Por Adriana P. B. Tufaile e Alberto Tufaile
Hoje, a iluminação elétrica é responsável por aproximadamente um quarto do consumo de energia elétrica no mundo, então o aumento da eficiência das lâmpadas é de grande importância para reduzir o consumo de energia, reduzindo a demanda pelos recursos do planeta [1].
O prêmio Nobel de Física deste ano foi concedido aos três inventores do LED azul, dispositivo que possibilitou a fabricação de LEDs de luz branca. LED é a sigla em inglês que significa diodo emissor de luz e é um dispositivo energeticamente muito eficiente de produção de luz (lâmpada). Eficiência energética significa menor consumo de energia elétrica para a mesma intensidade luminosa, ou seja, reduz o gasto de energia para iluminação. Já vínhamos usando LEDs vermelho, laranja e verde há quase meio século, nos vários equipamentos eletrônicos ao nosso redor. Eles são aquelas luzinhas que mostram que os equipamentos estão na tomada e às vezes, mudam de cor quando ligamos o aparelho.
Também são as fontes luminosas nos relógios a quartzo. Nos anos 1990, Nakamura, Akasaki e Amano inventaram o LED azul, desde então o uso de LEDs foi muito diversificado, pois a invenção do LED azul era o que faltava para se poder fazer lâmpadas de LED com luz branca, que são a base da iluminação de ambientes e de aparelhos como celulares e televisores de LED. Com um trio de LEDs vermelho, verde e azul podemos emitir luz que nosso cérebro entende como branca e podemos também ter infinitas cores fazendo infinitas combinações de intensidade destes três LEDs. Isto possibilita painéis luminosos de LEDs reproduzindo todo tipo de imagem digital, pois os LEDs podem ser controlados eficientemente por computador, já que respondem muito rapidamente aos sinais elétricos.
Por falar em computadores, a tecnologia usada na fabricação dos LEDs é do mesmo tipo daquela usada na fabricação dos chips de computadores. Chips e LEDs são feitos de camadas de materiais semicondutores dopados, portanto sua fabricação não é barata, mas as técnicas estão sendo barateadas rapidamente e os benefícios na economia de energia e materiais começam a compensar o preço de fabricação. Temos células sensores de luz na retina (fundo do olho). As células sensíveis à cor são de três tipos, as sensíveis ao vermelho, as sensíveis ao verde e as sensíveis ao azul.
Todas as cores e tons intermediários são sentidos pela combinação da sensibilização destes três tipos de células. Qualquer fonte de luz que emita simultaneamente com intensidade similar as cores básicas vermelho, verde e azul vai sensibilizar igualmente os três tipos de cones e dizemos que esta luz é branca. A luz do Sol possui todos os tons de vermelho, laranja, amarelo, verde, azul e violeta como podemos observar no arco-íris que é resultado da decomposição das cores da luz do Sol. Então a luz branca do Sol, tem muitas cores e tons, mas só precisamos das três cores básicas para perceber a luz como branca.
Como os LEDs são dispositivos sólidos, as lâmpadas deste tipo não precisam de bulbos de vidro, não são mecanicamente frágeis e não contêm vapor de mercúrio como as lâmpadas fluorescentes. O vapor de mercúrio é muito perigoso para nós e para o ambiente, pois ele é uma neurotoxina, ou seja, ele afeta o sistema nervoso. Infelizmente é muito comum, o descarte impróprio das lâmpadas fluorescentes, que se quebram e liberam este vapor tóxico na atmosfera. A substituição das lâmpadas fluorescentes por lâmpadas de LED trará um benefício ambiental que não está restrito apenas à economia de energia elétrica.
Uma curiosidade sobre LEDs: o controle remoto do seu televisor tem um LED que emite no infravermelho, que é uma luz invisível. Não conseguimos ver, mas nossas câmaras fotográficas digitais conseguem. Faça o teste, pode ser com a câmara do seu telefone celular, aponte o controle na direção da câmara, aperte qualquer botão do controle remoto e veja simultaneamente a imagem captada pela câmara. Experimente!
Os monitores e televisores que estão no mercado hoje, como o nome de LCD (Liquid Crystal Display = mostrador de cristal líquido) têm uma lâmpada fluorescente iluminando a tela de cristal líquido por trás. Os conhecidos como monitores ou televisores de LED são telas de LCD com iluminação traseira feita por LEDs brancos. Como os LEDs são bem menores que as lâmpadas fluorescentes, estes aparelhos são mais finos que os anteriores, além de gastarem menos energia. Os mostradores nos atuais aparelhos de telefone celular são de cristal líquido com iluminação traseira de LEDs brancos.
Os LEDs são muito pequenos e emitem luz de forma muito direcionada, seu uso em lâmpadas e luminárias requer difusores para espalhar a luz. Recentemente publicamos um artigo [2] sobre o espalhamento de luz em espuma de detergente. Apesar de usarmos detergente, as propriedades ópticas destas espumas são similares as de outros tipos de espumas. Nós apresentamos nossos resultados numa feira de inovação da USP, onde um empresário que fabrica luminárias de LEDs nos mostrou a importância dos difusores nestas luminárias. Eles usam difusores caros e importados feitos com tecnologia sofisticada, nós mostramos para ele que a estrutura de espuma pode fornecer um ótimo difusor.
