Por Marcia Hirota e Leandra Gonçalves*
Aconteceu em junho em Portugal o terceiro World Ocean Summit, promovido pela revista The Economist, que tem o objetivo ambicioso de definir uma nova agenda global para a economia dos oceanos.
A edição desse ano contou com a participação de mais de 250 líderes globais de vários setores com interesses diretos no tema. Além dos debates e da presença de pesquisadores relevantes, foram lançados alguns estudos para oferecer subsídio científico para a discussão de soluções para a governança dos mares.
A “economia azul”, principal conceito discutido na reunião, é incipiente e ainda não claramente definida, mas oferece uma visão do mar e costa como uma nova fonte de crescimento, geração de oportunidades e criação de empregos. Uma alternativa econômica na qual se busca o equilíbrio entre um investimento responsável em um oceano sustentável.
No entanto, o conceito que parece funcionar na teoria, ainda está longe de trazer benefícios na prática em muitos países, inclusive no Brasil. O estudo Coastal Governance Index (2015), lançado na reunião deste ano, mostra que a maioria das nações avaliadas ainda têm muito a implementar para aprimorar a governança costeira.
O índice mede o grau de regulação e gestão em 20 das principais economias costeiras do mundo, a fim de avaliar o estado ambiental para a promoção de uma governança costeira efetiva. O estudo foi feito com base em uma pesquisa documental abrangente e composta por 24 indicadores e 43 sub-indicadores em seis categorias temáticas: política e capacidade institucional; ambiente de negócios para as atividades costeiras; qualidade da água; minerais e de energia; costa e recursos vivos. As categorias e os critérios individuais foram ponderados de acordo com pesos neutros e refletem a ideia de que os países devem fazer bem em todos os critérios, a fim de ter a base para a gestão costeira bem sucedida.
Litorais e oceanos estão entre os ecossistemas mais frágeis do mundo, mas também servem como ativos naturais que podem estimular o crescimento e construir economias. Governos de todo o mundo estão estabelecendo práticas de gestão costeira que levem em conta os pontos de vista do setor privado, assegurando práticas sustentáveis integradas às necessidades de conservação.
Segundo os resultados do estudo, a maioria dos países avaliados têm feito um bom começo para uma governança eficaz do espaço costeiro, mas todos ainda precisam melhorar e integrar as iniciativas.
No levantamento, o Brasil e Chile dividiram a 10oª. posição, com uma pontuação de 67 em 100 pontos. Há de ressaltar que na categoria “costa”, o Brasil ficou em penúltimo lugar, perdendo apenas para a Rússia. Esta categoria identifica as políticas relacionadas à gestão costeira. É composta de quatro indicadores, cinco sub-indicadores e inclui medições de governança costeiras para o setor do turismo e imobiliário, indústrias (residenciais e comerciais), em particular o impacto ambiental de tal desenvolvimento. Destaca também a importância de encontrar um equilíbrio entre a utilização pública das zonas costeiras e dos recursos vivos marinhos com o desenvolvimento econômico – o que sem dúvida, ainda não é feito e nem mesmo compreendido pelo setor produtivo brasileiro.
Não nos faltam evidências de que o Brasil parece seguir na contramão. Além do resultado do índice, uma prova da falta de alinhamento entre conservação e desenvolvimento econômico foi a recente rejeição na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados do PL 6.969/2013.
Conhecido como Lei do Mar, o texto busca integrar diversos setores (governo, sociedade civil e cientistas) na difícil tarefa de propor um planejamento espacial marinho e mecanismos que possam promover o uso dos recursos marinhos e costeiros aliados à conservação da biodiversidade. De autoria deputado Sarney Filho (PV-MA), o projeto vem tramitando na Câmara desde dezembro de 2013.
Tudo indica que, infelizmente, o debate sobre a fragilidade legislativa para tratar da governança costeira e marinha não é de interesse da maioria dos membros da Comissão de Agricultura. Uma lei específica para o bioma marinho é tão necessária quanto foi a Lei da Mata Atlântica, que define o uso e a exploração das florestas nativas do bioma e tramitou durante 14 anos no Congresso Nacional com amplo debate e participação de diversos setores da sociedade. No caso do projeto da Lei do Mar, a rejeição aconteceu sem que tivesse havido um debate, o que é lamentável.
A Lei do Mar visa garantir a expansão e o desenvolvimento econômico do país, o turismo e a pesca sustentável aliados à manutenção das comunidades locais, da conservação da biodiversidade marinha e da proteção de um Patrimônio Nacional. É hora de mudarmos essa realidade.
Fonte: SOS Mata Atlântica
*Marcia Hirota é diretora-executiva da Fundação SOS Mata Atlântica e Leandra Gonçalves é bióloga e consultora da organização. A SOS Mata Atlântica é uma ONG brasileira que desenvolve projetos e campanhas em defesa das Florestas, do Mar e da qualidade de vida nas Cidades.
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