O PORQUÊ DE ANGELA MERKEL GOVERNAR A EXIGENTE ALEMANHA
Por Marcus Vinicius Motta
Outro dia eu li uma excelente reportagem da New Yorker sobre a chanceler alemã Angela Merkel, onde o jornalista buscava entender as razões para o seu sucesso – chega a ser chamada de “mutti” (mãe) pelos alemães – num país que tomou aversão por cultos à personalidade.
E desde a sua juventude até o atual período como comandante da nação, uma característica é sempre presente: a monotonia. Sim, Angela Merkel é uma mulher comum, uma pessoa “sem graça”, no entanto é justamente isso que faz seu sucesso, porque as pessoas podem saber o que esperar dela e a enxergam como uma delas.
Em 1991, o fotógrafo Herlinde Koelbl começou uma série de fotografias chamada “Traços do Poder” onde retratava políticos alemães e observava como mudavam ao longo de uma década. O fotógrafo conta que homens como o ex-chanceler Gerhard Schröder ou o ex-ministro das relações exteriores Joschka Fischer pareciam cada vez mais tomados pela vaidade, enquanto Merkel, com seus modos desajeitados, não passava nenhuma idéia de vaidade, mas de um poder crescente que vinha de dentro.
A vaidade é subjetiva enquanto a ausência desta é objetiva, daí que Merkel é tão eficiente enquanto outros políticos parecem se perder nas liturgias e rapapés do poder.
Essa normalidade é vista em vários outros países – ainda que exista a vaidade, que é de cada pessoa – como no caso de deputados suecos que moram numa espécie de república tal qual a de estudantes e lavam e passam a própria roupa.
Certa vez, vi uma reportagem de um jornal britânico analisando uma foto do primeiro-ministro David Cameron lavando a louça na cozinha. A reportagem não se espantava com o fato do primeiro-ministro lavar a própria louça, já que Tony Blair fazia o mesmo e Margaret Thatcher cozinhava para o marido, mas observava uma tábua de cortar carne com a expressão “calma, querida” num canto.
A própria Angela Merkel mora no mesmo apartamento de sempre com o marido e a única mudança que houve em relação ao seu tempo fora do poder é a presença de um guarda na porta do prédio. Eles compram entradas para assistir ópera com o próprio cartão de crédito e entram no teatro junto com todos, sem nenhum esquema especial.
Daí partimos para o Brasil, onde um simples governador de estado possui jatinhos, helicópteros, ajudantes de ordem e comitivas com batedores de moto que param o trânsito para que ele passe. Pessoas que vivem em palácios, como se ainda fosse alguma corte real. Empregadas, arrumadeiras, garçons, equipes de cozinheiros, serviço de quarto, motoristas, inúmeros seguranças, esquemas especiais para entrar ou sair de algum lugar.
Essa é a diferença: a normalidade do poder, a noção de que um servidor público é apenas um servidor público, seja um escriturário ou o presidente/ primeiro-ministro da nação. Eles continuam sendo homens e mulheres, maridos e esposas, pagadores de impostos, trabalhadores e cidadãos.
Cidadania é isso.
Marcus Vinicius Motta é graduado em odontologia, trabalhou na área por quatro anos, e cursa ciência política na UniRio. Trabalha com publicidade e mantém o blog “Contra a correnteza”.
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