Já há vários anos, nós fazemos questão de discutir a emissão de luz por LEDs nas nossas disciplinas nos cursos de Ciências da Natureza e Gestão Ambiental na EACH-USP (USP-Leste), esta discussão é importante, pois possibilita aos estudantes aprenderem aspectos da Mecânica Quântica usando objetos do cotidiano. No nosso livro “Da Física do Faraó ao Fóton” [3], nós colocamos a discussão de comparação da eficiência energética entre os tipos mais comuns de lâmpadas baseada nos fenômenos físicos envolvidos na geração de luz. Nesta discussão, incluímos um experimento simples e barato usando LEDs que possibilita a estimativa da Constante de Planck que é a constante fundamental da Mecânica Quântica.
As lâmpadas incandescentes emitem grande parte da energia que consomem na forma de luz infravermelha, que é invisível e se traduz em parte em calor. Como o objetivo da lâmpada é emitir luz visível, grande parte da energia gasta com este tipo de lâmpada é desperdiçada. As lâmpadas fluorescentes não emitem infravermelho, emitem luz visível e um pouquinho de luz ultravioleta. Esta lâmpada é energeticamente mais econômica do que as incandescentes, mas na hora do acendimento das lâmpadas fluorescentes, há um gasto considerável de energia para ionizar o gás, que é vapor de mercúrio. O gás dentro da lâmpada fluorescente é um isolante elétrico, para fazer uma corrente elétrica atravessá-lo é necessária uma grande energia para ionizar o gás. Depois de estabelecida a corrente elétrica, pouca energia é necessária para mantê-la.
Além de grande eficiência energética o tempo de vida dos LEDs é bem maior que das outras lâmpadas, ou seja, lâmpadas de LED devem durar muito mais. Na tabela a seguir, podemos comparar a eficiência energética e tempo médio de vida de lâmpadas comuns no mercado [1].
Os LEDs são a base para a fabricação dos diodos laser, que estão, por exemplo, nos apontadores a laser das armas de fogo e aqueles que já foram irresponsavelmente usados para atrapalhar a visão de goleiros. Antes dos LEDs, os dispositivos lasers eram grandes, frágeis e custosos. Com o advento dos diodos lasers infravermelhos e vermelhos, foram possíveis os leitores laser de CD e DVD. Agora com diodos laser azuis, temos os leitores de blue-ray. Como o comprimento de onda azul é bem menor que o do infravermelho e do vermelho o tamanho de um bit de informação nos discos de blue-ray é bem menor que um bit de um CD ou DVD. Assim na mesma área de disco cabe muito mais informação num disco de blue-ray do que num DVD. Então é possível armazenar um filme de cinema em alta definição em apenas um disco, ou seja, com uma definição de imagem melhor que a dos DVDs. Os diodos laser azuis também melhoraram a qualidade das impressoras a laser, pois a definição da imagem foi aumentada com a diminuição do comprimento de onda.
A palavra diodo é de origem grega e significa dois caminhos, ou seja, a corrente elétrica vai passar num sentido e não vai passar no sentido oposto. A cor da luz emitida por um diodo (LED) é definida pelo material semicondutor. Um diodo é feito em camadas, como um sanduíche, sendo que as camadas de “pão” têm características elétricas opostas geradas pela dopagem, ou seja, estas duas camadas são do mesmo material básico, mas em cada uma delas foi acrescentada uma pequena quantidade de um elemento que tem falta ou excesso de elétron quando comparado com o material de base. A camada dopada com excesso de elétron é chama de tipo N (negativa). A camada dopada com falta de elétrons é dita do tipo P (positiva). As regiões com falta de elétrons são chamadas de buracos e se comportam como partículas positivas. Entre estas camadas, temos o “recheio”, ou camada ativa.
Nesta camada não há excesso de elétrons nem buracos porque alguns elétrons do material tipo N se difundem pela junção e entram em combinação com alguns buracos do material tipo P. Quando aplicamos uma tensão elétrica no sentido certo, os elétrons se movem e os elétrons da camada tipo N caminham na direção da camada ativa, onde encontram com os buracos. Quando os elétrons caem nos buracos, há a emissão de luz, pois os buracos tem energia potencial menor do que os elétrons da camada tipo P. A diferença entre estes dois níveis de energia (gap) define a energia da luz emitida. Este é um fenômeno da Mecânica Quântica, a diferença de energia entre os níveis eletrônicos é emitida na forma de fótons (partículas de luz).
Da mesma forma que os elétrons da camada P se movimentam, os buracos conduzem corrente elétrica pelo fato de que um buraco é ocupado por um elétron proveniente de uma corrente elétrica que passa sobre o material e que força a criação de outro buraco atrás de si. Um buraco se move numa direção pelo movimento de muitos elétrons no sentido oposto.
Trio Básico: Três LEDs acesos fotografados de topo. Podemos ver os terminais chegando ao elemento semicondutor no centro. O anel ao redor é o encapsulamento funcionando como uma lente que espalha a luz.
