Apesar da redução de 8 km de trecho contaminado no último ano, Fundação SOS Mata Atlântica destaca que estado de São Paulo ainda está longe de alcançar marca histórica de 71 km, de 2014
Os paulistas têm pouco o que comemorar no Dia do Tietê (22/09), quando se celebra o maior rio do estado – que corta São Paulo de leste a oeste por 1.100 km, desde sua nascente em Salesópolis, até a foz no rio Paraná, em Itapura. Apesar de uma redução de 8 km na mancha de poluição do mais importante rio paulista, comparado com o ano anterior, o trecho de 122 km mais contaminado do Tietê representa 11% da extensão do rio, ou seja, ainda está 51 km maior que a marca histórica de 71 km, alcançada em 2014. A pior qualidade do rio, onde ele pode ser considerado morto, fica entre os municípios de Itaquaquecetuba e Cabreúva, com água em condições péssima e ruim. Os dados são do projeto Observando os Rios, da Fundação SOS Mata Atlântica, a partir das análises feitas no último ano por 1.730 voluntários participantes de 103 grupos de monitoramento. Clique aqui e acesse os dados completos.
A redução de 8 km de rio morto, que recuperou condições de qualidade da água em relação ao ciclo anterior (de setembro de 2016 a agosto de 2017), é reflexo das 8 toneladas de esgotos que deixaram de ser lançadas, diariamente, sem tratamento nos rios afluentes do Tietê. Isso por conta da ampliação da Estação de Tratamento de Esgotos de Barueri, que passou a tratar 12 m³/s de esgotos, o que corresponde ao volume gerado por 5,8 milhões de pessoas. Até 2017, essa ETE tratava 9 m³/s de esgoto. O aumento na remoção de esgoto bruto que deixou de ser lançado no rio trouxe melhoria à qualidade da água no trecho entre Itu e Laranjal Paulista, elevando a média do Índice de Qualidade da Água (IQA) para regular.
“Cada ação que é feita para despoluir o rio Tietê traz um resultado direto na mancha de poluição do rio. Mas, infelizmente, estamos correndo atrás do prejuízo. Essa mancha era de 71 km em 2014, quando houve redução nos investimentos no projeto por conta da crise hídrica. Se quiser contribuir para a despoluição do Tietê, o próximo governador de São Paulo precisa retomar o ritmo de investimento no projeto, que tem previsão de mais três etapas, para os próximos 20 anos“, afirma Malu Ribeiro, especialista em Água da Fundação SOS Mata Atlântica.
As análises foram feitas em 83 corpos d’agua de 32 municípios das bacias hidrográficas do Alto e Médio Tietê e Piracicaba, Capivari e Jundiaí. Nestre projeto, os voluntários foram devidamente capacitados e instrumentalizados para realizar o monitoramento sistemático e as análises, com acompanhamento e supervisão da equipe técnica da ONG.
Dos 112 pontos de coleta, 71 (63,4%) apresentaram condição de água regular, ou seja, no limite dos padrões definidos na legislação para usos menos restritivos – como recreação, irrigação de culturas, navegação e abastecimento público mediante tratamento avançado. A condição de rio morto, altamente poluído com índices de qualidade de água péssima e ruim, foi obtida em 35 (31,2%) dos pontos de coleta monitorados mensalmente. Este dado reforça a urgente necessidade de investimentos em saneamento ambiental e governança da água na bacia hidrográfica.
Nenhum ponto analisado apresentou água considerada ótima e apenas 6 (5,4%) têm água boa. Os melhores indicadores foram obtidos nas bacias do rio Tietê no trecho metropolitano de cabeceira e de mananciais.
“Os indicadores obtidos apontam a fragilidade da condição ambiental dos principais rios urbanos monitorados neste ciclo do projeto. Os rios que não têm condições de uso acabam impactando diretamente na vida da população, em problemas de saúde, na escassez e no aumento do risco de crises hídricas“, reforça Malu Ribeiro.
