Por Rosangela Tremel
Balneário Camboriu, maio de 2014
Viena. Verão europeu. Pisei em seu solo pensando em notas musicais. Como viajante itinerante pelos países protegidos pelo Tratado de Schengen, vinha vestindo camadas de roupas por conta das súbitas mudanças de temperatura conforme latitude e longitude, mas Viena exigia tão somente camiseta de mangas curtas em dia de pleno sol.
O guia local começou as instruções com uma frase incomum: “Não tomem água mineral.” Pensei até não ter entendido bem o inglês com sotaque local, mas era isso mesmo: “Não comprem água mineral, pois em Viena toda a água que sai das torneiras é tratada.” Acreditei e percorri a cidade inteira tomando água de torneira com toda tranquilidade e uma alegria tal que também me deixei encharcar pela água que, nos momentos de calor mais intenso, jorrava do chão como se estivesse molhando gramado e amenizava os efeitos de um sol causticante. Não havia desperdício, mas reinava abundância. Foram alguns dias sem comprar Evian e todos os euros destinados à agua mineral viraram gastos em chocolates estampados com a figura de Mozart, que nasceu em Salzburg, mas que Viena insiste em chamar de seu.
Não posso deixar de pensar em Aruba, ilha caribenha de terreno vulcânico, onde a orientação, ainda no século passado, era: “ toda a água potável daqui é decorrente de processo de dessalinização, ao custo de três dólares o litro.” A sugestão era consumir com parcimônia em chuveiradas e higiene pessoal. Lembro que bebi água mineral.
Então, pulo para o México, onde ninguém me avisou oficialmente , mas amigos mais experientes haviam alertado: tome banho de boca bem fechada, não engula nenhum gole do que brote de chuveiros ou torneiras; tome apenas água mineral de garrafas que você mesma quebrou o lacre e com ela escove os dentes. Segui literalmente as instruções e foi uma boa viagem, no comecinho do século XXI.
E aí a linha do tempo salta para 2014. Na maior metrópole do Brasil, a água da Reserva da Cantareira, a principal que abastece São Paulo Capital, acabou. Isto mesmo: o reservatório secou. E ao consumidor pouco importa saber se isso aconteceu por falta de chuva ou se tal só ocorre a cada três mil anos.
Para, ainda que precariamente, levar algumas gotas do precioso líquido às torneiras dos paulistanos, o setor responsável tomou a decisão de trazer à tona o “fundo do poço”, tecnicamente chamado de volume morto, e com ele toda uma possível, provável, inevitável contaminação sedimentada, agravada pelo fato de que tal reserva terá que ser bombeada, visto que se encontra abaixo do nível em que fluiria espontaneamente. Tudo isto está na mídia e deve (ou deveria) preocupar os habitantes, bem como todos os que por lá estejam de passagem.
Enquanto isso ocorre na capital paulista, sabe-se que, Brasil afora, inúmeros municípios, alguns privilegiados pelo abastecimento direto do Aquífero Guarani, a maior reserva de água doce do planeta, com elevado grau de pureza, prosseguem seu cotidiano “varrendo” calçadas com grande quantidade de água, lavando carros e achando que o velho ditado: “gastar dinheiro feito água”, continua em vigor. Desconhecem ou ignoram que se trata de um bem econômico e finito.
Que pena, neste volume vivo de referências e sem um efetivo planejamento , corremos todos o sério risco de beber água que não é fonte de vida como apregoa a medicina, mas um líquido qualquer derivado de volume morto.
Rosangela Tremel é advogada e jornalista, Editora-chefe da Revista Jurídica “De fato e de direito”, órgão informativo da Unisul – Universidade do Sul de Santa Catarina
Excelente artigo, aliás, como sempre!
Parabéns!
Prezado Rogério, Muito obrigada pelas carinhosas palavras de incentivo.
Verdade!
Nossa água de cada dia, nos dai hoje!
Porquê amanhã não sabemos…
Parabéns pelo forte apelo e alerta!
Olá Jefferson, concordo plenamente com sua oração pela água nossa de cada dia e me sinto honrada por ter lido meu texto.
Adorei!!!!!! Sempre adoro tudo o que escreves! Bjos querida!!!!
Aymara, minha muito querida amiga que sempre me cumulou com tantas gentilezas, muito obrigada, de todo o coração.
Belíssimo artigo. Parabéns! Adorei! Sucesso e sabedoria. Beijos, Thais Bizarria
Thais Bizarria, receber seu elogio é sempre uma alegria (rimou). Superbj
Parabéns por este artigo cujas palavras, repletas de sabedoria, nos fazem pensar (ainda mais) como entregaremos aos nossos descendentes o Planeta que “tomamos emprestado”. Grande abraço
Querida Marise, nosso legado para as futuras geracoes , de fato preocupa. Carinhoso abraco e obrigada por ler o artigo
Gostei muito do artigo.
As idéias fizeram muito bem alinhavadas.
Querida Ana, adorei sua gentileza em comentar. Carinhoso abraco
Profª Rosangela, que belo texto, o achei na procura de vossa pessoa, vou continuar na busca.