Poluição e assoreamento ameaçam a vida de um símbolo de São Paulo
Por Vitor Lillo
O rio Pinheiros, repleto de curvas sinuosas e várzeas que ainda servia de local para prática de natação e futebol no início do século passado, entra no século XXI praticamente morto. A causa está no assoreamento provocado pelas mudanças em seu curso original e também pelo lançamento irregular de lixo e esgoto.
O processo de transformação do rio teve início em 1908, com a inauguração da Represa Guarapiranga, construída com o objetivo de corrigir a vazão do Rio Tietê e alimentar a Usina Hidrelétrica de Parnaíba, concluída sete anos antes. Vinte anos mais tarde, o engenheiro norte-americano Asa White Kenney Billings deu início às obras que mudariam o rio Pinheiros.
Com o objetivo de aumentar a capacidade de geração da usina Henry Borden de Cubatão, o rio Pinheiros foi retificado e teve seu curso invertido. Para isso foram construídas as usinas elevatórias de Pedreira e Traição (que elevam as águas do rio Pinheiros em 25 metros para em seguida atingir a represa Billings) além da Estrutura do Retiro (que separa as águas dos rios Pinheiros e Tietê em caso de cheias).
Com as obras, a energia elétrica necessária para a expansão da área urbana do município de São Paulo estava garantida, porém, a um alto custo ambiental: “por conta dessa inversão o rio Pinheiros se transformou num canal em que a água deixou de correr e por conta disso houve um acúmulo de sedimentos, provocando o assoreamento, tornando o rio mais propenso a enchentes. Se não houve grandes alagamentos no Pinheiros nesses últimos anos, é somente por causa do controle que já é feito do nível das águas, além da quantidade de chuva nessa região que tem sido menor.”, explica o geógrafo da Universidade Estadual Paulista, José Eduardo Eaine (UNESP).
Ironicamente – ao menos para a memória do engenheiro Billings – o bombeamento da água do rio para a represa que leva seu nome não é feito de forma constante desde 1992, por conta do acúmulo de resíduos tóxicos e sedimentos que hoje chegam a 1,5 milhão de metros cúbicos. Com isso, a capacidade de produção de energia da usina Henry Borden caiu em 75%, segundo dados oficiais.
Poder Público: acertos e erros
No início dos anos 1990, após forte mobilização popular, o Governo do Estado de São Paulo deu início às obras de despoluição do rio Tietê, parte do problema do seu irmão, Pinheiros. Foram investidos cerca de R$ 1,8 bilhão em mais de 500 obras de saneamento básico na Capital e nos demais municípios da Grande São Paulo. A previsão da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) é que os primeiros efeitos da limpeza apareçam em 2020.
Contudo, esse objetivo parece estar longe de ser alcançado. Em 2012 a empresa foi alvo de processo do Ministério Público que exige indenização de R$ 11,5 bilhões de reais pela companhia, por conta do lançamento, em ambos os rios, do esgoto doméstico lançado pelos municípios da Região Metropolitana, cujos sistemas de saneamento ainda não foram assumidos totalmente pela estatal.
Em 2001, a Empresa Metropolitana de Águas e Energia (EMAE) anunciou um projeto ambicioso para retirar a poluição do rio Pinheiros, por meio de flotação, processo no qual a sujeira é acumulada em blocos sólidos que depois são retirados por um sistema coletor. A construção da estrutura custou R$ 160 milhões de reais aos cofres do estado. A previsão era de que em 10 anos a maior parte do esgoto seria retirada.
Dez anos mais tarde, porém, estudos apontaram que o sistema fracassou. A razão apontada foi a de que o volume de sujeira era grande demais para o sucesso da ação de limpeza. A decisão do governo estadual à época foi abandonar o projeto. Como resultado a estrutura construída ficou em completo abandono. A situação motivou nova ação do Ministério Público para retirada do equipamento, em 2012.
Ressucitar o Pinheiros é possível?
