Por Marcia Hirota e Monica Fonseca*
Um dos mecanismos mais efetivos para garantir os benefícios ambientais, sociais e econômicos oferecidos por nossas florestas naturais e ambientes costeiros está na criação e boa gestão de Unidades de Conservação (UCs). No Brasil, esta proteção se dá pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), que acaba de completar 18 anos.
Em 2010, governos de todo o mundo e signatários da Convenção da Diversidade Biológica (CDB) concordaram em expandir de 13% para 17% a rede global de áreas protegidas da superfície terrestre mundial até 2020 (meta de Aichi 11). O principal motivador foi evitar a perda adicional de espécies ameaçadas de extinção e proteger os serviços oferecidos por essas áreas, como a produção de água e de alimentos, regulação do clima, qualidade do ar, lazer e atividades econômicas.
Apesar de diversos avanços neste tema, muito ainda precisa ser feito no Brasil para atingir essa meta. E uma das principais dificuldades para que isso ocorra, sobretudo na Mata Atlântica, está nos inúmeros conflitos associados a diferentes usos de terra.
É nessa hora que aumenta a importância da participação do setor privado nas estratégias de conservação por meio das Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) – única categoria de UC de iniciativa privada e uma ótima oportunidade de engajamento da sociedade na proteção dos recursos naturais.
Na prática, as RPPNs são uma contribuição, em sua maioria, de pequenos proprietários rurais, aqueles que possuem menos de 20% das terras no país e produzem grande parte da nossa alimentação. São eles que, voluntariamente, dedicam uma pequena fração da sua propriedade à conservação das florestas nativas e proteção dos recursos hídricos.
Nos últimos cinco anos o governo federal criou apenas duas novas UCs de proteção integral na Mata Atlântica – os Parques Nacionais da Serra do Gandarela e Guaricana. Por outro lado, no mesmo período, foram criadas 155 novas RPPNs no bioma, o que resultou em mais de 26 mil hectares de florestas naturais protegidas.
Entre os exemplos regionais que demonstram essa representatividade destacam-se também os casos da Mata Atlântica. Enquanto na Serra do Mar temos uma extensa superfície protegida por UCs públicas, ao norte do rio São Francisco grande parte dos remanescentes florestais possui menos de 50 hectares de áreas conservadas, porém inseridas em uma paisagem muito degradada. Lá, as RPPNs – principalmente as corporativas – são emblemáticas, pois estão entre os principais remanescentes florestais protegidos. São 14 reservas que somam mais de 3.200 hectares – a maior parte delas de fragmentos vegetacionais de tamanho muito superior à média regional. Destaques às RPPNs Frei Caneca, Lagoa dos Gatos e Jussaral, todas com mais de 300 hectares.
A floresta com araucária, uma das tipologias de Mata Atlântica mais ameaçadas e com um histórico de super exploração, encontra-se atualmente com menos de 1,5% de sua área de ocorrência original protegida em UCs públicas de proteção integral. Assim, destacam-se mais uma vez as RPPNs, que somam no Paraná aproximadamente 270 reservas e cobrem uma área aproximada de 55 mil hectares. Deste total, cerca de 65% está inserido na formação de florestas com araucária.
Existem RPPNs em 520 municípios dos 3.429 com ocorrência do bioma, sendo que em 214 deles as únicas porções de floresta preservada são em forma de reservas privadas. E os exemplos citados deixam claro que a parceria com proprietários de terra merecem maior valorização e devem ser incluídas em políticas públicas de planejamento e gestão do território que promovem a conservação.
Na última semana de julho, Florianópolis recebeu um importante encontro sobre conservação em terras privadas, o V Congresso Brasileiro de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (VCBRPPN). O Congresso foi inspirador e um sucesso, com mais de 220 participantes, em grande maioria proprietários de reservas. Nesta semana, começa o IX Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação. Se pudermos aproveitar a data para dar um recado para toda a coletividade envolvida neste cenário, sejam do primeiro, segundo ou terceiro setores, sugerimos seguir o exemplo dos nossos queridos “rppnistas”, grandes guardiões da natureza. Façam do interesse público o seu interesse privado. Pois, como um ciclo contínuo, todos saem ganhando: o meio ambiente, o homem e a economia nacional, alcançando assim o desenvolvimento perene.
*Marcia Hirota e Monica Fonseca são, respectivamente, diretora-executiva e consultora da Fundação SOS Mata Atlântica.
Publicado originalmente em 29 de julho, no portal O Eco.
Fonte: SOSMA