Grão Luminoso: O chip semicondutor de um LED, do tamanho de um grão de areia, com suas camadas positiva, negativa e ativa. Na camada ativa, os elétrons “caem” nos buracos e emitem fótons. Aqui cair significa uma diminuição na energia potencial elétrica, a perda de energia do elétron é a energia carregada pelo fóton (luz).
Os grandes benefícios do uso de LEDs não podem ser desculpa para abusarmos e inundarmos nosso cotidiano de LEDs acesos por longos períodos, pois quando somamos o pequeno consumo de muitos LEDs teremos uma quantidade considerável de energia. O físico Colin Pykett já discutiu sobre o consumo dos LEDs de stand-by, aqueles que ficam acessos mesmo com o aparelho eletrônico desligado [4]. Cada ledzinho acesso 24h/dia pode não ser importante na conta de luz de uma família de classe média, mas se somarmos todos estes LEDs acessos numa grande cidade como São Paulo… Além disto, o mercado está sendo inundado com vários tipos de objetos com muitos LEDs, por exemplo, enfeites de Natal. Claro que os enfeites feitos com LEDs gastam menos energia que os de lâmpadas tradicionais, mais se isto significar uma quantidade imensa de enfeites ligados por muito mais tempo, a economia de energia pode não ser importante.
[1] “Blue LEDs – Filling the world with new light” The Royal Swedish Academy of Sciences, 2014.
[2] “Some aspects of image processing using foams” A. Tufaile, M. V. Freire, A. P. B. Tufaile, Physics Letters A, v. 378, 2014.
[3] “Da Física do Faraó ao Fóton” A. Tufaile, A. P. B. Tufaile, Ed. Livraria da Física, 2013.
[4] “Can a LED really be green?” Colin Pykett, Physics World, Jul. 2007.
Esta matéria faz parte da Revista Ambiente Legal 12ª edição.
Excelente artigo!
Apresenta a tecnologia para o leigo sem fazer concessões à exatidão e ao fundamento técnico.
Há apenas um pequeno detalhe que os autores podem querer corrigir: as lâmpadas fluorescentes não contém vapor de mercúrio. As lâmpadas de vapor de mercúrio ainda existem mas estão sendo substituídas – felizmente – quase totalmente pelas de vapor de sódio. Que por sua vez estão sendo substituídas por LEDs mesmo em iluminação pública.
Parabéns aos autores. Divulgação técnica/científica no Brasil para o público leigo é, geralmente, de má ou péssima qualidade.
Agradecemos muito seu comentário Ernesto e, em breve, teremos mais artigos dos mesmos autores, dois físicos e professores que se empenham em trazer a física para o nosso cotidiano. Eles acabaram de publicar um livro muito bom, “Da física do faraó ao fóton”, vale a leitura. Veja uma entrevista exclusiva: http://www.ambientelegal.com.br/tv-ambiente-legal-adriana-tufaile/.
Um grande abraço e obrigado pela participação e leitura de nossos artigos !
Ana Alencar
Caro Ernesto Dias jr, o vapor de mercúrio está presente nas lâmpadas fluorescentes, que não devem ser confundidas com as lâmpadas de vapor de mercúrio que estão sendo substituídas pelas lâmpadas de vapor sódio. Pesquisando agora na internet, encontramos o artigo “A questão do mercúrio em lâmpadas fluorescentes” de Walter Durão e Claudia Windmoller: http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc28/04-QS-4006.pdf Além deste documento, temos o comentário de Reinaldo Lopes em “Saiba como descartar lâmpadas fluorescentes de forma adequada”: http://tecnologia.uol.com.br/noticias/redacao/2013/10/29/saiba-como-descartar-lampadas-fluorescentes-de-forma-adequada.htm Além do mercúrio, o pó de revestimento da lâmpada fluorescente pode trazer algum risco. Mas não precisamos entrar em pânico por isso, é só procurar fazer o descarte adequado destas lâmpadas. Além destes sites, a primeira linha da página da Wikipedia sobre lâmpada fluorescente informa sobre o conteúdo de mercúrio neste tipo de lâmpada. Nesta mesma página, vemos que a agência ambiental norte-americana (EPA) recomenda cuidados com o descarte deste tipo de lâmpada: http://en.wikipedia.org/wiki/Fluorescent_lamp De modo geral obrigado pelo comentário e esperamos ter explicado o “detalhe” da presença do elemento mercúrio nas lâmpadas fluorescentes.
Alberto e Adriana Tufaile
Mais uma informação interessante, a Professora Adriana Tufaile chegou a conhecer uma máquina de retirada de mercúrio de lâmpadas fluorescentes de uma empresa nacional: http://revistapesquisa.fapesp.br/wp-content/uploads/2008/04/88-91-Iluminacao-146.pdf?be076b
Curiosamente, no site desta empresa, vemos que até as lâmpadas de vapor de sódio possuem mais mercúrio do que as lâmpadas fluorescentes tubulares: http://www.tramppo.com.br/index2.php?local=41