Despoluição do rio Tietê e eleições 2018
Os dados da Fundação SOS Mata Atlântica também trazem uma análise da evolução de impacto do projeto de despoluição do rio Tietê ao longo da Terceira Etapa. Prestes a entrar em sua quarta etapa, o projeto trouxe resultados significativos até 2014, quando a mancha estava contida em 71 km. Com a crise hídrica em São Paulo, investimentos para despoluição foram reduzidos, o que impactou diretamente no aumento da mancha de rio morto, que mais do que dobrou no ano seguinte e agora chega a 122 km.
Para as eleições 2018, a SOS Mata Atlântica lançou um conjunto de metas para os próximos governantes. Entre elas, o urgente aprimoramento da norma que trata do enquadramento dos corpos d‘água, excluindo os rios de classe 4 da legislação brasileira – na prática, essa classe permite a existência de rios mortos, pois admite a existência de rios sem limites de diluição de poluentes. Com isso, os indicadores aqui reunidos poderão se traduzir em metas progressivas de qualidade da água nos rios e mananciais das bacias hidrográficas, em especial no rio Tietê e em seus principais afluentes.
Outro ponto fundamental é a gestão do saneamento ambiental e não somente básico, integrado às ações de uso e ocupação do solo em todos os municípios da bacia hidrográfica. “A gestão deve ser coordenada pelo Estado, por meio dos Comitês de Bacias Hidrográficas, com ampla participação da sociedade, dos usuários da água e dos municípios. Somente assim, avanços efetivos e mais céleres surgirão nos indicadores do Projeto Tietê“, afirma Malu.
Segundo ela, é possível despoluir o rio Tietê antes do prazo do projeto. “Mas, para isso, precisamos do compromisso de todos, com a despoluição de todos os córregos e afluentes do Tietê, com avanços no tratamento de esgoto em todas as cidades da bacia“, destaca a especialista.
Uma das propostas para o município de São Paulo, que seria executada por meio da ação integrada entre Prefeitura e Sabesp, nos últimos anos, por exemplo, era a criação de 110 parques lineares até 2018, por meio do chamado projeto Córrego Limpo – com o objetivo de proteger e recuperar ecossistemas e as matas ciliares dos corpos d’água, conectar a vegetação e revitalizar espaços públicos, minimizar o risco de enchentes e propiciar áreas verdes destinadas a atividades culturais e de lazer. Retomado em 2017, o Córrego limpo promoveu a recuperação parcial de 149 córregos. Essa ação, porém, precisa envolver todos os municípios da bacia hidrográfica uma vez que muitos desses córregos extrapolam os limites do território da cidade de São Paulo e os que estão contidos dentro do município dependem do engajamento da população para que se mantenham saudáveis.
Para Gustavo Veronesi, coordenador técnico do Observando os Rios, é importante destacar a relação entre floresta nativa preservada e água de qualidade. “Os pontos de coleta onde foram constatados indicadores de qualidade de água boa comprovam essa relação direta. O inverso também fica evidente diante da perda de qualidade da água com indicadores ruim e péssimo, obtidos quando se desprotegem nascentes, margens de rios e áreas de manancial, afetadas por uso inadequado do solo e desmatamento“, destaca ele.
Áreas como várzeas e matas ciliares também são cruciais por protegerem a boa qualidade da água, impedindo que lixo, solos contaminados e erosão caiam nos rios, ampliando a capacidade de absorção das águas de chuvas, reduzindo o risco de enchentes, como na região do Parque Varzeas do Tietê
“É estratégico e urgente reconhecer a importante relação da Mata Atlântica, das florestas naturais, com a água e buscar soluções técnicas integradas à natureza, valorizando os serviços ambientais das várzeas e matas ciliares. Assim essas áreas de parques e parques lineares, garantem qualidade de vida e segurança às populações“, finaliza Malu Ribeiro.
Fonte: SOSMA