Por: Eliana Rezende Bethancourt*
Não contem a ninguém: mas hoje (28/01) faço Aniversário.
É a passagem do Velho Senhor dos Tempos em mais uma ronda. Alcança-me os anos e mostra-me a conta dos meus dias.
Penso sobre tudo e concluo que a vida é mesmo sábia. Nos dá os anos para que não vivamos tudo de uma só vez. Viver, portanto, é ter a paciência para moldar um espírito inteiro!
Olhando para frente, e para trás, parece-me que tenho muito menos a viver do que já vivi. Eles passam e ganhamos certas coisas, na exata medida que outras se vão.
É a Lei das compensações:
Se a pele perde viço, os pensamentos ganham razão. Os bons argumentos se fazem desta.
Se o tônus do corpo se perde, a mente e as ideias ganham contornos e robustez. Sabem que precisam ser edificadas fortes para que firmes se sustentem.
Se o corpo pode falar, o silêncio ao lado da escuta pode ser bom conselheiro. Descobre-se o verdadeiro sentido de se ter dois ouvidos e apenas uma boca: é preciso sempre ouvir mais do que falar.
Se as paixões não são avassaladoras, há o terno calor do amor companheiro que aquece e segue por onde quer que possamos ir.
Se os olhos precisam de óculos, a perspicácia ganha agudeza. Enxerga-se adiante num futuro que ainda é esboço, nas entrelinhas de gestos, de não ditos.
Descobrimos que em toda nossa trilha, com tantas idas e vindas, cada um de nossos dias foi vivido em nossa exclusiva companhia. O Tempo nos faz solidários e generosos com o que somos.
Estaremos juntos até a última de nossas respirações. Assim nada de animosidades, rancores, maus sentimentos. O maior de todos os amores deve ser gentil, suave e sem culpas ou arrependimentos: é de nós para nós mesmos.
Substituem-se sonhos por realizações. Na ronda do Tempo percebemos o que fomos e o que nos tornamos e como a alquimia dos sonhos transformou nossas vidas, materializou projetos, redimensionou ideais. Criou pontes entre passado, presente e futuro.
Tudo em perfeita sincronia para que os anos nos cheguem e tenhamos o que barganhar.
Muito interessante e sábio.
Do outro, e até porque os anos passam e o saldo tende a diminuir rapidamente, não temos tempo a perder. O Tempo nos faz saber que correr para enriquecer é o remédio para todas as doenças. E que o lucro obtido será gasto para comprar a cura das doenças acumuladas pelo estresse, noites mal dormidas, trânsito pesado, reuniões intermináveis.
Não se lucra quando se subtrai.
O Tempo é valioso e essencial, tece-nos a trama de quem somos, nos dá memórias e vinca nossa identidade pelas eras e pelos espaços por onde trafegamos, portanto:
Não há Tempo para se perder com a fogueira de vaidades e com coisas sem importância.
… . É sim, Tempo para cultivar generosidades;
Não há Tempo para se ocupar de existências alheias.
… . É sim, Tempo de colher o que se plantou;
Não há Tempo para discussões sem proveito ou lutas insanas.
… . É sim, Tempo das almas maduras que buscam apenas o essencial;
Não há Tempo para perder com invejas, fúrias, preconceitos, mesquinharias (físicas ou espirituais)
… . É sim, Tempo de sedimentar o que de fato foi construído;
Não há Tempo para desejos de vingança ou ganâncias.
… . É sim, Tempo de perpetuar para não esquecer nossa brevidade no lapso tempo/espaço;
Não há Tempo para disputas, melindres ou guerras de egos e poder.
… . É sim, Tempo para alargar o espírito.
Enfim, não há Tempo para mediocridades e posses. Não servirão de nada para o lugar que iremos!
Talvez o caminho ao final seja de novo inverso: nascemos sem nada (física, mental, material, espiritualmente) e deveríamos, se aprendemos algo do Tempo, levar de volta um espírito alargado.
Se ao nascer começamos a morrer, olhando-se de lá para cá, talvez ao morrer começamos a nascer daqui para lá.
Sigo pensando que quero que meus anos passem, para que ao final possa dizer no meu Testamento:
Não deixo bens…
Não acumulei nem construí nada que possa ser roubado ou destruído.
Não possuo nada de valor material para ser perdido.
Não tenho nada que possa ser penhorado, trocado, vendido
Tenho apenas:
Voltas que dei pelo mundo
Encontros delas resultados;
Amores vividos,
Caminhos compartilhados,
Escolhas e mudanças de rumos e rotas
Paisagens que vi pelas janelas, em todos meus deslocamentos.
Culturas que conheci
Templos que entrei
Arquiteturas que vi
Pontes que atravessei
Muralhas que adentrei
Ruas por onde andei;
Mares que naveguei
Odores e sabores que experimentei
Pores-do-sol dourados que assisti
Amanheceres de luz que vi
Gotas de chuva caídas em dias quentes de verão
Luas de prata e douradas suspensas com meus pensamentos distantes
Tons de outono
Sombras frondosas e folhas em matizes sépia
Horizontes cor de esmeralda
Céus estrelados de dois hemisférios;
Sons que escutei
Brisas que senti
Músicas que dancei
Brindes que fiz
Vinhos que amei
Livros que li;
Vistas de sonhos sendo construídos
Quadros e esculturas que apreciei
Pensamentos que arquitetei
Linhas que escrevi
Tramas que teci
Ligações que estabeleci
Sorrisos que distribui;
Desculpem-me todos…
Os erros que cometi.
Não tive tempo de acumular artigos
Estive todo tempo ocupada em Viver!…
Fonte: ER Consultoria
Publicação Ambiente Legal, 29/01/2021
Edição: Ana A. Alencar
As publicações não expressam necessariamente a opinião da revista, mas servem para in formação e reflexão.