“O rio pode voltar, sim à vida. Se é possível recuperar avenidas, por quê não recuperar um rio?”. Malu Ribeiro faz essa afirmação com a autoridade de quem é especialista em gestão ambiental e também coordenadora da Rede das Águas, braço da organização ambiental SOS Mata Atlântica voltada para recursos hídricos.
“É preciso deixar de lançar esse esgoto sem tratamento, mas, antes tem que haver vontade política. Na cabeça do político, saneamento não dá voto. É melhor fazer uma ponte ou uma avenida que é visível e podem ser feitas no curto prazo. Ele [o político] pensa só nos quatro ou oito anos de mandato”, critica Malu.
Ainda segundo a especialista, a legislação é também um entrave para a revitalização do rio. “A Lei Nacional de Saneamento Básico permite que o tratamento de esgoto seja realizado pela União, estados, municípios ou mesmo a iniciativa privada. Essa liberdade de ação faz com que aconteçam distorções que impedem o avanço dessas obras”, avalia Malu.
Outra solução para o Rio Pinheiros, de acordo com a ambientalista, está na recomposição da várzea dentro de seu leito, uma solução que na opinião de José Eduardo Eaine deve vir acompanhada do combate ao despejo de esgoto e lixo. “Essa solução [recomposição das várzeas] me parece uma solução paisagística. Sozinha, ela não resolve o problema do rio”, avalia o geógrafo.
Mais que trazer a vida de volta às águas do Pinheiros, é necessário trazer a população de volta às margens. Há mais de três anos, o governo paulista lançou o projeto do Parque Linear Pinheiros, com área de 25 km de extensão, que prevê a construção de áreas de lazer, prática de esportes e lanchonetes. O plano está em fase de análises e não tem prazo para sair do papel. No momento, o que existe é uma ciclovia de 21,5 km.
Para Malu Ribeiro, a iniciativa privada pode participar da viabilização do projeto. “É possível que se façam investimentos privados na região, mas antes será preciso resolver o problema do mau cheiro”, afirma.
Outro lado
O portal Ambiente Legal entrou em contato com a Sabesp, EMAE, Secretaria do Verde e Meio Ambiente da Prefeitura de São Paulo, para ter uma posição destes órgãos sobre seus projetos para a revitalização do rio Pinheiros, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem.
Parabéns pela reportagem. A despoluição dos rios da bacia hidrografica do Alto Tietê é um dos grandes desafios de São Paulo e faz parte do Projeto Tietê. A Fundação SOS Mata Atlântica monitora e acompanha as metas do programa de despoluição a cargo da SABESP, com a sociedade e, por isso, temos certeza de que com o engajamento dos cidadãos e transparencia na gestão do programa, é possivel sim recuperar esses grandes rios. Tratar esgotos é investir em saúde publica e ambiental. Estamos juntos nessa luta.
Perto de 1989, quando era integrante do Coral do Estado de São Paulo, atual coral jovem, cantamos à beira do rio Pinheiros, acompanhando Guilherme Arantes que executava sua música “Planeta Água”, no lançamento de um projeto para despoluição do rio. No mesmo evento, um mergulhador, obviamente de escafandro, entrou naquelas águas podres e relatou não conseguir ver nada a um palmo do próprio nariz! Aquilo continua um esgoto a céu aberto!!!!! E assim continuará!
Bom, estamos em 2020 e o Pinheiros ainda fede a esgoto na altura da estação de trem que leva o seu nome, é engraçado como os bairros mais ricos de sp estejam logo de frente a tal rio nauseabundo. Enquanto não houver saneamento e tratamento de esgoto para todos os paulistas os rios serão podres, talvez quando privatizarem a sabesp e o ato de levar tratamento de esgoto para as pessoas for algo lucrativo o problema seja resolvido, mas talvez nem isso resolva e em 2030 alguém comente aqui dizendo que o Rio Pinheiros ainda fede.