muito embora representem apenas um oitavo do total da frota mundial, sendo essenciais para o transporte de bens de consumo em todo o mundo.
Vale dizer que estes navios ficaram maiores em um ritmo rápido nas últimas décadas, sua capacidade média dobrou. Atualmente, o maior navio de contêineres pode transportar 23.964 TEUs (HMM, 2020), porem, existem mais 72 navios com capacidade acima de 20.000 TEUs, além de 29 encomendados acima de 23.000 TEUs (EVERGREEN, 2020; MSC, 2020; OOCL, 2020; CMA CGM, 2020), a serem entregues até 2023.
Nesse sentido, estes navios maiores geram maior economia para o transportador, e, como tal, facilitam o comercio global. Dobrar o tamanho máximo dos navios de contêineres na última década reduziu os custos totais do navio por contêiner transportado em cerca de um terço. Porém, navios maiores exigem adaptações de infraestrutura, equipamentos e causam maiores picos no tráfego de contêineres nos portos, com impactos mais abrangentes.
A economia potencial de custos para as operadoras parece ser bastante marginal, mas os custos de aumento da infraestrutura podem ser fenomenais. A introdução de cem navios de 24.000 TEU em 2020, exigiria investimentos substanciais nos locais onde esses navios seriam introduzidos pela primeira vez (Extremo Oriente, Norte da Europa, Mediterrâneo), o que provocaria um efeito cascata, resultando na introdução de navios de 19.000 TEUs na América do Norte e navios de 14.000 TEUs na América do Sul e África, implicando em investimento adicionais, os quais devem ser analisados conforme capacidade técnica portuária (profundidades do canal vs berço de atração).
Sem contar que grandes navios também concentram serviços e cargas, reduzindo a resiliência da cadeia de abastecimento, tornando mais limitada, especialmente porque os navios maiores coincidem com o aumento da cooperação das principais companhias marítimas em alianças.
Diante do exposto, uma discussão construtiva precisaria ocorrer com as partes interessadas, incluindo governo, regulador, autoridade portuária e todos os constituintes interessados, antes mesmo de se discutir – ponte vs túnel, privatização vs estatização etc.
O objetivo poderia ser facilitar uma troca de pontos de vista, uma compreensão dos objetivos e planos e, em última análise, uma melhor coordenação para garantir configurações ótimas da cadeia de abastecimento, incluindo o uso otimizado de grandes navios.
*Alexandre Machado é Doutor em Direito Ambiental Internacional e Mestre em Direito Ambiental, possui Especialização em Direito do Petróleo e Gás e Didática do Ensino Superior, professor de Terminais Offshore, Transporte Marítimo e Comércio Exterior e Logística na Faculdade Estadual de Tecnologia da Baixada Santista (FATEC Rubens Lara/SP).
Fonte: O próprio autor
Publicação Ambiente Legal, 01/10/2020
Edição: Ana A. Alencar
Assunto muito bem abordado com perspectiva macro. A decisão sobre qual tipo de passagem ideal precisa de um estudo aprofundado com os pontos de vista de todas as partes envolvidas,
entendimento sobre a capacidade de recebimento de navios maiores no porto de Santos e qual seria o limite, qual é a perspectiva no mercado de navios que por se tratar de estimativa de cenário que muda conforme tendências futuras,
assim como fatores socioeconômicos e locais.. Parabéns pela análise,
excelente.