Por Luciano Pizzatto*
Sr. Ministro do Meio Ambiente,
Quando vejo a população de uma cidade, incitada ou não, atacar quem está lutando em proteger o meio ambiente tão querido por todos, e os órgãos ambientais serem temidos de norte a sul do Brasil, lembro de seu pai quando criou o IBAMA. Eu era Diretor do então IBDF e vivi aquele processo como um avanço de integrar e coordenar as atividades do setor, somando os interesses de proteção integral aos de conservação pelo uso, com culturas institucionais diferentes como o da SUDEPE, SUDHEVEA, IBDF e SEMA, e não é isto que aconteceu.
Com o tempo, a parte do nome IBAMA que diz “e dos recursos naturais”, foi sendo esquecida, se sucedeu o MMA, veio o interesse internacional, novas Leis, conflitos entre ONGs imobilistas e os utilitaristas, a separação do IBAMA no ICMBio ou o Serviço Florestal Brasileiro e a implantação da politica de comando e controle.
Sobre o comando e controle vou publicar outro artigo pois é longo o tema, mas adianto a conclusão de que querer comandar em Brasília um pais biodiverso, socialmente e no ambiente, é uma falácia, além de menosprezar a capacidade de milhares de cientistas, profissionais devidamente habilitados e ansiosos para exercer seu conhecimento, afastados por normas e resoluções impraticáveis pela ausência da ciência. Neste caso tenho de concordar com Mangabeira Unger de que este sistema representa “uma perseguição permanente à atividade criativa do País” (Valor Econômico, 11/04/2015)
O resultado estamos vivendo.
Como já enfrentei na fiscalização garimpeiros e outros do lado do controle e também já à recebi do lado de produtor, sei o quanto é difícil, mas a militarização da fiscalização só gera maior confronto, especialmente com a decisão de queima e destruição de equipamentos, casas, serrarias, etc, sem nenhum contraponto de levar produção alternativa e sustentável. As pessoas comem todos os dias, e com dignidade 3 vezes ao dia. É nossa obrigação dizer na realidade local de onde vivem como terão seu fluxo de caixa para pelo menos comer, ou o poder publico será o escravagista por definição.
Um pais com mais de 60% de florestas não ter imensos programas de manejo florestal, em grandes ou pequenas propriedades, e de fato manter no sentido contrário da sustentabilidade a proibição de manejo em biomas que precisam da recuperação de suas florestas como a Mata Atlântica, contrariando a maioria das pesquisas existentes, é um comando que não vai funcionar.
Os milhões de habitantes rurais na Amazônia tinham de estar sendo orientados a manejar florestas, recebendo bilhões de mudas para replantarem nem que seja subsidiado para gerar emprego e renda, pois isto sim é racional e efetivo resgate de carbono, teriam de ter serrarias modernas, eficientes, sem desperdício que os ajudassem a viver com dignidade, como um dos exemplos. Com a dimensão necessária e não a dos discursos eleitorais de sempre, por sinal uma das indicações para conservar a Amazônia de ONGs da COP 23, obvio para uma região de vocação florestal.
Pessoas até nos estados desenvolvidos, como São Paulo ou Paraná, passam fome ao lado de Palmitais pois não são estimulados a seu uso correto, uma riqueza imensa, e se aliam ao crime como uma única alternativa de viver, ou se obrigam a plantar exóticas como a palmeira real em detrimento da nossa trufa brasileira, o Palmito Jussara. E não falo da centena de indústrias clandestinas, mas sim das milhões de pessoas que ainda vivem nestas regiões de norte a sul, onde mesmo tentando os caminhos legais esbarram em meses ou anos de espera e uma burocracia interminável.
O comando que impõe arbitrariamente anos de espera para um processo tramitar é mais danoso que muitas balsas clandestinas, pois retiram a legitimidade de toda politica ambiental brasileira.
