Por Paulo de Bessa Antunes*
Recente artigo do ministro do Meio Ambiente, publicado na Folha de S.Paulo[1], suscita um debate importante sobre a natureza do ambientalismo e o que se deve esperar dele como resultados. Merece, também, ser registrada a disposição a discussão de ideias de forma clara e aberta.
A discussão realmente importante não é sobre o ambientalismo de resultados, mas sobre os resultados do ambientalismo. Um dos resultados mais eloquentes do ambientalismo é a própria existência do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e de seus órgãos vinculados, tais como o IBAMA e o ICMbio.
O ambientalismo ou ecologismo tem suas origens imediatas na segunda metade do século 20, em função de desastres ambientais diversos que causaram “grandes medos” nas sociedades industrializadas. Torey Cannyon, Love Canal, Amoco Cadiz, Three Mile Islands, Sandoz, Bhopal são nomes conhecidos de todos os ambientalistas. No Brasil, podem ser destacados nomes como Cubatão, Cidade dos Meninos, Vila Socó e muitos outros.
Uma das características mais marcantes do ambientalismo é o inconformismo com a poluição, com a degradação ambiental e da saúde humana produzidas por uma industrialização obtusa.
O ambientalismo, no mundo e, particularmente, no Brasil, gerou muitos resultados. O primeiro grande resultado internacional do ambientalismo foi a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo no ano de 1972. No Brasil, o maior resultado do ambientalismo é a forte presença do tema meio ambiente em nossa Constituição Federal, nas estaduais e em milhares de leis orgânicas municipais. Em seguida, o ambientalismo brasileiro foi responsável por um sistema legal de proteção ambiental que, longe de ser perfeito, tem prestado relevantes serviços ao país.
É interessante observar que o “ambientalismo de resultados”, tal como apresentado no artigo, não reivindica qualquer ação de combate aos incêndios florestais, cada vez mais frequentes. Não reivindica a defesa das terras indígenas, o reflorestamento de margens de rios e tantas outras matérias que, tradicionalmente, fazem parte das demandas ambientais. Isso se justifica na medida em que o ambientalismo e a sustentabilidade passaram o dominar o debate político e, consequentemente, serem assimilados pelo mainstream. Hoje todos são ambientalistas e todos são sustentáveis. Os conceitos perdem sentido e precisam ser analisados no caso concreto.
Nos últimos três anos, caso se faça uma análise isenta da administração do Ministério do Meio Ambiente, certamente os pontos indicados no artigo do senhor ministro são relevantes, muito embora não se possa dizer que sejam obras da atual administração. A concessão do Parque Nacional do Iguaçu foi renovada, pois o prazo de 20 anos se esgotou em 2021 [2]. Com relação à participação na COP 26, a pressão dos ambientalistas, da sociedade civil e de setores modernos da economia brasileira, em geral exportadores, empurraram a atual administração para uma posição contrária às suas convicções. Não se esqueça o cancelamento da COP 25 em Salvador [3]. A Lei nº 14.119/2021 tramitou por seis longos anos no Congresso Nacional, haja vista que tem origem no Projeto de Lei 312/2015, de autoria dos deputados federais Rubens Bueno e Arnaldo Jordy [4], e a lei pende de regulamentação.
É relevante anotar que o MMA perdeu o controle sobre as questões amazônicas que foram transferidas para o Conselho da Amazônia [5], sem maiores resultados práticos, pois as queimadas e o desmatamento na região aumentaram fortemente [6]. Não se esqueça que o Fundo Amazônia, que é uma importante fonte de financiamento da proteção de nossas florestas, foi paralisado com cerca de 1,4 bilhão de reais em conta [7].
É fato que o orçamento do MMA tem sofrido reduções [8] e tem baixa execução. Os dados apresentados pelo MMA são modestos e só não são piores devido a uma série de pressões legítimas que são feitas sobre a pasta pela sociedade civil, nacional e internacional.
O ambientalismo que produz resultados é aquele que chama atenção para os problemas, a partir de uma percepção política e científica, que faz denúncias e que exige respostas. É o ambientalismo que segue a tradição, no Brasil, de Ibsen Gusmão, Paulo Nogueira Neto, Chico Mendes e José Lutzembeger, entre outros. O artigo do ministro é importante pelo fato de que o MMA, ao que parece, está disposto ao debate civilizado. E nisso merece aplausos. Por outro lado, o que tem a mostrar é muito pouco. Relembre-se que as iniciativas regulatórias do MMA têm sido rechaçadas pelo Supremo Tribunal Federal, dadas as evidentes inconstitucionalidades e o caráter regressivo, levando a patamares insuficientes de proteção ambiental.
No atual momento da vida nacional, a discussão sobre o ambientalismo deve, necessariamente, começar pelo seu importante legado e contribuição para a vida nacional. Os resultados do ambientalismo estão às vistas de todos e não devem ser diminuídos ou revogados.
[1] Disponível em < https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2022/01/ambientalismo-de-resultados.shtml > acesso em 18/01/2022.
[2] Disponível em < https://www.gazetadopovo.com.br/parana/parque-nacional-iguacu-concessao-pioneira-saldo-20-anos/ > acesso em 18 jan 2022.
[3] Disponível em < https://veja.abril.com.br/mundo/brasil-cancela-reuniao-da-onu-sobre-o-clima-em-salvador/ > acesso em 18 jan 2022.
[4] Disponível em < https://www.conjur.com.br/2021-fev-27/ambiente-juridico-lei-politica-nacional-pagamento-servicos-ambientais > acesso em 18 jan 2022.
[5] Disponível em < https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/noticias/2020/02/bolsonaro-assina-decreto-de-criacao-do-conselho-nacional-da-amazonia-legal > acesso em 18 jan 2022.
[6] Disponível em < https://www.brasildefato.com.br/2021/11/19/inpe-amazonia-tem-aumento-de-21-97-no-desmatamento-em-2021 > acesso em 18 jan 2022.
[7] Disponível em < https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/fundo-amazonia-tem-40-projetos-que-somam-r-1-4-bi-paralisados/ > acesso em 18 jan 2022.
[8] Disponível em < https://www.inesc.org.br/wp-content/uploads/2020/10/NT_PLOA2021MeioAmbiente_V03.pdf > acesso em 18 jan 2022.
*Paulo de Bessa Antunes é advogado, professor associado da UNIRIO, presidente da Comissão de Direito Ambiental do IAB, membro da Comissão Mundial de Direito Ambiental da IUCN e presidente da UBAA.
Fonte: ConJur
Publicação Ambiente Legal, 26/01/2022
Edição: Ana Alves Alencar
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