Desafios da Infraestrutura Portuária Brasileira
Por Alexandre Machado*
Cerca de 2 meses antes da implantação da nova Regra 2020 para Controle de Emissões de Enxofre da Organização Marítima Internacional, a ser aplicada ao Transporte Marítimo, permanece a indagação deixada na primeira parte desse artigo (veja aqui). A infraestrutura portuária brasileira estaria preparada para atender esta Regra para Limitação de Emissões de Enxofre 2020? A resposta é não!
Mesmo diante de um novo contexto de franca privatização no setor portuário brasileiro, algumas dúvidas ainda pairam sobre futuros investimentos para o setor. A expectativa de um moderno sistema, que transponha além das questões relativas a infraestrutura, digitalização e automação portuária, mas que se preocupe e seja sensível as questões ambientais, se fará necessário para tornar Portos e Terminais mais competitivos, contribuindo assim para a receptividade da nova regra.
Vale dizer que o Brasil é um importante fornecedor de combustível no cenário global em termos de capacidade de refino, produzindo cerca de 2,4% do atual mercado global. A participação da Petrobras no refino do Brasileiro atinge 98,6% no momento, embora a empresa tenha anunciado o desinvestimento de oito unidades com capacidade total de 1,1 MMb/d (47% da capacidade doméstica), segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP, 2019). Dessa forma, mesmo considerando as características de seus ativos, principalmente devido ao tipo de óleo encontrado nas reservas brasileiras e aos processos de refino realizados, a empresa está estrategicamente posicionada para obter margens maiores em petróleo, alavancadas por futuras exportações de LSFO (Low Sulfur Fuel Oil – Óleo Combustível com Baixo Teor de Enxofre).
Considerando que a maioria das refinarias globais, atualmente, não possuem uma infraestrutura ideal para produção de LSFO e MGO (Marine Gasoil), o resultado mais provável é a mudança na especificação de entrada de petróleo bruto. O baixo teor de enxofre favorece o óleo brasileiro, que é naturalmente mais compatível com o IMO 2020.
Mesmo diante dessas expectativas, a longo prazo, a descarbonização do transporte marítimo internacional permanecerá incerta no cenário brasileiro. No entanto, as perspectivas positivas para o mercado nacional de gás natural apontam o GNL (Gás Natural Liquefeito) como um potencial candidato para abrir o caminho da descarbonização do transporte marítimo.
A produção bruta de gás natural no Brasil deverá crescer cerca de 7% ao ano até 2027 (EPE, 2019). No entanto, esse suprimento adicional vem do gás associado ao pré-sal, que exige um mercado estável e previsível para ser totalmente desenvolvido. Até 2026, o gás associado (gás + petróleo + água) representará 78% do suprimento de gás nacional.
Nesse sentido, o setor industrial e o de geração de energia serão candidatos naturais como potenciais consumidores – projeto Gás para Crescer, por exemplo – mas novos mercados, como o de transporte marítimo, poderiam fornecer uma demanda complementar para alavancar o pré-sal brasileiro. O Brasil poderia aproveitar seus vastos e diversificados recursos para se posicionar como fornecedor global de combustíveis com menores emissões, além de promover soluções competitivas para a descarbonização a longo prazo do transporte marítimo.
Como carro chefe, o GNL, teria seu papel como combustível de transição, mesmo que no transporte marítimo, ainda enfrente desafios em relação à disponibilidade e viabilidade econômica, mas vem encontrando um impulso crescente no debate global, seria uma alternativa natural, ainda que inicialmente onerosa para sua implantação.
Vale destacar que, algumas experiencias internacionais com abastecimento de GNL, já são observadas em algumas das principais rotas costeiras (zonas ECA – exigência de 0,10% de emissões de Enxofre), e segundo a Korean Development Bank and Korea Trade-Investment (2019), já respondem por cerca de 60,3% das novas embarcações encomendadas até 2025. Trata-se do combustível mais barato e benigno em termos ambientais, muito embora para o seu abastecimento, requeira uma infraestrutura diferenciada para a disponibilidade de GNL.
É certo que cada opção tem vantagens e desvantagens baseadas no custo e na disponibilidade de combustível e infraestrutura, sendo que os portos e os operadores de terminais devem garantir uma infraestrutura eficiente sob pena de perda de mercado. Segundo o relatório da Argus Marine Fuels (2019), até 2021, por exemplo, os 25 maiores portos globais terão reabastecimento de GNL e mais de 434 navios já estarão comprometidos em operar com esse combustível.
Nesse sentido, levando em conta os diversos projetos de terminais de regaseificação propostos para o Brasil, cerca de quatorze, segundo EPE (2019), destacando inclusive um no Porto de Santos, o GNL seria a melhor alternativa visando a melhor produtividade do setor portuário nacional.
*Alexandre Machado é Doutor em Direito Ambiental Internacional e Mestre em Direito Ambiental, possui Especialização em Direito do Petróleo e Gás e Didática do Ensino Superior, professor de Terminais Offshore, Transporte Marítimo e Comércio Exterior e Logística na Faculdade Estadual de Tecnologia da Baixada Santista (FATEC Rubens Lara/SP).
Artigo publicado originalmente no jornal A Tribuna