Nossos colegas que defendem as Unidades de Conservação ou enfrentam desmatamentos merecem total respeito, mas sua formação não é policial, e sim são engenheiros, biólogos, e outras profissões que detém a capacidade profissional para aplicar a lei e ao mesmo tempo como a mesma lei prevê orientar e fomentar soluções. Eles merecem o respeito a sua dignidade profissional, e não o medo e rancor que se vê, sendo apoiados pelas forças policiais treinadas para este fim.
Nas cidades, o paisagismo se transforma em mesmo problema, onde proibições de corte sem lógica, baseadas em paradigmas insustentáveis, desestimulam o uso de espécies nativas. Observe a beira de rodovias e ache onde estão as espécies nativas sendo plantadas. Perguntei por que não plantar nativas nas faixas de servidão e a resposta é para não ter problema futuro. Que loucura.
A silvicultura no Brasil continua próxima ao mesmo índice de 0,6% de área reflorestada do tempo do IBDF na década de 80, mostrando que não adotamos politicas eficientes nem para florestas plantadas, sem considerar que áreas estão sendo convertidas de reflorestamento para agricultura pelo baixo valor agregado ao produtor rural, que não encontra mecanismos de mercado ou politicas econômicas setoriais. Terror maior é tentar conduzir os tratos silviculturais como o controle do sub-bosque que toma conta do Pinus ou Eucaliptos e nem isto se autoriza.
Esquecemos até mesmo a articulação obrigatória com a Lei de Politica Agrícola que norteia de maneira igual onde entende-se por atividade agrícola a produção, o processamento e a comercialização dos produtos, subprodutos e derivados, serviços e insumos agrícolas, pecuários, pesqueiros e florestais.
Quando um veiculo do IBAMA chegar a uma propriedade rural e for recebido com a alegria que o veiculo da EMATER era recebido fazendo extensão, ai sim teremos uma politica ambiental eficiente, integrada ao bem comum, sem armas, com argumentos, e se necessário com rigor, compreensível ao nível cultural do autuado.
E se um pais queima cerca de 90% de sua madeira nativa dita valiosa sem nenhum uso, no campo, mais falido esta o sistema. Confundir desmatamento com manejo pior ainda.
Os maiores temas não precisam de investimentos além da boa vontade e resgate da legalidade.
Integrar os pequenos e médios proprietários florestais da Amazônia ou todo Brasil a produzirem com manejos perenes, integrados a empresas competitivas ou a cooperativas rurais de uso, com total participação do MMA, órgãos estaduais e municipais é o caminho óbvio no pais com a maior floresta tropical do planeta. Nesta ótica agradeceríamos ajuda internacional de alguns milhões de dólares com imposições, mas sem abrir mão de um PIB do ciclo florestal apenas do incremento total de nossas florestas na sua cadeia produtiva de mais de R$ 1 trilhão por ano!!! Sem isto falta dinheiro para viver, para manter e conservar, para pesquisa e educação, fomento e extensão e por consequência saúde, segurança, infra estrutura … se chama perda da sustentabilidade, simples assim.
Enviar texto resgatando os artigos vetados, de maneira covarde, na lei da mata atlântica, que foi construída a varias mãos no Congresso Nacional, e mutilada pelos vetos do desejo de uns poucos, inviabilizando a sustentabilidade de milhões de hectares remanescentes de ecossistemas atlânticos e seus vários biomas, é da mais absoluta urgência.
Priorizar o controle de mais de 100 milhões de hectares de unidades de conservação já é um trabalho hercúleo que se soma a conservação de outros mais de 100 milhões de terras indígenas.
Atacar o verdadeiro vilão da contaminação dos nossos rios, a falta de saneamento em todo pais é outro.
Dizer não rapidamente para o que não é possível licenciar, mas dizer sim mais rápido ainda para o que pode ser licenciado é resgatar a dignidade do cidadão e a satisfação do servidor público, que não pode mais esperar meses ou anos para uma resposta.
Separar as escalas de espaço e tempo, deixando de confundir oque é pequeno ou oque pode ser remediado, com tragédias de longa duração ou difícil correção vai criar melhor conscientização.
A desinformação ambiental gera histeria coletiva que só beneficiam radicais, onde novas gerações, por exemplo, confundem uso racional e necessária economia de água com salvar o planeta fechando torneiras como se isto guardasse a água nos canos e parassem os rios, rasgando Lavoisier.
Temos de ter a opinião pública apoiando o manejo florestal e não ensinando que não se toca em árvores, pois estamos nos afastando da vida real, onde as nações mais desenvolvidas estimulam o uso da madeira pela sua cadeia produtiva e melhor resultado na diminuição do efeito estufa, se contrapondo ao estimulo de produtos não renováveis no Brasil como o cimento, plástico e outros. Nem precisa lembrar que a lenha, recurso renovável, é nosso segundo combustível doméstico.
Os princípios construídos em nossa Constituição e Leis não podem ser revogados pela vontade executiva de normas e portarias, como o exemplo da conservação in situ apoiando o uso que conserve espécies ameaçadas previsto em várias Leis e até Lei Complementar, afastado por uma Portaria que as transformou em proteção integral, intocáveis, gerando insustentabilidade nacional e descrédito.
O Brasil não pode ser vilão internacional do meio ambiente, julgado por países que não tem e nem imaginam oque é uma APP ou Reserva Legal, impondo a nosso povo a perda de desenvolvimento sem contrapartida ou pelo menos a gratidão por seu sacrifício.
A SEMA Federal que se iniciou em um Ministério que cuidava em especial das cidades se perdeu não só na fusão do IBAMA mas na aplicação confusa de um Código Florestal vocacionado para área rural ter sido implantado nas cidades que não detém as mesmas características, onde favelas se proliferam em ocupações irregulares ou uma costa magnifica que é erodida sem ações de controle ou intervenção efetiva do poder público ou ainda milhões de veículos se sucedem em emissões parando nas lombadas de quem perdeu a noção do racional.
O termo sustentabilidade virou uma banalidade, usado por todos, e não mais compreendido, nem mesmo por nossos técnicos que são encurralados por pressões de interesses ou pelo próprio Ministério Público que impõe a sua verdade sem a devida participação da academia.
Voltando a criação do IBAMA, criticávamos a disputa dos órgãos divididos, e a leitura atual mostra que as atividades daqueles órgãos eram muito mais ricas e ativas do que a atividade atual, então o modelo não evoluiu e aceitou ser messiânico, retrocedemos ao desconfiar de todos os brasileiros adotando o comando centralizado, típico de uma burocracia que se auto alimenta de criar problemas e que se acha detentora do saber e da infalibilidade.
Quanto a nossas obrigações às temos com as gerações futuras, no sentimento e na letra de nossa constituição, mas sou da geração presente, uma geração que começou todo este movimento, e o tempo é inexorável passando e nos angustiando, pois o legado a geração futura é deixarmos um ambiente com qualidade e a da geração presente é estar satisfeita com o ambiente que tem e nossos meios de sustentabilidade, e não estamos.
Sei dos esforços, programas internacionais, fundos, negociações e tantos outros, mas sem a sociedade local acreditar, sem que os atores de sua execução como empresários, agricultores, profissionais, se sintam parte do processo, vivemos sem rumo em ilhas de esforço.
Como esta é uma mensagem de apoio Sr. Ministro, mesmo parecendo tão critica, espero que possamos resgatar a imensa capacidade de articulação do MMA e de seus profissionais para um choque de realidade, e corrigir o rumo de algo tão bem intencionado e criado por seu pai.
*Luciano Pizzatto, Eng. Florestal, Especialista Direito Socioambiental, Empresário, Diretor de Parques Nacionais e Reservas do IBDF/IBAMA 88/89, Deputado de 1989/2015, membro do CONAMA 92/2002, detentor do 1º Prêmio Nacional de Ecologia do CNPq/Fundação Roberto Marinho, ex-Presidente da COMPAGÁS e Secretário de Representação do Estado do Paraná.
Fonte: Ambiente Brasil